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RECEITA ORTODOXA
Mesmo com aperto de gastos, reduções da Selic e recompra de títulos pelo governo, endividamento aumenta
Juros altos fazem a dívida pública crescer
SHEILA D'AMORIM
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
A queda gradual dos juros nos
últimos dois meses não aliviou o
peso da atual política monetária
sobre a dívida pública. Em outubro, quando o Banco Central
anunciou a segunda redução consecutiva na taxa Selic, que serve de
referência para o mercado, os juros fizeram o endividamento do
governo federal em títulos crescer
R$ 11 bilhões.
O estoque final dessa dívida só
não subiu na mesma proporção
porque o Tesouro Nacional e o BC
recompraram R$ 6,89 bilhões em
papéis que venceram no período,
diminuindo o volume dos títulos
em poder dos investidores. Com
isso, a chamada dívida mobiliária
do governo federal passou de R$
933,22 bilhões, em setembro, para
R$ 937,34 bilhões em outubro.
A evolução dessa dívida em títulos da União traduz, em números,
a argumentação da ministra da
Casa Civil, Dilma Rousseff, de que
o governo estaria "enxugando gelo" ao restringir tanto os gastos
dos ministérios e manter, ao mesmo tempo, a taxa de juros elevada
para conter a inflação. No fim das
contas, a economia, conhecida no
jargão financeiro por superávit
primário, é integralmente consumida pela carga de juros e, ainda
assim, o endividamento sobe.
Em outubro, o impacto da taxa
de juros no estoque de títulos públicos federais foi quase quatro
vezes maior do que a economia
gerada pela União no mês anterior e que somou R$ 2,93 bilhões.
Mesmo juntando o superávit primário realizado na esfera federal
ao de Estados, municípios e Estatais, ainda assim o saldo de R$ 7,6
bilhões registrado em setembro,
não foi suficiente para compensar
integralmente o estrago dos juros
no saldo da dívida mobiliária.
Para a equipe econômica, no
entanto, o benefício é o fato de a
dívida ter "crescido menos". Enquanto não é possível diminuir
esse estoque em valores nominais, o governo trabalha para melhorar o perfil do endividamento,
trocando, por exemplo, papéis
que sofrem imediatamente com
oscilações nas taxas de câmbio e
juros por outros cuja rentabilidade é previamente combinada com
os investidores e não muda até o
vencimento (prefixados).
Em outubro, o Tesouro não
conseguiu manter a tendência de
aumento da participação desses
títulos prefixados, que caiu de
25,76%, em setembro, para
24,48% no mês passado.
Isso, segundo Ronnie Tavares,
coordenador de operações da dívida pública, se justifica porque
houve uma concentração de vencimentos de títulos prefixados em
outubro. "É comum isso acontecer no início de cada trimestre."
O mês passado, porém, foi um
dos mais tumultuados do ano na
esfera econômica devido às denúncias de corrupção envolvendo
o ministro Antonio Palocci (Fazenda), que posteriormente foram reforçadas pela briga pública
dele com a ministra da Casa Civil.
O enfraquecimento de Palocci,
com os questionamentos do mercado se ele ainda tinha apoio do
presidente Lula para sustentar a
política econômica, pode ter influenciado no comportamento
dos investidores que, em momentos de crise mais aguda, costumam preferir manter em carteira
títulos cuja rentabilidade varia todos os dias, de acordo com a taxa
de juros.
Esses títulos ainda representam
mais da metade da dívida mobiliária: 56,41%. Em setembro, essa
participação era de 54,85%. Além
disso, como a taxa de juros é elevada no Brasil, há uma demanda
cativa por esses papéis por parte
dos fundos de investimento que
oferecem aos seus cotistas rendimento equivalente à taxa praticada nas operações entre os bancos.
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