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LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS
No lugar certo na hora certa
Os dados recém-publicados
sobre o PIB de vários países,
no 1º trimestre, permitem ver resultados do descolamento
BASTA QUE eu associe a bonança
econômica que estamos vivendo a partir do crescimento
da China para que receba e-mails
irados de leitores, que me acusam
"de dor-de-cotovelo" pelo atual sucesso da economia no governo Lula.
Não tenho por hábito responder a
esses senhores e senhoras, pois minha função neste espaço público que
a Folha me abre semanalmente é
refletir sobre o dia-a-dia da economia brasileira e mundial. Nessa
função, não me oriento por valores
político-partidários, mas apenas
pelo raciocínio econômico. Aprendi há muito tempo, com o dr. Roberto Campos, a separar o bolso de
outros sentimentos quando se trata de análise econômica.
Faço esse preâmbulo porque os
dados recém-publicados sobre o
crescimento do PIB de vários países, no primeiro trimestre do ano,
permitem mostrar ao leitor os resultados concretos de um fenômeno novo na economia mundial, sobre o qual já tratei recentemente
nesta coluna. Ele se chama "descolamento". Em outras palavras, o
aparecimento de duas zonas de
crescimento econômico no mundo
globalizado de hoje. Uma delas está
vinculada mais diretamente à economia americana; a outra, à dinâmica chinesa, que adquire cada vez
mais vigor interno. Para ser mais
preciso, poderia dizer que existe
uma terceira -e aqui a Europa é
bom exemplo-, que sofre influência conjunta desses dois motores
principais da economia mundial.
Essa nova divisão do mundo
-processo recentíssimo- está clara nos números de crescimento recém-divulgados. A economia japonesa saiu de seu inferno astral -está crescendo mais de 3% ao ano-
exportando máquinas e equipamentos para a China. O mesmo está acontecendo com a Alemanha,
outro centro de excelência na produção de bens de capital. O Brasil é
o paradigma de outra força criada
pelo dinamismo chinês: as exportações de produtos primários para
o mercado desse novo gigante.
Nesse grupo estão também a África
do Sul, a Austrália e os países produtores de petróleo.
Do lado menos dinâmico atualmente estão os EUA e seus satélites mais próximos. O exemplo
mais claro desse grupo é o México,
que é uma antiga zona de processamento industrial para o mercado
americano baseada em mão-de-obra barata. No primeiro trimestre
de 2007, com uma política econômica similar à do governo Lula e
com fundamentos macroeconômicos até mais sólidos, o México cresceu apenas 2,6% ao ano. É o exemplo mais evidente de que o crescimento brasileiro -4,3% nesse
mesmo período- tem origens diferentes do que apenas a qualidade
da política econômica de Lula. A
política econômica similar e de
qualidade razoável do México e do
Brasil é condição necessária para o
crescimento no mundo atual, mas
a suficiência para atingir taxas
mais elevadas é dada pelo padrão
de inserção internacional. O México fornece para os EUA e concorre
diretamente com a China, situação
muito diferente da nossa, pelo menos por enquanto. É isso o que separa o crescimento medíocre mexicano, apesar de seus fundamentos, do crescimento mais robusto
de nosso país. Em outras palavras,
o forte vento chinês chega ao Brasil
com muito mais intensidade que
ao México. E tudo isso nada tem a
ver com opções políticas. Ao contrário, o padrão de inserção internacional hoje favorável ao Brasil
pode até induzir o governo a opções ruins, caso ele caia no erro de
creditar apenas a si mesmo a bonança atual.
LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS, 64, engenheiro e
economista, é economista-chefe da Quest Investimentos.
Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações
(governo FHC).
lcmb2@terra.com.br
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