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OPINIÃO ECONÔMICA
O Banco Central pisou na bola
PAULO NOGUEIRA BATISTA JR.
Em decisão unânime, o Copom (Comitê de Política Monetária do Banco Central) manteve inalterada a taxa básica de
juros, sem viés. "Toda unanimidade é burra", sustentava Nelson
Rodrigues. Será que a decisão do
Copom foge à regra rodriguiana?
Qualificá-la de "burra" talvez
seja exagero. Digamos, em nome
da paciência, que foi uma decisão
muito controvertida. O Banco
Central deveria ter iniciado a diminuição da taxa básica, ou reduzido um pouco os depósitos
compulsórios sobre passivos bancários, ou, no mínimo, estabelecido um viés de baixa para os juros.
Na última semana, apareceram
diversas novas indicações de que
a taxa básica de juro poderia começar a cair. Os índices de preços,
inclusive ao consumidor, continuam a registrar queda da inflação. As expectativas inflacionárias estão diminuindo aos poucos.
Novas informações sobre a economia real sugerem, em geral, aprofundamento do quadro de retração da produção e do emprego.
Ao manter a taxa nominal básica constante em 26,5%, o Copom
decidiu implicitamente aumentá-la em termos reais. Como justificar uma decisão dessas se a economia está retraída, e o nível de
desemprego, elevado? Combinado com a valorização cambial e o
aumento do superávit fiscal primário, o aperto monetário configura, como dizem as más línguas,
um verdadeiro "projeto PIB zero".
Não se deve perder de vista,
além disso, que a taxa básica é
muito inferior às taxas de juro cobradas pelos bancos. Nas operações de crédito com recursos livres, os juros vêm aumentando
consideravelmente desde o início
do governo Lula. Segundo dados
do Banco Central, as taxas médias cobradas de pessoas jurídicas
aumentaram de 30,9% ao ano em
dezembro para 37,9% em março.
No mesmo período, os juros nas
operações com pessoas físicas aumentaram de 83,5% para 87,3%,
em média.
O Banco Central alega que é
preciso proceder com cautela e
aguardar sinais mais claros de
que a inflação está sob controle. A
cautela é compreensível. Mas,
convenhamos, o que se esperava
do Banco Central não era muito.
Apenas um pouco de flexibilidade
e um pouco mais de atenção à situação da produção e do emprego. E o mínimo de ousadia para
iniciar uma diminuição gradativa e cuidadosa das taxas de juro.
A própria cautela recomendaria alguma diminuição dos juros.
Afinal, a inflação não é o único
risco. E neste momento não é,
provavelmente, o principal. Existe também o risco de que a política monetária precipite uma recessão. A experiência de diversos
países mostra que a recessão, assim como a inflação, pode tornar-se um processo cumulativo, de difícil reversão.
Ceder ao clamor pela diminuição dos juros teria prejudicado a
credibilidade do Banco Central e
alimentado dúvidas sobre a sua
disposição de combater a inflação? Não creio. A pressão pela
queda dos juros não cresceu por
acaso. Ela reflete a percepção fundamentalmente correta, ou pelo
menos bastante defensável, de
que os indicadores econômico-financeiros estão apontando para
a conveniência de atenuar um
pouco a restrição monetária.
Esse tipo de pressão surgirá toda vez que a conjuntura for mais
favorável a uma diminuição da
taxa de juro. Se a preocupação
com a reputação antiinflacionária levar o Banco Central a ostentar uma postura inflexível, os juros nunca poderão ser reduzidos.
Paulo Nogueira Batista Jr., 48, economista, pesquisador visitante do Instituto de Estudos Avançados da USP e professor da FGV-EAESP, escreve às quintas-feiras nesta coluna. É autor do livro "A
Economia como Ela É..." (Boitempo Editorial, 3ª edição, 2002).
E-mail - pnbjr@attglobal.net
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