São Paulo, domingo, 23 de março de 2008

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YOSHIAKI NAKANO

No auge do ciclo

A redução dos preços das commodities terá impactos sobre as exportações e o nosso crescimento

NOS PRÓXIMOS meses a economia brasileira atingirá o auge do ciclo de recuperação. Tudo indica que perderemos uma oportunidade histórica de transitar para crescimento acelerado e sustentado por longo prazo. Vários indicadores e eventos internacionais sinalizam que uma economia dependente de fatores externos para crescer, como a nossa, está chegando ao auge do crescimento. Da mesma forma, a recuperação do mercado interno está também chegando a seu limite com as restrições impostas pela política macroeconômica.
Com a crise financeira americana, o crescimento da economia mundial previsto pelo FMI em 5,2% foi revisto para 4,8%, depois para 4,1%, e nova revisão para baixo será anunciada. A economia americana deverá crescer menos de 1%, e a européia também desacelerará. A China, com a taxa de inflação atingindo 8,7% em fevereiro, fará esforços para desacelerar o crescimento. Eles anunciaram a meta de crescimento de 8% para este ano e, para atingi-la, será necessário desacelerar o crescimento em 3,4 pontos percentuais em relação ao ano passado. Os mercados de commodities já dão sinais de estar atingindo o pico -a queda dos preços vem ocorrendo pela recessão e pela saída dos afetados pela crise financeira. Estamos assistindo, simultaneamente, a desaceleração da economia global e o esfriamento dos preços de commodities com óbvios impactos sobre nossas exportações e nosso crescimento.
A metástase da crise financeira norte americana vem se mostrando com uma extensão maior e mais profunda do que se imaginava, podendo provocar uma reviravolta no fluxo de capitais, levando à depreciação do real e com impacto imediato sobre a taxa de inflação. Enquanto isso, a política de taxa de juros elevadas do Banco Central e a forte apreciação da taxa de cambial, desde 2004, vêm manifestando seus efeitos defasados, acelerando o aumento de importações, mês a mês, de forma que, em fevereiro passado, comparado com o mesmo mês do ano anterior, elas crescessem à taxa de 64,8%! Isso é insustentável, pois já no final do ano teremos um megadéficit nas transações correntes -e o desfecho desse quadro é bastante conhecido. Com a taxa de câmbio tão apreciada, não é à toa que o consumo doméstico cresça a 9% enquanto a produção doméstica cresça pouco mais de 5%. Obviamente, só uma explosão nas importações fecha as contas.
As condições das experiências bem-sucedidas de transição para crescimento acelerado por longo prazo são conhecidas: maior abertura da economia, ampliando de forma sustentável o fluxo de comércio externo, evitando para isso que a taxa de câmbio se aprecie; ampliação da taxa de investimento produtivo -no nosso caso, em pelo menos 5% em relação ao PIB, para que este possa crescer sustentadamente 5% ao ano; redução relativa do consumo do governo, para abrir espaço para a ampliação da taxa de investimento; e fazer as reformas institucionais necessárias no prazo de até cinco anos depois de iniciada a aceleração. Infelizmente, fizemos importantes avanços em algumas áreas, mas nem de longe construímos as condições acima.


YOSHIAKI NAKANO, 62, diretor da Escola de Economia de São Paulo da FGV (Fundação Getulio Vargas), foi secretário da Fazenda do Estado de São Paulo no governo Mario Covas (1995-2001).


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