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ROBERTO RODRIGUES
Cadeias produtivas
A cadeia produtiva agrícola se divide em antes da porteira,
o que ocorre nas fazendas
e o depois da porteira
EMBORA o conceito da cadeia
produtiva na agricultura esteja bastante difundido, a prática deixa muito a desejar. Uma cadeia
produtiva agrícola começa na prancheta de um pesquisador científico
criando novas tecnologias e termina
na gôndola de um supermercado. E
se divide, conforme a clássica visão
de Ray Goldberg e sua equipe de
Harvard, em três capítulos: o que
vem antes da porteira das fazendas,
o que se passa dentro das fazendas e
o depois da porteira.
O primeiro -antes da porteira-
se caracteriza pelos insumos e pelos
serviços indispensáveis à produção
rural: a própria pesquisa científica, a
extensão rural, os fertilizantes, defensivos, os corretivos, as sementes,
as máquinas e equipamentos, o crédito, o seguro rural...
O terceiro -depois da porteira-
contém o transporte da produção,
sua armazenagem, a industrialização, a embalagem, a distribuição e o
comércio interno ou externo.
E ambos dependem intensamente do segundo, que conta com o
plantio, os tratos culturais e a colheita, tudo sob gestão vigorosa de recursos gerenciais e humanos, da
área comercial, da área ambiental,
fiscal, tributária, trabalhista, técnica, mecânica e um sem-número de
ações que fazem da atividade rural
de hoje uma verdadeira indústria a
céu aberto.
A soma das cadeias produtivas é o
agronegócio, que, no Brasil, é, igual a
29% do PIB, gera 37% de todos os
empregos, responde por 36% das
nossas exportações e por 92% do
saldo da nossa balança comercial. E
dele fazem parte os agentes responsáveis pelos fatores já referidos.
Mas o centro de tudo é o produtor
rural, de qualquer tamanho, do familiar ao empresarial. Se ele não
existisse, para que fabricar tratores,
caminhões, adubos, defensivos, colhedoras? Não haveria toda a massa
de emprego nessas fábricas, nem
nas instituições de pesquisa, nem
nos bancos, nem nas fábricas de alimentos, nos supermercados.
Para que fabricar geladeiras se não
houvesse alimentos? Ou microondas, ou pratos, talheres, copos, fogões? Na verdade, não há cidadão
que não dependa da agricultura,
muito mais do que imagina. Não só
porque está vivo em função do que
come. Mas por muito mais: calça
jeans não existiria sem algodão, camisas e gravatas de seda precisam de
plantações de amora, sapatos são de
couro, como bolsas, cintos, carteiras, estofamentos, e couro é boi; papel é árvore, assim como móveis,
construções, assoalhos e forros;
pneus e cabos vêm da borracha; assim como a camisinha que evita a
Aids; agasalhos de lã vêm da ovelha,
e assim por diante.
Não haveria TV, nem rádio nem
jornal sem anunciantes, assim como
os empregos dos marqueteiros. Que
anunciam roupas, sapatos, bebidas,
carros (que se movem com álcool e
pneus de borracha), moda, alimentos, liquidações de eletrodomésticos, e tudo isso depende da agricultura.
Como pode alguém ser contra o
agronegócio? Seria como estar contra a própria sobrevivência.
Uma cadeia produtiva só é eficiente, seu produto final só será competitivo em termos de preço e qualidade, se a distribuição da renda no seu
interior for equilibrada, de modo
que todos os elos sejam remunerados adequadamente. Para isso, a
renda do agricultor é essencial, e isso não tem acontecido.
Uma pena! Porque, neste exato
momento em que o leitor termina
esta leitura, milhares de homens e
mulheres espalhados por esse imenso sertão brasileiro estão plantando
ou colhendo algo para vivermos em
paz.
ROBERTO RODRIGUES, 64, coordenador do Centro de
Agronegócio da FGV (Fundação Getulio Vargas), presidente do Conselho Superior do Agronegócio da Fiesp e professor do Departamento de Economia Rural da Unesp - Jaboticabal, foi ministro da Agricultura. Escreve aos sábados, a
cada 15 dias, nesta coluna.
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