São Paulo, segunda-feira, 23 de setembro de 2002

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Real fraco afeta a meta de inflação

NEY HAYASHI DA CRUZ
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Criado em 1999, o sistema de metas de inflação não conseguiu frear a alta dos preços nos últimos quatro anos. A vulnerabilidade externa do Brasil é apontada como um dos principais obstáculos à eficácia do regime durante o segundo mandato do presidente Fernando Henrique Cardoso.
Segundo estimativas do mercado, o IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo) deve registrar uma alta de aproximadamente 6,5% neste ano. Caso a projeção se confirme, a inflação acumulada entre 1999 e 2002 ficará em 32,4%. Essa alta dos preços não se compara à hiperinflação observada antes do Plano Real. Mas está bem acima da meta fixada pelo governo, de 23,2% para o período.
A distância entre a inflação projetada pelas metas do governo e o resultado efetivamente ocorrido é consequência, principalmente, da alta do dólar. No ano passado, a inflação ficou em 7,67%, enquanto a meta era de 4%. A alta de 20,9% registrada pelo dólar no período foi responsável por 2,9 pontos percentuais desse aumento, segundo o BC. Neste ano, a moeda dos EUA já subiu mais de 40%.
A alta do dólar é consequência da vulnerabilidade externa do país. São necessários mais da US$ 40 bilhões por ano para que se atinja o equilíbrio do balanço de pagamentos -que contabiliza todos os dólares que entram e que saem do país. Esse dinheiro vem na forma de empréstimos e de investimentos estrangeiros, que costumam sumir em épocas de crise. Foi o que aconteceu, por exemplo, durante as crises asiática (1997) e russa (1998). Mais recentemente, o fluxo de capital externo foi influenciado pela moratória argentina e pelo desaquecimento da economia dos EUA.
"As fraquezas do desempenho do sistema se deveram mais ao contexto geral da economia brasileira, muito vulnerável a todo tipo de choques, do que ao sistema de metas inflacionarias em si", afirma o economista Fernando Cardim, professor da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro). Para o ex-diretor do BC Sérgio Werlang, um dos idealizadores do sistema de metas adotado no país, a inflação ficou acima do esperado pelo governo porque os objetivos traçados foram muito otimistas. "As metas colocadas eram apertadas. Foi um exagero", diz.
Até agora, apenas as metas fixadas para 1999 e 2000 foram cumpridas. Para este ano, a meta é de 3,5% com variação de até dois pontos percentuais para cima ou para baixo, mas a alta dos preços deve chegar a 6,5%. Em 2001, para uma meta de 4%, a inflação ficou em 7,67%.
Werlang afirma que o atual regime poderia ser aperfeiçoado com a adoção do chamado núcleo de inflação, que não considera nos seus cálculos a variação dos preços mais sensíveis à alta do dólar, como as tarifas públicas. O economista diz que o sistema é o mais adequado para manter a estabilidade monetária no Brasil. "Não existe alternativa ao sistema de metas", afirma.
Em relação a políticas de controle de inflação, os oito anos do governo FHC se dividem em duas partes: no primeiro mandato (1995-1998), a estabilidade era perseguida pela âncora cambial, em que a cotação do dólar era controlada pelo governo e ficava próxima de R$ 1 ou dentro da variação de um piso e de um teto.
Diante das pressões do mercado, o governo foi obrigado a abandonar o câmbio controlado em janeiro de 1999. De lá para cá, o controle da inflação é feito por meio do sistema de metas de inflação. A cotação do dólar flutua de acordo com os humores do mercado. As intervenções do BC são para evitar grandes oscilações na taxa da moeda americana.
A inflação registrada durante o regime de metas só é superada pela alta dos preços ocorrida entre 1995 e 1996, quando a economia ainda passava por um processo de desindexação e a estabilidade monetária ainda se consolidava.


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