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Sem mudar, Duhalde
cai; se mudar, pode cair
FABRICIO VIEIRA
DE BUENOS AIRES
JOSÉ ALAN DIAS
DA REPORTAGEM LOCAL
O presidente argentino, Eduardo Duhalde, se verá obrigado a
realizar drásticas mudanças, primeiro em seu gabinete, depois na
política econômica, para ganhar
tempo e assegurar sobrevida a seu
governo que nem sequer completou três meses. Mas, para analistas
políticos, os dias de Duhalde estão, de toda forma, contados.
A mostra de debilidade da atual
administração ficou explícita anteontem. O presidente, reiteradas
vezes, afirmou que o câmbio estava sob controle. "Quem comprar
dólares a 2,50 pesos perderá dinheiro." E o dólar fechou a 3,10
pesos na sexta. Quem comprou
dólar a 2,50 pesos ganhou 24% em
menos de uma semana.
O analista político Enrique Zuleta Puceiro diz que, diante do fracasso da faceta do Duhalde negociador e estadista, que deveria
promover um governo de transição em um país arruinado, prevalecerá o Duhalde caudilho. Será o
caudilho que substituirá técnicos/negociadores, como o ministro do Interior, Rodolfo Gabrielli,
e o chefe de Gabinete, Jorge Capitanich, por figuras políticas. Apenas nesse contexto, faria sentido
sondagens como a feita ao governador de Córdoba, José Manuel
de la Sota (presidenciável e um
desafeto público), para que assumisse a chefia de Gabinete.
O malabarismo político impediria que a derrocada de seu governo acontecesse antes de maio.
"Ele [Duhalde" quer morrer
matando, encurralando seus inimigos, porque sabe que não teria
chances em um pleito eleitoral. Só
não enfrenta mais problemas
agora porque não tem adversários: De la Sota e Néstor Kirchner
[governador de Santa Cruz e outro presidenciável do Partido Justicialista" também são execrados
por boa parte da população."
Um dos temores de Duhalde é
que os protestos voltem a ganhar
fôlego e saiam de controle, como
nos últimos dias de governo de
Fernando de la Rúa, que renunciou em dezembro de 2001.
"A disparada do dólar, o consequente aumento da inflação e o
desemprego recorde podem fazer
o colapso que derrubou De la Rúa
voltar a explodir. Duhalde sabe o
risco que corre e deve começar a
anunciar planos sociais para tentar acalmar os ânimos", afirma o
cientista político Hugo Haime.
Para Oscar Raúl Cardozo, outro
analista político, os protestos populares perderam impacto apenas temporariamente. "Passamos
por uma espécie de calma antes
da tormenta. Estamos à beira de
um retorno de protestos mais intensos", diz.
Mais abreviados podem ser os
tempos do ministro da Economia
Jorge Remes Lenicov. A penca de
elogios por parte da comunidade
financeira internacional para suas
demonstrações de racionalidade
tem se mostrado inócua. Lenicov
não conseguiu arrancar o que é
vital à Argentina: apoio financeiro. Duhalde, o mesmo que ratificou o plano econômico do ministro, virou-lhe as costas ao responsabilizá-lo pela desvalorização.
Demitir Lenicov e voltar ao câmbio fixo e à conversibilidade, essa
última possibilidade admitida pelo presidente na sexta-feira, em
Monterrey (México), é uma alternativa que ganha fôlego.
"Lenicov não resiste a um dólar
a 4 pesos. Mas dólar a 4 pesos não
significa apenas a cabeça de Lenicov. É violência social, hiperinflação e convocação de eleições
adiantadas", diz Puceiro.
A desvalorização do peso, que já
alcança os 68% desde o fim da
conversibilidade, no início de janeiro, empobreceu ainda mais a
população. Atualmente, cerca de
40% dos argentinos vivem abaixo
da linha de pobreza. "Os setores
mais pobres da Argentina estão
prontos para ir às ruas. A crise social já é maior que a do período de
De la Rúa", afirma o analista Aldo
Abram, da consultoria Exante.
"Hoje, vivemos sob uma bomba-relógio social. A opinião pública
já está em uníssono pedindo a cabeça da classe política. Mas é Duhalde quem está à frente do poder
no momento", diz Abram.
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