São Paulo, domingo, 24 de fevereiro de 2008

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YOSHIAKI NAKANO

A metástase da crise do "subprime"


Estima-se o prejuízo dos bancos, num quadro otimista, em US$ 200 bi; no pessimista, em US$ 400 bi

O SETOR imobiliário dos EUA, que vinha contribuindo com pelo menos 1% do crescimento do PIB americano, entrou em colapso. Essa crise financeira está se estendendo e já provocou forte queda no crescimento americano no último trimestre de 2007 -anualizada, a taxa foi de apenas 0,6%. O ritmo das novas construções despencou, a taxa de desemprego está aumentando e há mais anúncios de falências das famílias e de instituições diretamente ligadas ao setor imobiliário. Os grandes bancos estão começando a contabilizar prejuízos trazidos pelas securitizações com lastro em hipotecas ou securitização lastreadas em securitizações. Com isso, a crise é também de crédito.
O problema maior é que as conseqüências da atual crise são desconhecidas, tanto na sua abrangência como na sua profundidade. Vivemos uma verdadeira situação de incerteza, pois não temos informações ou base para gerá-las e não há como dimensionar os prejuízos, já que muitos ativos financeiros não têm preço.
Sabemos apenas que haverá uma metástase do "subprime". Para dar uma referência do que isso pode vir a provocar, basta lembrar que, desde o início do boom imobiliário em 2000, os preços reais dos imóveis dobraram até o seu pico em 2006; de lá para cá, houve queda de 8%. Se a queda for de mais 25%, quando os preços se aproximarão da tendência histórica, a perda patrimonial das famílias deverá atingir cerca de US$ 6 trilhões -quase metade do PIB do país. Nesse caso, a maioria dos que compraram imóveis recentemente ficará com seu bem valendo menos que o financiamento. O governo vai socorrê-los?
Outro dado importante é o impacto do prejuízo dos grandes bancos e de outras instituições sobre a oferta de crédito. Estima-se o prejuízo, num quadro otimista, em US$ 200 bilhões; no pessimista, em US$ 400 bilhões. No quadro otimista, esses bancos contrairão a oferta de crédito em US$ 2 trilhões. Na incerteza, a cada nova informação relevante o mercado reage fortemente, daí a grande volatilidade no preço dos ativos financeiros, que traz conseqüências -só em janeiro, a Bolsa de Nova York sofreu perdas de US$ 5,2 trilhões -quase equivalente à perda provocada pela quebra da Nasdaq, que provocou a recessão de 2001.
A rápida resposta do governo deverá ter efeitos. Do subsídio fiscal de US$ 160 bilhões, US$ 100 bilhões serão em cheques aos consumidores, sendo que dois terços deverão ser convertidos em demanda. É alguma coisa. A drástica redução dos juros pelo Fed representará subsídio muito maior do que o fiscal. Se houver refinanciamento dos imóveis, a taxas de juros bem mais baixas, as famílias americanas terão alívio. Certamente virão medidas mais direcionadas, mas não há garantia de que não teremos uma recessão nos EUA com impactos sobre as economias européia, chinesa e brasileira.


YOSHIAKI NAKANO , 62, diretor da Escola de Economia de São Paulo da FGV, foi secretário da Fazenda do Estado de São Paulo no governo Mario Covas (1995-2001).


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