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São Paulo, quarta-feira, 24 de setembro de 2003

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FMI diz que deve "ouvir e aprender"

FERNANDO CANZIAN
ENVIADO ESPACIAL A DUBAI

O diretor-gerente do FMI (Fundo Monetário Internacional), Horst Köhler, fez ontem uma autocrítica da instituição e disse que a ajuda dos países ricos aos mais pobres "não é apenas insuficiente, mas é descoordenada e imprevisível".
Köhler afirmou que o FMI deve aprofundar a "cultura de ouvir e aprender" e sugeriu que os países ricos procurem fazer concessões na área comercial em favor dos mais pobres.
"Devemos promover um amplo diálogo inclusivo e assegurar que a visão de todos os países seja levada em conta de maneira adequada", disse.
O número um do Fundo afirmou ainda que a sua instituição "precisa prestar mais atenção" às conexões entre países e regiões para prevenir crises.
O discurso de Köhler foi realizado na abertura formal do encontro de representantes de 184 países na reunião anual do FMI em Dubai, nos Emirados Árabes Unidos.
A declaração foi uma resposta retórica às demandas apresentadas nos últimos dias em Dubai pelos países em desenvolvimento, que cobraram maior peso nas decisões do Fundo e no acesso aos mercados desenvolvidos.
Durante todo o encontro em Dubai, o FMI tem procurado demostrar mudanças de atitude em relação ao discurso recente.
A nova "heterodoxia" do Fundo atingiu seu ápice com a aprovação de acordo com a Argentina, no sábado, considerado ""frouxo demais" por banqueiros e investidores.
Essa nova postura vem ganhando corpo desde que o Fundo passou a reconhecer que cometeu deslizes no gerenciamento de crises em alguns países.
Em seu pronunciamento, Köhler frisou os "benefícios" do trabalho e das críticas à própria instituição feitas nos últimos meses pelo IEO (Independent Evaluation Office), órgão do FMI criado para reavaliar de maneira independente os seus programas.
Recentemente, o IEO divulgou avaliações negativas sobre a atuação do Fundo no Brasil durante a crise da desvalorização do real, no início de 1999, e do papel desempenhado pelo FMI na Argentina.
"Os resultados [mostrados pelo IEO] reforçam a necessidade das mudanças que estamos tentando promover", disse Köhler.
O discurso "inclusivo", no entanto, não agradou a todos.
Logo após o pronunciamento, o delegado alemão no Fundo, Ernst Welteke, foi no sentido inverso e afirmou claramente que uma mudança na sistemática de decisões e normas do Fundo poderia comprometer o seu "bom funcionamento".

Fracasso em Cancún
Köhler também lamentou o fracasso das negociações comerciais em Cancún (México) há duas semanas e afirmou que os países envolvidos precisam "de vontade política para superar os problemas e voltar o quanto antes às negociações".
"Mais do que nunca, dependerá dos países desenvolvidos destravar o impasse na área agrícola", disse o diretor-gerente do Fundo, sugerindo que as nações mais ricas façam concessões ao pedido de acesso dos mais pobres a seus mercados agrícolas.
Nesse ponto, Köhler teve a concordância do seu compatriota alemão Welteke, que afirmou ser "inapropriado que os países industriais gastem centenas de bilhões de dólares para proteger seus produtos, tornando difícil explorar os benefícios da globalização".
Na mesma linha, o representante do Canadá, John Manley, disse que os acordos comerciais "deveriam assegurar benefícios aos países mais pobres".
Ao contrário do alemão e do canadense, Jean-Claude Trichet, represente da França, um dos países que mais oferecem subsídios ao setor, ignorou as críticas dos países em desenvolvimento.
"O fracasso das negociações em Cancún são lamentáveis", disse Trichet em tom lacônico.
Já o secretário norte-americano do Tesouro, John Snow, adotou uma posição intermediária e disse que "os Estados Unidos apóiam a posição do FMI de que ajustes são necessários para que a liberalização do comércio ocorra".
Os subsídios norte-americanos a seus agricultores somam hoje cerca de US$ 50 bilhões ao ano, e os dos europeus, US$ 100 bilhões.
Em Cancún, as negociações não avançaram e opuseram EUA, Japão e União Européia aos países em desenvolvimento reunidos no G21, liderados por Brasil e Índia.


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