São Paulo, sexta-feira, 22 de agosto de 2008

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS

A incrível força do mercado de trabalho


Para acompanhar a verdadeira dinâmica de nossa economia, é preciso observar com lupa os dados do mercado de trabalho

A MAIORIA dos analistas da economia brasileira traz do passado um vício que precisa ser corrigido. Acostumados a décadas de dominância de problemas financeiros de curto prazo, deixam de lado alguns indicadores cruciais da chamada economia real. Um exemplo desse comportamento é a importância que é dada à chamada pesquisa Focus, realizada, semanalmente, pelo Banco Central. A grande maioria dos indicadores pesquisados entre economistas do mercado financeiro é formada por indicadores agregados, como o saldo da conta corrente, vários índices de preços, taxas de juros e crescimento do PIB. Para quase todos eles, não faz o menor sentido essa mensuração semanal.
Por outro lado, importantes variáveis de natureza também microeconômica são deixadas de lado.
O exemplo que mais me chama a atenção é a pequena ênfase nos dados sobre emprego e renda, que certamente decorre da hierarquia de valores herdada dos anos de chumbo da nossa economia.
A base do crescimento do consumo dos brasileiros é hoje a expansão do emprego e dos salários. A chamada massa salarial está crescendo, como divulgou ontem o IBGE, a uma taxa de 7% ao ano acima da inflação. Esse aumento tem permitido ao sistema bancário expandir suas operações de crédito ao consumidor ao ritmo de 25% ao ano. E mais: os bancos hoje têm menos medo de um súbito aumento da inadimplência, justamente pelo dinamismo do emprego, o que reforça o ciclo de crédito. O encadeamento entre renda e crédito tem levado a um crescimento do consumo de 8% ao ano.
Com esse quadro de crescimento consolidado e entendido como de longo prazo, as empresas têm aumentado de forma agressiva seus investimentos, reforçando o crescimento da demanda interna. Por isso, quem quiser acompanhar a verdadeira dinâmica de nossa economia -inclusive para entender os problemas que estamos vivendo- deve observar com lupa os dados do mercado de trabalho.
O leitor pode perguntar, então, qual é a importância das variáveis que compõem o Focus. A resposta é simples: dada a certeza que existe hoje de que os pilares principais da política econômica serão mantidos pelo governo, os dados agregados passaram a ser menos informativos quando vistos isoladamente. Logo, será o acompanhamento de variáveis como emprego, renda, crédito e investimento que permitirá ao analista prever o comportamento de nossa economia.
Um exemplo do impacto do comportamento do lado real da economia pode ser encontrado na avaliação do atual ciclo de política monetária. Sem um entendimento correto de como os juros vão afetar o consumo e os investimentos privados, corre-se o risco de incorrer em erros graves de avaliação. Isso já ocorreu quando muitos analistas previram há alguns meses que o ciclo de aumento da taxa Selic seria pequeno, em torno de 2%. A situação atual é diferente da de 2004, principalmente pela dinâmica sólida do mercado de trabalho. E o brasileiro gosta de gastar.
A tarefa da política monetária -e da política econômica como um todo- é agora muito mais árdua do que a enfrentada nos primeiros anos da era Lula. O crescimento está mais uniforme e chegou a setores -como o da construção civil- com grande impacto sobre o emprego. Vamos aprender como os mecanismos da política monetária funcionam nessa nova economia.

LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS, 64, engenheiro e economista, é economista-chefe da Quest Investimentos. Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações (governo FHC).

lcmb2@terra.com.br



Texto Anterior: Saiba mais: Em sete meses, União arrecadou R$ 3,5 bilhões
Próximo Texto: Parecer do Ibama para Santo Antônio é ignorado
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.