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OPINIÃO ECONÔMICA
O risco do vale-tudo eleitoral
BENJAMIN STEINBRUCH
Já esquecemos a Copa do
Mundo e estamos em plena
campanha eleitoral para a Presidência. Em menos de um mês, vai
começar a propaganda gratuita
dos partidos na televisão. Antes
disso, seria interessante que os
candidatos refletissem sobre o
que pretendem colocar no ar no
horário gratuito e dizer em suas
entrevistas nos palanques eletrônicos.
É triste observar que, em campanhas passadas, imperou a lei
do vale-tudo. Não quero citar
exemplos. Mas todos sabemos que
questões familiares costumam ser
levadas a público, numa exposição desnecessária e maldosa de
problemas pessoais que em nada
contribuem para a tomada de decisão do eleitor. Denúncias não
comprovadas são tranquilamente
divulgadas como se fossem fatos
consumados. Mesmo que sejam
posteriormente desmentidas, seus
efeitos eleitorais não podem mais
ser apagados.
A lei do vale-tudo é uma das
duas pragas de nossas campanhas, ainda que a Justiça Eleitoral tenha conseguido dar uma
certa agilidade ao direito de resposta de candidatos ofendidos.
A imprensa também escorrega
frequentemente. Em nome da independência e da neutralidade,
muitas vezes atira para todos os
lados e atinge a vida privada do
candidato.
A campanha ideal seria aquela
em que todos os personagens tivessem um comportamento ético,
com imprensa e candidatos concentrando atenções em programas e propostas de governo.
A segunda praga de nossas
campanhas é o financiamento.
Segundo a maioria dos analistas,
seria mais adequado que os partidos tivessem financiamento público para realizar suas campanhas. Recursos do Orçamento ou
de algum fundo constituído por
doações seriam distribuídos de
forma razoavelmente igualitária
-apenas parcialmente dividido
em razão da representação partidária- para todos os partidos e
candidatos registrados na Justiça
Eleitoral.
Infelizmente, não temos ainda
uma lei para regular esse financiamento público. Está em vigor o
financiamento privado, que traz
uma série de deturpações e influências pouco democráticas ao
processo eleitoral.
Não há limites para gastos a
não ser os declarados pelos próprios partidos. Fernando Henrique Cardoso gastou oficialmente,
em 1998, US$ 41 milhões, apenas
US$ 2 milhões a menos do que Bill
Clinton em 1993. Neste ano, os
quatro principais candidatos pretendem gastar R$ 146 milhões.
Empresas podem doar até 2%
de seu faturamento anual. Pessoas físicas, até 10% de sua renda
bruta. A lei é detalhista e severa,
mas a fiscalização, falha. Por isso,
alguns candidatos gastam muito
mais do que declaram à Justiça
Eleitoral e utilizam largamente
uma contabilidade paralela, alimentados por recursos provenientes de caixa dois das empresas. Terminada a eleição, têm 30
dias para a prestação de contas,
prazo nem sempre cumprido.
Um levantamento feito pela
Transparência Brasil mostrou
que, em junho de 2001, muitos
Tribunais Regionais Eleitorais
não haviam ainda recebido a
prestação de contas de todos os
candidatos das eleições municipais de outubro de 2000. Contas
de campanha, portanto, ficam
abertas a novas doações paralelas
colhidas por candidatos já eleitos
e empossados.
Enquanto não muda a legislação sobre financiamento, seria
útil que pelo menos alguma norma da Justiça Eleitoral determinasse a divulgação dos nomes dos
doadores durante o próprio período de campanha eleitoral. Nada impede que os partidos sejam
obrigados a relacionar os doadores e as quantias em seus sites na
internet à medida que os recursos
forem sendo arrecadados. Como
não há financiamento público, o
eleitor tem o direito de saber
quem apóia seu candidato antes
de votar.
Sartre dizia que fazer política é
sujar as mãos. Talvez ele tenha
razão, mas não se pode aceitar
que candidatos e partidos adotem
o vale-tudo para chegar ao poder
nem em matéria de baixaria contra seus adversários nem em matéria de financiamento de campanha.
Benjamin Steinbruch, 49, empresário, é presidente do conselho de administração da Companhia Siderúrgica Nacional.
E-mail - bvictoria@psi.com.br
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