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Governo criará "monstro", diz ex-diretor da Aneel
CLAUDIO ANGELO
EDITOR DE CIÊNCIA
Com a usina de Belo Monte, o
governo está criando um
"monstro" no setor elétrico,
que, além de trazer problemas
sociais e ambientais, ameaça a
segurança energética nacional.
Quem diz isso não é um ambientalista, e sim um ex-diretor
da Aneel (Agência Nacional de
Energia Elétrica).
Hoje professor da Universidade Federal de Itajubá (Minas
Gerais), Afonso Henriques Moreira Santos integrou a primeira gestão da agência e foi secretário nacional de Energia durante o racionamento de 2001
(governo Fernando Henrique
Cardoso).
Segundo ele, ao se fiar em
grandes hidrelétricas na Amazônia, com linhas de transmissão distantes dos centros consumidores, o governo coloca o
sistema elétrico nacional na dependência de um bloco muito
grande de energia com grande
variação sazonal, já que os rios
da região se caracterizam por
grandes diferenças de vazão
entre "inverno" (chuva) e "verão" (seca).
"Belo Monte não é essencial
para a segurança do sistema",
disse o especialista à Folha. Na
verdade, argumenta, pode ser
prejudicial. "Grandes linhas de
transmissão são muito frágeis",
afirma, lembrando o blecaute
de novembro passado, causado
por uma interrupção na transmissão de Itaipu -já que o sistema elétrico é interligado.
"Com um tiro de espingarda
você derruba uma linha de
transmissão da Amazônia e
"apaga" o Brasil. Na sociedade
de hoje, ficar dez horas sem
energia pode ser mais traumático do que meses de racionamento."
"Bobagem"
Ele qualifica de "bobagem" o
argumento do governo de que a
usina é necessária para sustentar o crescimento econômico
de 6% ao ano. "Seis por cento de
crescimento significa 3.000
megawatts. Em dois anos de
crescimento, a gente "leva" Belo
Monte. Além disso, o governo
estabeleceu que ela tem cinco
anos para funcionar, senão
compra-se energia de terceiros.
Se vai comprar de terceiros,
não é tão essencial assim."
Para suprir a energia de que o
país precisa, Moreira Santos
diz ver um leque de opções, que
vão desde o uso do gás natural
da bacia de Santos (20 milhões
de metros cúbicos substituiriam Belo Monte, com a vantagem de que é possível controlar
o gás, e a vazão do Xingu, não)
até energia nuclear e eólica.
"Os Estados Unidos, em cinco anos, instalaram o equivalente a 25 mil megawatts hídricos em energia eólica", lembra.
O Brasil tem cerca de 400 megawatts instalados.
Outro ganho expressivo poderia vir da eficiência energética, que o país simplesmente
"abandonou", na visão do ex-secretário. "Poderíamos ter um
ganho da ordem de 3% ao ano, o
que reduziria pela metade a necessidade da expansão [da geração nacional]. Até os Estados
Unidos estão dando um banho
na gente em eficiência."
A opção do governo por hidrelétricas -em detrimento de
eficiência energética- é vista
até mesmo nas metas nacionais
de redução de emissões de gás
carbônico.
Por pressão da ex-ministra
Dilma Rousseff, a expansão das
hidrelétricas -Belo Monte incluída- conta como atividade
de mitigação do aquecimento
global, evitando a emissão de
99 milhões de toneladas de CO2
equivalente do total que o país
emitiria em 2020 se nada fosse
feito. Medidas de eficiência
energética responderiam por
15 milhões de toneladas, ou
0,6% da meta nacional.
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