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Casos de assédio moral crescem na crise
Desde fim de 2008, mais de mil trabalhadores entraram na Justiça paulista alegando humilhações e ameaças no emprego
Dificuldades nas empresas por causa da crise podem gerar situações de assédio, embora falte legislação federal específica no país
Filipe Redondo/Folha Imagem
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A.S., ex-diretor de RH, que diz ter sido ameaçado e acabou demitido
CLAUDIA ROLLI
FÁTIMA FERNANDES
DA REPORTAGEM LOCAL
A.S., ex-diretor de Recursos
Humanos de uma indústria de
motocicletas, diz que não
apoiou a demissão de centenas
de funcionários que poderiam
ser lesados em seus direitos.
Perdeu poder na empresa, foi
ameaçado veladamente e acabou demitido no mês passado.
O executivo decidiu cobrar
na Justiça do Trabalho o assédio moral que acredita ter sofrido após as medidas que a companhia adotou para enfrentar
os efeitos da crise mundial.
Vendedora de uma empresa
de cosméticos, M.S. diz que foi
isolada por colegas que temiam
a competição no trabalho. Passou a receber e-mails com vírus
para atrasar e desqualificar seu
desempenho. Teve de trabalhar
de madrugada para colocar o
serviço em dia até ser afastada
por doença física e psíquica e
também acionou a Justiça por
assédio moral.
Advogados relatam que a
pressão para melhorar os resultados diante dos efeitos da crise
mundial se dissemina e coloca
cada vez mais trabalhadores
-como o ex-diretor de RH e a
vendedora- em situações de
possível assédio moral.
Em 12 escritórios de advogados consultados pela Folha na
última semana, aumentou desde outubro o número de ações
trabalhistas ou de consultas
para abrir processos e pedir indenizações por assédio moral.
A Associação dos Advogados
Trabalhistas do Estado de São
Paulo (AATSP) estima que os
mil profissionais associados ingressaram na Justiça com ao
menos uma ação de assédio
moral cada um desde que a crise se agravou no final de 2008.
Procuradores do Ministério
Público do Trabalho em seis
Estados (Rio, Pernambuco,
Piauí, Ceará, Santa Catarina e
São Paulo) e no Distrito Federal investigam 145 denúncias
recebidas neste ano sobre assédio nos setores aéreo, bancário,
metalúrgico e de comércio.
É considerado assédio moral
um conjunto de condutas abusivas, frequentes e intencionais
que atingem a dignidade da
pessoa e que resultam em humilhação e sofrimento. "O assédio moral, também chamado
de "terror psicológico" no trabalho, é hoje um dos requisitos
para aumentar a produtividade
nas empresas, que precisam
ser mais competitivas contra a
crise", diz Luiz Salvador, presidente da Abrat (associação brasileira dos advogados do setor).
Com o acirramento da competição, o assédio moral tende
a crescer intra e entre os grupos nas empresas de diferentes
setores -principalmente em
segmentos onde a tensão é
maior, como mercado financeiro e empresas que tiveram o
patrimônio reduzido na crise.
"Existe uma crise real e uma
imaginária, que torna os funcionários mais inseguros e angustiados. Com essa tensão coletiva, o clima é de maior disputa. Quem está fora do mercado
quer entrar, e quem está dentro não quer sair. Os gestores
são mais pressionados, pressionam os empregados da produção, e as situações de assédio
vão se alastrando", diz o pesquisador Roberto Heloani, professor da FGV e da Unicamp.
O número de consultas ao site (www.assediomoral.org.br)
cresceu cerca de 20% desde
que a crise se agravou, em outubro, afirma Heloani, coordenador do site. Em alguns escritórios paulistas, a demanda por
essas informações subiu em
30% nos últimos dois meses.
O assédio, que se espalha do
alto escalão à produção, atinge
trabalhadores de todas as rendas. Um alto executivo americano que veio ao Brasil comandar grupo de assuntos estratégicos de um banco por quase
R$ 60 mil mensais já recorreu à
Justiça por assédio. Com a crise, sua função foi extinta. Ele
foi deixado em casa até o banco
romper seu contrato, antes do
prazo previsto e sem pagar a
devida indenização.
Cobrar metas faz parte do
dia a dia de qualquer empresa.
O problema, dizem os especialistas, é a forma dessa cobrança. Se houver humilhação e
ameaça, está caracterizado o
assédio. "A imposição de metas
para alcançar maior produtividade não implica qualquer violação aos direitos do empregado. Ao contrário, já que podem
servir como motivação para alcançar bônus ou prêmio. Mas
as metas não podem ser absurdas nem abusivas", diz Otavio
Brito Lopes, procurador-geral
do Trabalho.
Não há legislação federal específica para o assédio moral
no Brasil. Por isso, parte dos
advogados crê que, em épocas
de crise, o assédio pode ser
"usado" pelos trabalhadores
para pleitearem indenizações.
"Há pedidos absurdos relativos a assédio moral e com valores desproporcionais. Essa situação é fruto da angústia e desespero dos trabalhadores
quando são demitidos. Com isso, demandas verdadeiras de
assédio moral ficam sujeitas à
ideia de também serem despropositadas", diz o advogado
Guilherme Miguel Gantus.
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