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PAULO NOGUEIRA BATISTA JR.
O Brasil e o FMI
A estrutura de votação
do Fundo é muito desequilibrada e
deve ser corrigida
FOI APROVADA , anteontem, a indicação do meu nome para o
cargo de diretor-executivo
pelos outros oito países que integram a nossa circunscrição no Fundo Monetário Internacional (Colômbia, Equador, Guiana, Haiti, Panamá, República Dominicana, Suriname e Trinidad e Tobago). Devo tomar posse logo após as reuniões de
primavera do Fundo, que se realizarão em Washington, D.C., em meados de abril.
De certo modo, a perspectiva é
animadora. O Brasil não depende
atualmente dos empréstimos do
FMI. A posição das contas externas
do país é bastante forte. Temos registrado elevados saldos na balança
comercial e superávits no balanço
de pagamentos em transações correntes. As nossas reservas internacionais alcançam quase US$ 107 bilhões. Não estamos mais na situação
de pedinte e temos condições de
participar com autonomia nas discussões e decisões do FMI, assim como de outros organismos internacionais.
Ocorre que o poder de votação no
FMI é muito concentrado. Os Estados Unidos têm 17% do total dos votos; o Japão e a Alemanha, 6% dos
votos cada um; a França e o Reino
Unido, 5% cada um. Apenas cinco
países desenvolvidos respondem,
portanto, por 39% dos votos. O conjunto dos desenvolvidos controla
cerca de 60% dos votos. Os Estados
Unidos contam com poder de veto
sobre decisões que envolvam alterações nos estatutos do Fundo (os "Articles of Agreement"), uma vez que
essas alterações exigem uma maioria de 85%.
O grupo de nove países que me caberá representar tem 2,4% dos votos; o Brasil, isoladamente, 1,4%. A
nossa capacidade de influir depende, portanto, da construção de alianças com outros membros do Fundo.
Alianças com nações sul-americanas que fazem parte de outras circunscrições. Alianças com outros
países emergentes e em desenvolvimento, notadamente com os grandes países da periferia (China, Índia,
Rússia, África do Sul e Indonésia,
por exemplo).
Os desenvolvidos tendem a agir
em bloco e não simpatizam, em geral, com as reivindicações das nações em desenvolvimento. Mas,
mesmo com esses países, é possível
encontrar pontos de convergência
em alguns temas.
Já está em andamento no âmbito
do Fundo uma reavaliação da estrutura de votação e dos critérios utilizados para definir o poder de voto de
cada membro. A discussão vem
avançando. Consolida-se aos poucos a percepção de que os países
emergentes e em desenvolvimento,
cujo peso na economia mundial é
crescente e nos quais vive a maior
parte da população do planeta, estão
sub-representados na estrutura
atual do Fundo.
Há distorções gritantes. Por
exemplo: a Bélgica, com 2,1% dos votos, tem mais peso do que a Índia,
que conta com 1,9%; a Holanda, com
2,3%, pesa mais do que o Brasil. A
correção desses desequilíbrios e distorções é um dos principais temas
da agenda atual do Fundo e irá ocupar boa parte do meu tempo.
As últimas semanas têm sido bastante pesadas. O convite do ministro
Guido Mantega me pegou de surpresa, e eu ainda não me acostumei
totalmente com a idéia de morar fora do Brasil, muito menos em Washington, trabalhando no FMI ("of all
places!"). Mas repare, leitor, a sutileza: no e não para o FMI!
Algumas pessoas foram um pouco pessimistas. "Você será um estranho no ninho", comentou um
amigo. Não creio que vá ficar inteiramente isolado, mas não há dúvida de que a mudança de vida e de
ambiente será muito grande. Uma
coisa tem me ajudado bastante: as
inúmeras manifestações de apoio,
carinho e confiança que venho recebendo de amigos, ex-alunos, conhecidos e leitores. Uma verdadeira avalanche de mensagens e telefonemas, que estou tentando responder aos poucos.
Outro dia, por exemplo, uma senhora muito simpática me parou
na rua, declarou-se leitora desta
coluna e me congratulou efusivamente. "Como é que você está se
sentindo?", perguntou maternalmente. Eu respondi: "Estou um
pouco apreensivo". E ela: "É que
são muitos falcões lá, não é?".
Emendei: "E eu um pombo...". Mas
ela, sorrindo, foi enfática: "Mas não
um pombo qualquer!".
Confirmei imediatamente: "Não,
não! Vou dar as minhas bicadas!".
PAULO NOGUEIRA BATISTA JR., 51, economista e professor da FGV-Eaesp, escreve às quintas-feiras nesta coluna. É autor do livro "O Brasil e a Economia Internacional:
Recuperação e Defesa da Autonomia Nacional" (Campus/Elsevier, 2005).
pnbjr@attglobal.net
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