|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
ARTIGO
Crédito chinês é motivo de preocupação
GILLIAN TETT
DO "FINANCIAL TIMES"
Nos últimos meses, um estranho tipo de serviço bancário
clandestino vem proliferando
em certas regiões da China. Conhecido como minjian jeidai, o
sistema permite que empresas
chinesas tomem empréstimos
de curto prazo em domicílios
de alta renda, por meio de um
corretor armado de celular.
Em teoria, o método parece
quase lógico. Muitas empresas
de pequeno e médio porte vêm
encontrando dificuldade para
obter empréstimos bancários, e
muitos domicílios chineses
precisam desesperadamente
encontrar algum lugar onde
aplicar seu dinheiro (além do
superaquecido setor imobiliário ou das Bolsas em queda).
Mas há um problema. Porque a prática é ilegal, os juros
são altos; além disso, ninguém
faz ideia de que dimensões essa
prática pode ter assumido.
Isso é causa de preocupação
para investidores que estejam
tentando compreender os mercados mundiais. Nos últimos
dias, com a violenta oscilação
dos mercados, surgiram fortes
lamentações públicas quanto
aos dramas que vêm irrompendo na zona do euro.
Mas do outro lado do mundo
há um segundo conjunto de riscos, menos discutido: as incertezas quanto à China. O país
produziu diversas notícias econômicas positivas nos últimos
meses. E alguns observadores
continuam otimistas quanto às
perspectivas do país.
O Goldman Sachs enviou a
seus clientes nota de pesquisa,
no começo da semana, na qual
sugeria que era ridículo que os
investidores perdessem tempo
lastimando os problemas da zona do euro, já que os principais
propulsores do crescimento
nos próximos anos serão países
emergentes, como a China.
"A China é cerca de 14 vezes
maior que a Grécia", afirmava a
sarcástica nota.
Mas nem todo mundo é tão
entusiástico. Em 30 dias, o
mercado chinês de ações caiu
20%, depois que os investidores se assustaram com os esforços do governo para desacelerar o mercado imobiliário.
Também há preocupações
quanto ao grau de sofrimento
que será infligido aos exportadores chineses, agora que há
queda na demanda europeia.
E há preocupação quanto ao
lado oficial das finanças (desconsiderando os bancos clandestinos). O BC recentemente
ordenou que os grandes bancos
elevassem as reservas de capital em 17%, em parte porque as
autoridades desejavam debelar
o temor de que um excesso de
crédito em 2009 tenha resultado em mais inadimplência.
Isso é perfeitamente sensato.
No entanto, o governo chinês
também está presumindo, em
suas projeções de crescimento,
que os bancos concederão cerca de 7,5 trilhões de yuans em
novos empréstimos em 2011.
A única maneira de resolver a
charada, para os bancos, será
levantar muito capital. Mas parece altamente improvável que
possam fazê-lo sem uma recuperação nos mercados de ações.
Intervenção
O que acontece, então? Os
bancos vão reduzir o nível de
crédito, conduzindo a economia a uma desaceleração? O governo chinês intervirá? Ou é
possível que um daqueles "bancos clandestinos" expanda seus
empréstimos de uma maneira
que ninguém espera (ou vê)?
Ninguém sabe.
Isso tem ao menos duas implicações. Para começar, toda a
incerteza econômica e o tumulto do euro tornam improvável
que a China aceite valorize o
yuan em curto prazo.
Além disso, a incerteza tem o
potencial de gerar instabilidade
muito maior nos mercados.
Afinal, ainda que um vago
senso de otimismo quanto à
China tenha embasado o debate sobre investimento no mundo ocidental, no ano passado, a
realidade é que poucos investidores ocidentais sabem sobre o
que está -ou não está- acontecendo nas bases da economia
chinesa.
O padrão não difere muito do
que existia no mercado de habitação americano há cinco anos,
quando investidores faziam vagas suposições de que o valor
dos imóveis subiria para sempre e assim adquiriram títulos
hipotecários -mas ignorando
os detalhes do mercado hipotecário de risco ("subprime").
Desta vez, continua a haver
motivo para acreditar que a história da China terminará melhor que a saga do "subprime";
afinal, a liderança chinesa age
(em geral) de maneira sensata.
Mas, caso esse otimismo se
prove infundado, o futuro
"choque" pode ser doloroso.
Tenha em mente, para citar de
novo o Goldman Sachs, que a
China é 14 vezes maior que a
Grécia; e ainda mais opaca.
Tradução de PAULO MIGLIACCI
Texto Anterior: Análise: O Brasil e a diáspora das empresas asiáticas Próximo Texto: Portugal Telecom quer comprar controle da Vivo Índice
|