São Paulo, quinta-feira, 24 de novembro de 2005

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RECEITA ORTODOXA

Analistas não descartam que Selic caia até 0,75 ponto em dezembro

BC poderá acelerar cortes se a economia não reagir

MARCELO BILLI
DA REPORTAGEM LOCAL

A queda de 0,50 ponto percentual na taxa de juros básica anunciada ontem mostra que o Banco Central, a despeito dos sinais de desaceleração do nível de atividade, resolveu manter a política de redução gradual dos juros.
Desde o final de 2002, o Brasil passou por dois ciclos de alta dos juros. Um começou em outubro daquele ano, quando as altas das expectativas de inflação levaram o Banco Central a reagir aumentando os juros. O outro começou em setembro do ano passado.
Foram dois ciclos distintos. No primeiro caso, o Copom reagiu a uma crise de confiança que alimentava a desvalorização do câmbio e, por tabela, as previsões de inflação. Em resposta, o BC promoveu um minichoque de juros. De outubro de 2002 a fevereiro de 2003, os juros subiram 8,5 pontos percentuais -média de 1,42 ponto por reunião.
Os juros também caíram rápido. De junho de 2003 a dezembro daquele ano, foram dez pontos percentuais, média de 1,43 ponto por reunião. Outros dois ajustes de 0,25 ponto trouxeram os juros nominais para os patamares mais baixos do período recente, em abril do ano passado: 16% ao ano.
Há quem diga que foi justamente essa velocidade que acabou dando combustível demais à economia, obrigando a novo ajuste em setembro de 2004, quando começou o último ciclo de alta dos juros. Ciclo que não respondeu exatamente a uma crise, mas que foi classificado pelo próprio Copom, quando começou, como "ajuste moderado" e "preventivo", ou seja, para evitar pressões inflacionárias geradas pelo aquecimento econômico.
Foram nove aumentos de juros desde então. Em média, as altas foram de 0,42 ponto percentual por reunião. Um ajuste, se comparado ao que começou em 2002, gradual. Os sinais emitidos pelo Copom e a avaliação de que uma política gradualista é sempre mais previsível e, portanto, recomendável, sugerem que o BC não vai arriscar uma redução mais forte.
O quanto esse gradualismo pode continuar é uma incógnita, mesmo para os olhos do mercado financeiro. Luis Fernando Lopes, do banco Pátria, por exemplo, avalia que, se o nível de atividade realmente cair no terceiro trimestre e se não houver reação forte no final do ano, o BC terá que acelerar o ritmo de queda. "Ficará claro que a economia está aquém de seu potencial e que o sacrifício imposto pela política monetária é excessivamente alto", diz.
Para Maristella Ansanelli, do banco Fibra, "há chances de o ritmo de cortes ser acelerado em dezembro". Algo que "depende muito de como virão os próximos dados da atividade econômica".
No mercado futuro, os sinais são que uma parcela importante dos investidores espera por essa aceleração. O volume de contratos DI (Depósito Interfinanceiro) negociados ontem foi recorde, superando os 2,3 milhões de contratos. A taxa do DI que vence na virada do ano caiu de 18,20% para 18,16%, mostrando que há uma parcela de investidores que apostam na possibilidade de o Copom cortar os juros em 0,75 ponto.
Para todos os analistas, o risco sempre é o BC errar na dose, o que, para muitos, é pecado mortal para um órgão que precisa ganhar credibilidade. Caso não só da autoridade monetária brasileira, mas de todo BC que opera em regime de metas de inflação em países que já sofreram com o descontrole de preços.
A política gradualista, claro, tem seu preço. Os juros remuneram a dívida pública e, quanto maior a taxa, maior os gastos do governo com os encargos da dívida. Os juros não matam a inflação com um tiro certeiro. Na verdade, a política monetária mira no nível de atividade: desaquece a economia para que, com a procura por produtos e serviços em baixa, os preços caiam também.
Não é à toa, portanto, que a economia tenha derrapado entre julho e setembro. A política gradualista mostra um Copom preocupado, por enquanto, só com a inflação. "O BC não passou o cheque de que a desaceleração é grave", sugere Lopes. Não falta quem diga, como Lopes, que um pouco de agressividade agora seria recomendável para trazer o país de volta aos trilhos do crescimento.


Colaborou Fabricio Vieira, da Reportagem Local


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