|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
RECEITA ORTODOXA
Analistas não descartam que Selic caia até 0,75 ponto em dezembro
BC poderá acelerar cortes
se a economia não reagir
MARCELO BILLI
DA REPORTAGEM LOCAL
A queda de 0,50 ponto percentual na taxa de juros básica anunciada ontem mostra que o Banco
Central, a despeito dos sinais de
desaceleração do nível de atividade, resolveu manter a política de
redução gradual dos juros.
Desde o final de 2002, o Brasil
passou por dois ciclos de alta dos
juros. Um começou em outubro
daquele ano, quando as altas das
expectativas de inflação levaram o
Banco Central a reagir aumentando os juros. O outro começou em
setembro do ano passado.
Foram dois ciclos distintos. No
primeiro caso, o Copom reagiu a
uma crise de confiança que alimentava a desvalorização do
câmbio e, por tabela, as previsões
de inflação. Em resposta, o BC
promoveu um minichoque de juros. De outubro de 2002 a fevereiro de 2003, os juros subiram 8,5
pontos percentuais -média de
1,42 ponto por reunião.
Os juros também caíram rápido. De junho de 2003 a dezembro
daquele ano, foram dez pontos
percentuais, média de 1,43 ponto
por reunião. Outros dois ajustes
de 0,25 ponto trouxeram os juros
nominais para os patamares mais
baixos do período recente, em
abril do ano passado: 16% ao ano.
Há quem diga que foi justamente essa velocidade que acabou
dando combustível demais à economia, obrigando a novo ajuste
em setembro de 2004, quando começou o último ciclo de alta dos
juros. Ciclo que não respondeu
exatamente a uma crise, mas que
foi classificado pelo próprio Copom, quando começou, como
"ajuste moderado" e "preventivo", ou seja, para evitar pressões
inflacionárias geradas pelo aquecimento econômico.
Foram nove aumentos de juros
desde então. Em média, as altas
foram de 0,42 ponto percentual
por reunião. Um ajuste, se comparado ao que começou em 2002,
gradual. Os sinais emitidos pelo
Copom e a avaliação de que uma
política gradualista é sempre mais
previsível e, portanto, recomendável, sugerem que o BC não vai
arriscar uma redução mais forte.
O quanto esse gradualismo pode continuar é uma incógnita,
mesmo para os olhos do mercado
financeiro. Luis Fernando Lopes,
do banco Pátria, por exemplo,
avalia que, se o nível de atividade
realmente cair no terceiro trimestre e se não houver reação forte no
final do ano, o BC terá que acelerar o ritmo de queda. "Ficará claro que a economia está aquém de
seu potencial e que o sacrifício imposto pela política monetária é
excessivamente alto", diz.
Para Maristella Ansanelli, do
banco Fibra, "há chances de o ritmo de cortes ser acelerado em dezembro". Algo que "depende
muito de como virão os próximos
dados da atividade econômica".
No mercado futuro, os sinais
são que uma parcela importante
dos investidores espera por essa
aceleração. O volume de contratos DI (Depósito Interfinanceiro)
negociados ontem foi recorde, superando os 2,3 milhões de contratos. A taxa do DI que vence na virada do ano caiu de 18,20% para
18,16%, mostrando que há uma
parcela de investidores que apostam na possibilidade de o Copom
cortar os juros em 0,75 ponto.
Para todos os analistas, o risco
sempre é o BC errar na dose, o
que, para muitos, é pecado mortal
para um órgão que precisa ganhar
credibilidade. Caso não só da autoridade monetária brasileira,
mas de todo BC que opera em regime de metas de inflação em países que já sofreram com o descontrole de preços.
A política gradualista, claro, tem
seu preço. Os juros remuneram a
dívida pública e, quanto maior a
taxa, maior os gastos do governo
com os encargos da dívida. Os juros não matam a inflação com um
tiro certeiro. Na verdade, a política monetária mira no nível de atividade: desaquece a economia para que, com a procura por produtos e serviços em baixa, os preços
caiam também.
Não é à toa, portanto, que a economia tenha derrapado entre julho e setembro. A política gradualista mostra um Copom preocupado, por enquanto, só com a inflação. "O BC não passou o cheque de que a desaceleração é grave", sugere Lopes. Não falta quem
diga, como Lopes, que um pouco
de agressividade agora seria recomendável para trazer o país de
volta aos trilhos do crescimento.
Colaborou Fabricio Vieira, da
Reportagem Local
Texto Anterior: Luís Nassif: Racionalidade na planilha Próximo Texto: Receita ortodoxa: Juros altos fazem a dívida pública crescer Índice
|