São Paulo, quinta-feira, 23 de outubro de 2008

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Queda do petróleo ameaça Orçamento da Venezuela

FABIANO MAISONNAVE
DE CARACAS

A queda brusca do preço do petróleo e o contínuo aumento dos gastos públicos têm provocado na Venezuela alertas sobre a debilidade da economia diante da dependência quase total e crescente do produto.
As previsões pessimistas têm sido rechaçadas diariamente pelo presidente Hugo Chávez, segundo o qual o país se preparou para o "fim do capitalismo".
O preço do barril do petróleo venezuelano (mais baixo por ter qualidade inferior) despencou no fim da última semana a US$ 68, uma queda de 16% (US$ 13) em apenas sete dias, depois de passar a maior parte do ano acima dos US$ 100.
Ainda assim, o preço atual é superior ao do ano passado, com uma média de US$ 64,74. E muito maior do que quando Chávez chegou à Presidência, no início de 1999 -só US$ 8.
Apesar da gordura aparente, um estudo divulgado na semana passada pelo Deutsche Bank afirma que a Venezuela precisa de que o preço do barril fique, em média, a US$ 95 para evitar uma crise no Orçamento.
A exploração do petróleo é a única atividade econômica relevante da Venezuela, responsável por 94% das exportações e por cerca de metade da arrecadação fiscal. O principal comprador são os EUA, epicentro da crise e arquiinimigo do governo Chávez, com quase 45% das exportações.
É sobretudo com os dólares norte-americanos que o governo financia a expansão do gasto público por meio, entre outros gastos, de suas dezenas de programas sociais, das nacionalizações de setores como energia e siderúrgica e da importação de alimentos -80% do que comem os venezuelanos vêm do exterior.
"A situação na Venezuela pode ficar bastante difícil porque o gasto público é muito alto, e não será politicamente fácil ajustá-lo a uma menor renda petroleira", disse o economista-chefe do Banco Mundial para a América Latina, Augusto de la Torre, ao "Miami Herald".
Crítico de Chávez, o ex-diretor do Banco Central, Domingo Maza Zavala, disse à Folha que a Venezuela chegou ao fim de mais uma bonança petroleira repetindo os erros do passado.
"Não criamos uma economia produtiva, e o Estado se expandiu de maneira extraordinária: 2,2 milhões de pessoas vivem dele, o dobro do necessário. Esse encargo oculta o desemprego e não contribui para o aumento do PIB", argumentou.
Para o economista José Guerra, também ex-BC, o governo venezuelano deveria se precaver da inevitável redução na arrecadação cortando os gastos com compras de armamentos militares, reduzindo a ajuda internacional a países como Cuba e revertendo as estatizações do Banco Venezuela [do grupo Santander] e da cimenteira mexicana Cemex.
Em resposta às análises sombrias, Chávez, em plena campanha para as eleições regionais de 23 de novembro, afirmou ontem que, "se o preço do petróleo voltar como em 2006, quando terminou em US$ 55 o barril, tenham a plena segurança de que a crise mundial não afetará a Venezuela".
Em aparente demonstração de que a queda do preço não preocupa, o ministro das Finanças, Alí Rodríguez, apresentou anteontem o Orçamento de 2009, em que há um incremento nominal de 22% e um aumento de 37,6% para 46,5% de recursos petroleiros no total de arrecadação em comparação a este ano.
Para o presidente da Comissão de Finanças da Assembléia, o deputado chavista Ricardo Sanguino, o governo dispõe de reservas de US$ 40 bilhões, suficientes para "resolver todo o ano de 2009 e o primeiro semestre de 2010".
Em entrevista à Folha, Sanguino desestimou as análises internacionais sobre a Venezuela ("se estão tão certos, por que não previram essa crise?"). Na sua avaliação, o rígido controle de câmbio, que limita a chegada de capitais especulativos e a saída de divisas, protegeu o país da crise financeira internacional, ao contrário, diz ele, de Brasil e Chile.
De acordo com Sanguino, o aumento do gasto público foi necessário devido à imensa pobreza da população há dez anos, mas que essa fase está no fim. "Inicialmente tivemos de aplicar políticas assistencialistas, porém isso está sendo superado. Vamos agora à etapa produtiva", assegura.

Comércio com o Brasil
Se a crise afetar o poder de compra da Venezuela, o Brasil será um dos mais prejudicados. Sob Chávez, o país caribenho se transformou um dos mais importantes mercados para produtos brasileiros, com um saldo comercial favorável de US$ 3,2 bilhões somente nos primeiros nove meses deste ano.
Esse montante representa 16,4% do superávit da balança comercial brasileira no período, segundo dados do Ministério do Desenvolvimento.


Texto Anterior: Renault demite 300 da fábrica em Córdoba
Próximo Texto: Corte na produção para elevar preço pode rachar Opep
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.