São Paulo, quinta-feira, 23 de maio de 2002

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LUÍS NASSIF

Uma instituição nacional

O aniversário de 50 anos da Cemig não deve ser motivo de comemoração apenas de seus funcionários ou de Minas Gerais. A Cemig é patrimônio brasileiro.
Nos anos 50 coube a ela papel de vanguarda na implantação dos novos conceitos gerenciais no país. O Brasil saíra da Segunda Guerra tomado pelo desejo de se industrializar. A Segunda Guerra disseminou conceitos como o planejamento estratégico e a gestão. O esforço de guerra produziu uma pedagogia do planejamento que foi fundamental na reconstrução da economia mundial após o conflito.
No Brasil, esses conceitos foram trazidos inicialmente pelo Plano Salte, que exigia projetos para a liberação de recursos das instituições internacionais ao Brasil e para a contrapartida do governo brasileiro. Os recursos não saíram, mas os conceitos frutificaram. E, dentre os órgãos públicos e privados brasileiros, ninguém levou esse conceito tão longe quanto a Cemig.
Fundada e organizada por Lucas Lopes, sua primeira diretoria era um ministério. Compunham-na, entre outros, Mário Bhering, João Camilo Penna e Mauro Thibau.
Seus técnicos ajudaram JK no governo de Minas. Depois, trouxeram a metodologia de planejamento estratégico para o governo federal, por meio do Plano de Metas, que marcou o governo JK e o início da industrialização moderna no país. Pela primeira vez definiam-se começo, meio e fim de projetos, prazos, responsáveis, recursos orçamentários.
O governo JK foi um descalabro fiscal, quebrando uma longa tradição de cuidado com as contas públicas. Mas a culpa maior foi a decisão de construir Brasília, o que arrebentou com todo tipo de controle orçamentário e permitiu a JK manter coesa sua base de apoio política, por meio de concessões das mais variadas.
Seu governo se consagrou nas frentes que estavam subordinadas ao planejamento dos técnicos da Cemig, liderados por Lucas Lopes. Os planos de ação foram tocados por comissões independentes da máquina pública, trabalhando o conceito de processo.
Essa tecnologia, depois, foi transferida para o recém-criado BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), que, a partir dessa base sólida, se tornaria o grande agente público de planejamento privado no país, fundamental para a modernização da planta industrial brasileira, em que pesem os equívocos nos primeiros anos da década de 1980.
É curioso que certo pensamento econômico raso teime em diferenciar planejadores e liberais, incluindo no segundo grupo Roberto Campos e Octávio Gouvêa de Bulhões, como se o planejamento fosse um conceito ideológico, e não uma ferramenta de trabalho das mais relevantes.
Mais do que sábios, eram pessoas que corriam atrás de resultados e suas idéias somente se concretizaram quando organizadas pela metodologia de planejamento implantada pelos técnicos da época, a maioria proveniente do setor elétrico.
Sistematicamente alguns desses gladiadores do "neoliberalismo" confundem planejamento com planificação e toda forma de organização de ações como intervencionismo. São pessoas que jamais frequentaram ambientes empresariais, especialmente das grandes corporações, nos quais a visão de futuro precisa ser desdobrada em planos de ação, com quantificação de metas, acompanhamento, previsão de recursos, reavaliações. O que seriam das idéias do mais visionário dos brasileiros, Eliezer Baptista, sem as ferramentas do planejamento estratégico trazidas pelos pioneiros da Cemig?
Pragmáticos, objetivos e visionários, simultaneamente, a geração do pós-guerra, a mais relevante da história do Brasil, lançou as bases da moderna economia brasileira. Por trás de tudo isso estava o conhecimento acumulado dos técnicos da Cemig, os pioneiros que espalharam energia por Minas, e suas luzes pelo Brasil.
Por isso mesmo, os 50 anos da companhia não são apenas um evento mineiro, mas nacional.

E-mail - lnassif@uol.com.br



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