São Paulo, sábado, 23 de junho de 2007

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ROBERTO RODRIGUES

Cadeias produtivas

A cadeia produtiva agrícola se divide em antes da porteira, o que ocorre nas fazendas e o depois da porteira

EMBORA o conceito da cadeia produtiva na agricultura esteja bastante difundido, a prática deixa muito a desejar. Uma cadeia produtiva agrícola começa na prancheta de um pesquisador científico criando novas tecnologias e termina na gôndola de um supermercado. E se divide, conforme a clássica visão de Ray Goldberg e sua equipe de Harvard, em três capítulos: o que vem antes da porteira das fazendas, o que se passa dentro das fazendas e o depois da porteira.
O primeiro -antes da porteira- se caracteriza pelos insumos e pelos serviços indispensáveis à produção rural: a própria pesquisa científica, a extensão rural, os fertilizantes, defensivos, os corretivos, as sementes, as máquinas e equipamentos, o crédito, o seguro rural...
O terceiro -depois da porteira- contém o transporte da produção, sua armazenagem, a industrialização, a embalagem, a distribuição e o comércio interno ou externo.
E ambos dependem intensamente do segundo, que conta com o plantio, os tratos culturais e a colheita, tudo sob gestão vigorosa de recursos gerenciais e humanos, da área comercial, da área ambiental, fiscal, tributária, trabalhista, técnica, mecânica e um sem-número de ações que fazem da atividade rural de hoje uma verdadeira indústria a céu aberto.
A soma das cadeias produtivas é o agronegócio, que, no Brasil, é, igual a 29% do PIB, gera 37% de todos os empregos, responde por 36% das nossas exportações e por 92% do saldo da nossa balança comercial. E dele fazem parte os agentes responsáveis pelos fatores já referidos.
Mas o centro de tudo é o produtor rural, de qualquer tamanho, do familiar ao empresarial. Se ele não existisse, para que fabricar tratores, caminhões, adubos, defensivos, colhedoras? Não haveria toda a massa de emprego nessas fábricas, nem nas instituições de pesquisa, nem nos bancos, nem nas fábricas de alimentos, nos supermercados.
Para que fabricar geladeiras se não houvesse alimentos? Ou microondas, ou pratos, talheres, copos, fogões? Na verdade, não há cidadão que não dependa da agricultura, muito mais do que imagina. Não só porque está vivo em função do que come. Mas por muito mais: calça jeans não existiria sem algodão, camisas e gravatas de seda precisam de plantações de amora, sapatos são de couro, como bolsas, cintos, carteiras, estofamentos, e couro é boi; papel é árvore, assim como móveis, construções, assoalhos e forros; pneus e cabos vêm da borracha; assim como a camisinha que evita a Aids; agasalhos de lã vêm da ovelha, e assim por diante.
Não haveria TV, nem rádio nem jornal sem anunciantes, assim como os empregos dos marqueteiros. Que anunciam roupas, sapatos, bebidas, carros (que se movem com álcool e pneus de borracha), moda, alimentos, liquidações de eletrodomésticos, e tudo isso depende da agricultura.
Como pode alguém ser contra o agronegócio? Seria como estar contra a própria sobrevivência. Uma cadeia produtiva só é eficiente, seu produto final só será competitivo em termos de preço e qualidade, se a distribuição da renda no seu interior for equilibrada, de modo que todos os elos sejam remunerados adequadamente. Para isso, a renda do agricultor é essencial, e isso não tem acontecido.
Uma pena! Porque, neste exato momento em que o leitor termina esta leitura, milhares de homens e mulheres espalhados por esse imenso sertão brasileiro estão plantando ou colhendo algo para vivermos em paz.


ROBERTO RODRIGUES, 64, coordenador do Centro de Agronegócio da FGV (Fundação Getulio Vargas), presidente do Conselho Superior do Agronegócio da Fiesp e professor do Departamento de Economia Rural da Unesp - Jaboticabal, foi ministro da Agricultura. Escreve aos sábados, a cada 15 dias, nesta coluna.


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