São Paulo, segunda-feira, 22 de março de 2004

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VIZINHO EM CRISE

Entre novembro e janeiro, companhias do país colocaram em dia dívidas que somavam US$ 2,6 bilhões

Empresas argentinas renegociam dívidas

CAROLINA VILA-NOVA
DE BUENOS AIRES

As empresas argentinas estão conseguindo reestruturar suas dívidas mais rapidamente que o governo do país, mergulhado em pressões do FMI (Fundo Monetário Internacional), do G7 (grupo de países mais ricos do mundo) e de seus credores privados.
Os últimos três meses, até meados de fevereiro, viram uma aceleração no processo de reestruturação da dívida privada, segundo aponta relatório feito pela consultoria Fundación Capital.
Apenas nesse período, empresas argentinas conseguiram renegociar US$ 2,61 bilhões. Esse valor representa 11% do total do endividamento privado no período, de US$ 21,78 bilhões, incluindo dívidas vencidas e em dia.

Desde 2002
Esse resultado é a continuação de uma tendência que começou já em 2002 e tomou fôlego no ano passado, com sinais de recuperação da economia -a economia do país cresceu 8,7% em 2003.
No auge da crise, o total da dívida corporativa argentina chegou a ser estimada em US$ 31,5 bilhões, segundo dados de consultorias privadas. Hoje, estima-se que cerca de metade desse valor já tenha sido reestruturado pelas empresas. Os analistas esperam a liquidação de grande parte do que resta ainda neste ano.
O relatório aponta ainda que, de 2003 até fevereiro de 2004, os "defaults" corresponderam em grande parte a operações das mesmas empresas que já haviam registrado descumprimentos em 2002 - ou seja, nesse período, não foram registrados descumprimentos por parte de empresas novas.
"Durante o ano passado, as melhores condições financeiras e fiscais impulsionaram uma série de reestruturações e de ofertas de recompra de dívida privada", diz o relatório. "Longe de ser uma solução definitiva, começaram a marcar uma mudança de tendência em relação às perspectivas do mercado e uma aproximação entre devedores e credores."
Outro estudo da mesma consultoria mostra que, das dívidas emitidas durante o segundo semestre do ano passado, apenas 30% (US$ 325 milhões) foram novas emissões. O restante (US$ 748 milhões) referiu-se a trocas de dívidas ou reestruturações.
Nesse processo, saíram ganhando as empresas que começam suas reestruturações no auge da crise. Em média, as dívidas foram renegociadas com descontos de 30% nos valores nominais.

Descontos maiores
"Em 2002, o contexto econômico era tão ruim que as renegociações fechavam em seguida porque, antes de perder tudo, os credores aceitavam descontos de 80%. Quando a economia melhorou, [os credores] já não se conformavam tão facilmente", explica o economista Horacio Costa.
"Por esse motivo, as empresas que começaram a renegociar mais tarde ainda não conseguiram fechar o processo e em mais de um caso tiveram de melhorar suas propostas originais", diz.
A empresa de telecomunicações Impsat, por exemplo, fechou as negociações com os credores por uma dívida de US$ 650 milhões em março de 2002 - justo quando metade das empresas argentinas entravam em "default".
As empresas Telefónica e Petrobras, com dívidas de US$ 1,81 bilhão e US$ 2,31 bilhões, respectivamente, conseguiram renegociar suas dívidas sem chegar ao "default" e sem oferecer nenhum tipo de desconto. Já o grupo de TV a cabo Cablevisión só conseguiu fechar um acordo com os credores neste mês, depois de 13 adiamentos e uma melhora substancial na proposta inicial que a empresa havia feito aos credores.

Adiamento
"As renegociações concretizadas, apesar de constituírem uma saída à situação de "default" que apresentam um grande número de empresas, não são uma solução definitiva, mas uma postergação dada a falta de capacidade de pagamento das empresas", diz o relatório da Fundación Capital.
"O papel do Estado nesse sentido é decisivo, já que a definição da reestruturação da dívida pública geraria um marco de referência para o setor privado e proporcionaria um entorno mais favorável à renegociação entre devedores e credores privados", afirma.
Outros fatores que, segundo a consultoria, influenciarão no futuro das reestruturações da dívida privada são a reestruturação do setor financeiro -de modo a garantir mais fontes de financiamento para as empresas- e as renegociações dos contratos das empresas de serviço públicos.
Essas já são, inclusive, as empresas com maior dificuldade para sair da moratória. Isso porque, para os analistas, as prestadoras de serviços públicos estão expostas a um risco maior devido à natureza política das negociações.


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