São Paulo, terça-feira, 23 de julho de 2002

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AGROFOLHA

COMÉRCIO

Falta de qualidade do produto brasileiro faz com que ganhos com exportações sejam menores que o possível

Brasil deixa de ganhar US$ 2 bi com couro

JOSÉ SERGIO OSSE
DA REPORTAGEM LOCAL

O Brasil deixa de ganhar cerca de US$ 2 bilhões por ano por não investir na qualidade do couro obtido a partir do gado abatido para a produção de carne. No país, apenas 8,56% do couro produzido é considerado de alta qualidade, contra 85% da produção dos EUA com essa qualificação.
De acordo com a Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária) Gado de Corte, a qualidade do couro produzido no Brasil, é extremamente baixa em relação à de outros países.
Da produção anual de 32 milhões de unidades, só 35% são exportados e, em geral, apenas couro semi-acabado (wet blue), com menor valor no exterior.
A produção brasileira que não é exportada é reaproveitada internamente. Ainda assim, pouco desse material é utilizado na fabricação de calçados (com maior valor agregado). Atualmente, 80% do couro utilizado pela indústria de calçados ainda é importado da Argentina e do Uruguai.
Segundo Edson Espíndola, pesquisador da Embrapa Gado de Corte, o produtor brasileiro de gado não tem incentivo nenhum para cuidar da qualidade do couro. A baixa remuneração que é dada ao pecuarista pelo produto não estimula gastos na propriedade para melhorar sua qualidade. Tenha qualidade ou não, o valor pago ao agricultor é fixo, diz.
"O produtor recebe um valor pequeno -de 7% a 10% do preço do animal, que é em média de R$ 700- do frigorífico a título de indenização pelo couro. A indenização pequena não estimula um cuidado maior com a qualidade", declarou.
Espíndola afirma que o primeiro passo para tentar melhorar a qualidade do couro produzido no país é conscientizar o produtor. Segundo ele, 60% dos defeitos no couro ocorrem com o animal ainda dentro da propriedade.
O uso errado de marcadores de ferro, ferimentos causados por arames farpados e carrapatos são os problemas mais comuns. A prevenção, diz, seria simples. Pequenas mudanças na propriedade e maior cuidado no manejo dos animais já seriam suficientes para aumentar a qualidade.
Outros 10% dos defeitos ocorrem durante o transporte dos animais da fazenda ao frigorífico. Grande parte dos caminhões que fazem esse transporte é velha e não é adaptada para isso. Assim, os animais machucam-se em parafusos e em correntes, danificando ainda mais o couro.
"O problema é que algumas dessas mudanças, apesar de simples, são caras. Trocar o arame farpado por arame liso, por exemplo, custa muito dinheiro. Adaptar caminhões, então, nem se fala", diz o Espíndola. "E, como isso não geraria melhor rendimento, fica difícil convencer o produtor a fazer as mudanças."
Segundo ele, uma forma eficaz de fazer os pecuaristas cuidarem melhor do couro seria criar incentivos oficiais à atividade. Ele cita a iniciativa do governo de Mato Grosso, que oferece desconto sobre o ICMS (Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços) para carcaças de bovinos que estejam dentro de certos padrões.
"Algo assim poderia ser feito para o couro. Mas, na verdade, só melhorando a remuneração do produtor na venda do couro é que a qualidade vai melhorar", diz ele.
Para ele, é preciso que os frigoríficos adotem padrões diferenciados de pagamento para couros com maior qualidade. Assim, diz, o pecuarista terá um incentivo real e imediato para cuidar da qualidade do produto.



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