|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
NOVA ECONOMIA
Presidente da empresa, que também criou o Kazaa, diz que ela não perdeu identidade com venda para a eBay
Skype ainda acredita em telefonia paga
ALISON MAITLAND
DO "FINANCIAL TIMES"
Como presidente de uma companhia que deseja revolucionar a
maneira pela qual o mundo se comunica, Niklas Zennström é um
homem surpreendentemente difícil de contatar. O site do Skype, a
companhia que ele dirige e cujo
software permite telefonemas
gratuitos via internet, não informa o endereço dos escritórios do
grupo nem oferece telefone para
contato.
Talvez esse sueco de fala rápida,
que lançou o Skype em parceria
com o sócio Janus Friis em 2003 e
o vendeu ao eBay no ano passado,
embolsando pagamento inicial de
US$ 2,6 bilhões, esteja tentando
provar alguma coisa àqueles dentre nós que ainda não ousam
abandonar os grilhões da telefonia convencional em troca da
conversação ilimitada no ciberespaço?
No escritório do Skype em Londres, localizado em uma rua lateral sem graça no bairro do Soho,
perto de Picadilly Circus, Zennström ri da idéia e explica que operar uma central telefônica não se
enquadra ao modelo de negócios
que ele propõe.
"Temos mais de 80 milhões de
usuários e registramos 250 mil
novos assinantes ao dia", diz.
"Oferecemos serviços gratuitos.
Se decidíssemos dar assistência
técnica completa a todos os usuários, tanto gente nos ligaria que o
custo se tornaria proibitivo."
O escritório dispõe de "algumas" linhas convencionais de telefonia, incluindo uma de fax,
mas qualquer dúvida ou questão
será respondida de maneira mais
rápida se o interessado preencher
um formulário no site, diz ele. Na
minha experiência, tentar contatar empresas dessa maneira é ineficiente. Mas o Skype, por outro
lado, não é exatamente uma companhia convencional.
Os admiradores de Zennström
no setor de "venture capital" (capital para empreendimentos de
risco) dizem que ele pode se tornar um novo Michael Dell (da
Dell), Jeff Bezos (Amazon) ou até
mesmo Bill Gates (Microsoft),
com quem é parecido fisicamente. Mas, se você não o conhece, é
difícil distinguir quem exatamente é o chefe, no escritório sem divisórias do qual a empresa é comandada.
Ele se senta numa longa mesa de
canto, compartilhada por meia
dúzia de outros colegas, e está absorto na tela de um computador à
sua frente. Não se pode nem dizer
que aquele é o lugar dele, já que
outros funcionários costumam
ocupar sua posição quando
Zennström viaja.
Em janeiro, quando a equipe de
Londres voou para uma reunião
da companhia na Estônia, onde o
Skype desenvolve seu software, o
presidente-executivo, um homem de 1,95 metro, viajou no assento do meio, aprisionado entre
dois passageiros na classe turística de um vôo comercial.
Ele entra na sala de reunião vestindo uma camisa xadrez, de colarinho aberto, e calças de veludo
escuras, trazendo na mão uma caneca de café, que manipula enquanto fala.
Por trás da aparência discreta,
porém, existe uma vontade férrea.
A missão do Skype é mais importante do que o status ou o nome
do cargo e ele espera que todos os
demais funcionários compartilhem desse sentimento.
"Se as pessoas começam a se posicionar internamente para obter
mais poder ou um cargo melhor,
estão na empresa errada", diz.
"Não temos tempo para disputas
políticas internas que acontecem
nas grandes empresas. No começo, fizemos diversas contratações
que não funcionaram. É preciso
perceber esse tipo de problema
cedo e dispensar essas pessoas."
Kazaa
Zennström, que acaba de completar 40 anos, é conhecido por
desenvolver tecnologias perturbadoras. Ele e Friis criaram o Kazaa, software que permitia que
milhões de usuários compartilhassem arquivos musicais ilegalmente via internet e gerou processos judiciais contra os criadores.
O que fez com que ele tomasse
esse rumo? Filho de um casal de
professores de Uppsala, ele nega
que seja um radical. Mas, como
consumidor, o imenso poderio
das grandes corporações o incomoda. "Todos têm a obrigação de
lutar contra os monopólios e também contra as empresas que oferecem maus serviços", afirma.
Depois de concluir simultaneamente cursos superiores de engenharia e administração de empresas, ele começou a ganhar experiência como gerente encarregado de desenvolver novos negócios
na Tele2, uma empresa de rápido
crescimento que ele descreve entusiasticamente como a primeira
empresa européia de telecomunicações a desafiar a companhia dominante do setor.
A seguir, ele contratou Friis, um
jovem e "brilhante" dinamarquês
com pouca educação formal mas
grande capacidade intuitiva para
conceber modelos de negócios
nada convencionais, e os dois
vêm trabalhando em estreita colaboração desde então.
Zennström é um líder natural,
de acordo com Howard Hartenbaum, que acompanha sua carreira há muito e foi o primeiro investidor a apoiar o Skype, quando os
profissionais de "venture capital"
na Europa "não chegariam perto
dele nem usando luvas", devido à
disputa judicial entre a indústria
do entretenimento e o Kazaa e à
hesitação do mercado depois da
bolha do setor de internet.
Hartenbaum, hoje sócio da Draper Richards, empresa de "venture capital" na costa oeste dos Estados Unidos, lembra que a visão de
Zennström o "capturou". Ele diz:
"Fiquei tentado a deixar o setor de
"venture capital" e simplesmente
segui-lo. Provavelmente deveria
tê-lo feito, porque assim teria
mais ações. Mas comprei número
suficiente".
Receita
Ao contrário da maioria das
empresas, o Skype não fatura dinheiro com a maioria de seus
usuários, que usam seu software
de download gratuito para realizar telefonemas usando seus
computadores.
A receita da empresa -US$ 60
milhões no ano passado e meta de
US$ 200 milhões neste ano- é
derivada da minoria de assinantes
que paga para fazer e receber telefonemas de e para linhas telefônicas convencionais e móveis
(SkypeOut e SkypeIn) e de serviços como correio de voz.
Zennström se irrita diante de
qualquer sugestão de que o eBay
teria "tomado o controle" de sua
empresa. O Skype continua a ter
estratégia, orçamento, cultura e
marcas separadas, aproveitando,
ao mesmo tempo, a sinergia com
o eBay, ele afirma.
"Uma das coisas importantes
para nós, e também uma das melhores coisas quanto ao eBay, é
que desejávamos garantir que pudéssemos nos fundir com uma
empresa maior sem que o Skype
perdesse a identidade como companhia. Meg [Whitman, presidente-executiva do eBay] disse
que deveríamos aproveitar os recursos de que eles dispõem, mas
que ela não nos diria o que fazer,
porque nós éramos as melhores
pessoas do mundo para dirigir o
nosso negócio."
Agora que a Skype é parte do
eBay, porém ele não pode comentar sobre as perspectivas de que a
empresa saia do vermelho ou sobre a porcentagem de usuários
que pagam pelos serviços oferecidos pelo grupo.
O que ele tem a dizer sobre a
aparente contradição em sua estratégia? Os fundadores dizem
que querem "tornar possível ao
mundo inteiro conversar de graça", mas os serviços que geram receita dependem da sobrevivência
da telefonia tradicional.
A visão de "dominar o mundo"
é distante, admite Zennström.
"Em algum momento, esse modelo de receita desaparecerá, mas
esse momento ainda está muito
distante", diz. "Não é possível
acreditar que os pagamentos por
serviços telefônicos desaparecerão completamente."
Enquanto isso, o Skype está desenvolvendo outros serviços em
parcerias com produtores de
hardware e software, grupos de
varejo, operadoras de telefonia
móvel e até mesmo gravadoras.
O maior desafio para Zennström é controlar o crescimento
vertiginoso do grupo e comunicar
a cultura comum da empresa aos
novos recrutas que começam a
trabalhar na Europa, na Ásia e nos
Estados Unidos. Ele e Friis agora
contam com uma equipe executiva de oito membros, dois dos
quais oriundos do eBay.
A comunicação por meio do
Skype não é suficiente com uma
força de trabalho que quadruplicou para 300 funcionários de 30
diferentes nacionalidades em um
ano. "Há muitas ocasiões em que
é preciso garantir que as pessoas
em diferentes escritórios se conheçam e encontrem. Temos
muitos eventos sociais, organizados e desorganizados."
E a cultura da empresa tampouco pode ser imposta. "É a forma
de operar, o modo de se comportar. Começa com a contratação.
Eles precisam estar realmente excitados quanto à Skype como movimento, não como simples local
de trabalho."
Os excêntricos são bem-vindos,
até certo ponto. "Não se pode ter
uma equipe inteira dessas pessoas. É necessário que os gerentes
de projetos sejam muito bons. Jamais tivemos escassez de idéias. O
desafio é decidir quais são as
idéias corretas e implementá-las."
Será que o empresário serial que
já co-fundou quatro empresas se
sentirá tentado a seguir adiante?
Ele e Friis têm incentivo para ficar, dados os objetivos de lucros
que, se atingidos, elevarão o valor
de aquisição do Skype de US$ 2,6
bilhões a mais de US$ 4 bilhões.
Ele diz também que essa é a tecnologia de troca de arquivos que
ele vinha procurando desde 2000
e que deseja levar o projeto a bom
termo. "O dia em que você percebe que não sabe mais o que acrescentar é o dia em que você deveria
deixar a empresa. Não sei se estarei aqui pelo resto da vida. Mas,
enquanto eu tiver esse entusiasmo, tudo vai bem."
Texto Anterior: Declaração: 9 milhões entregarão IR na última semana Próximo Texto: Comida: McDonald's turbina lucro com lanche de US$ 1 Índice
|