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MERCADO TENSO
"O risco agora é não investir o suficiente no Brasil", afirma Robert J. Pelosky, estrategista do Morgan Stanley
É hora de comprar ações, diz banco dos EUA
RICARDO GRINBAUM
da Reportagem Local
Chegou a hora
de voltar a investir no Brasil.
A opinião é do
norte-americano Robert J. Pelosky, 39, um
dos estrategistas
financeiros especializados em
mercados emergentes mais influentes dos Estados Unidos.
Jay Pelosky, como é conhecido, é
responsável por traçar a estratégia
para investimentos em países em
desenvolvimento para o Morgan
Stanley Dean Witter, um dos
maiores bancos de investimento
do mundo.
"Há cinco meses, nós pensávamos que o risco era investir demais
em ações brasileiras", diz Pelosky.
"Como a maior parte dos investidores está com poucas aplicações
no Brasil, o risco agora é não investir o suficiente no Brasil."
Na semana passada, Pelosky soltou um relatório para os clientes
do banco recomendando a compra
de ações brasileiras. As aplicações
dos clientes orientados por Pelosky somam algumas dezenas de
bilhões de dólares.
Numa carteira de ações ideal sugerida pelo banco, o analista recomendou um aumento de 2% no
volume de papéis brasileiros, em
contrapartida a uma redução nas
aplicações no Chile e no Peru.
"Como as pessoas têm uma expectativa muito negativa em relação ao Brasil, há um potencial muito grande de uma surpresa positiva", acredita.
Na sua opinião,existem boas empresas nas Bolsas de Valores brasileiras, principalmente de telecomunicações, energia elétrica e
bancos, a preços de barganha.
"É difícil imaginar o que poderia
fazer o preço das ações em dólar
cair a um patamar mais baixo do
que já está", diz Pelosky, que esteve
no Brasil na semana passada para
acompanhar as consequências da
desvalorização do real.
Um dos maiores defensores dos
mercados emergentes entre os
analistas financeiros norte-americanos, Pelosky acha que o Brasil
pode devolver a confiança nos países em desenvolvimento. "O Brasil
pode ser o ponto de virada", diz.
Apesar da aposta no Brasil, o estrategista do Morgan Stanley prevê
dias difíceis para o país. Nas suas
contas, a cotação da moeda ainda
deve chegar a R$ 1,80, apesar de
acreditar que o ponto de equilíbrio
está em torno de R$ 1,60.
Pelosky diz que o Brasil desvalorizou sua moeda numa condição
melhor do que a dos países asiáticos. Mesmo assim, ele disse que a
economia deve encolher cerca de
4% em 1999. De Nova York, Pelosky deu a seguinte entrevista à
Folha, por telefone:
Folha - O sr. está recomendando
a compra de ações brasileiras. O sr.
está confiante na recuperação da
economia brasileira?
Robert Pelosky - A decisão de
deixar a cotação do real flutuar
permite ao capital internacional
tomar decisões, com clareza, se deve ou não entrar no Brasil. Antes
da liberação do câmbio, havia uma
percepção amplamente difundida
de que a moeda brasileira estava
supervalorizada e, por isso, não
havia muita gente inclinada a
apostar no país.
É claro que existem muitas coisas
a serem feitas. Estamos de olho no
ajuste fiscal, na renegociação com
o FMI, na taxa de juros, na inflação
e na movimentação de capitais.
Mas eu penso que as pessoas estavam muito pessimistas sobre o
Brasil e na capacidade de o país
mudar a política cambial sem entrar numa espiral de desvalorização descontrolada da moeda. Acho
que temos boa chance de termos
uma surpresa positiva no Brasil.
Folha - O que o sr. está recomendando aos clientes do banco?
Pelosky - Como a maior parte
dos investidores está pouco exposta ao Brasil, penso que o risco hoje
é estar fora do país. Há cinco meses, nós pensávamos que o arriscado era estar apostando demais no
país e nós reduzimos nossa exposição às ações brasileiras no nosso
porta-fólio ideal, recomendado
aos nossos clientes. Agora eu acredito que o risco dos investidores é
não estar suficientemente expostos ao Brasil. Por isso, voltamos a
uma posição de equilíbrio em nosso porta-fólio ideal.
Folha - O sr. acredita que o Brasil
pode voltar a atrair investimentos?
Pelosky - O fato de a moeda flutuar permite aos investidores avaliar, com clareza, se eles acham os
preços atraentes, se as políticas
adotadas pelo governo são apropriadas e se eles pensam que os investimentos disponíveis no mercado financeiro são atrativos. Para
nós, uma cotação entre R$ 1,50 e
R$ 1,60 por dólar é atraente. As políticas que o governo está adotando em busca da reforma fiscal e os
esforços para manter a estabilidade são muito importantes.
Calculando-se em dólar, os investimentos no Brasil ficaram
muito atrativos. É difícil imaginar
o que poderia fazer o preço das
ações brasileiras cair mais dramaticamente do patamar que está hoje. Em compensação, posso ver,
por exemplo, que o eventual sucesso em conter a inflação pode levar
a uma redução dos juros. A queda
nas taxas poderia levar a uma alta
significativa das Bolsas em seis ou
nove meses.
Folha - Como o sr. compara hoje
o Brasil com outros mercados
emergentes?
Pelosky - Comparando os preços
em dólar, o Brasil apresenta algumas das mais atraentes oportunidades no mundo. São particularmente atrativas algumas companhias telefônicas, empresas de
energia elétrica e instituições financeiras. Essas empresas estão
extremamente atraentes, porque
são boas companhias, bem geridas. O Brasil tem empresas de excelente qualidade, com preço de
barganha.
Isso não ocorre todos os dias. Só
ocorre quando o ambiente é de incertezas e o Brasil oferece mais risco do que muitos outros países.
Mas, na minha opinião, o risco
maior de quem investe em mercados emergentes é estar com pequena exposição no Brasil.
Folha - O sr. acha que ainda corremos o risco da desvalorização
sair de controle como muitos investidores temem?
Pelosky - As chances que o Brasil
possa desvalorizar entre 20% e
30% em termos reais é bem razoável. Não estou dizendo que a moeda não vai se enfraquecer ainda
mais daqui para a frente. Mas o
Brasil é bastante diferente do México e da Ásia. Isso está ficando
mais evidente para as pessoas nos
últimos meses.
Uma das diferenças é que os investidores estrangeiros nunca foram grandes participantes do mercado de dívida interna brasileira. É
o contrário do que ocorreu no México, em 1994, quando 80% do
mercado de Cetes (títulos da dívida do governo mexicano) estavam
nas mãos de estrangeiros. Em
1998, entre 50% e 60% dos GKOs
(títulos do governo russo) eram
controlados pelos estrangeiros.
Outra grande diferença é que a
desvalorização brasileira não foi
uma surpresa como na Ásia. Todo
mundo acreditava que estava
ocorrendo um milagre econômico
na Ásia. Não há o mesmo senso de
surpresa no Brasil.
Além disso, a economia brasileira já está em retração, ao contrário
da Ásia, onde os países estavam
crescendo a 8% ou 10% ao ano, durante uma década. A economia
brasileira tem deflação. São situações diferentes.
Os papéis brasileiros estão muito
baratos, mesmo em termos de dólar, ao contrário da Ásia, que era
muito cara antes do colapso da
economia, em 1997. Além disso, o
Brasil tem reservas por volta de
US$ 40 bilhões e mais US$ 40 bilhões prometidos pelo FMI e por
instituições internacionais. No
México e na Rússia, os governos
esperaram até que que as reservas
se esvaziassem antes de desvalorizar.
A economia brasileira está muito
mais aberta do que no passado, o
que reduziu o potencial de crescimento da inflação. Como as expectativas são muito negativas, há um
potencial para surpresas positivas,
que é o que o que dá suporte às altas do mercado acionário.
Folha - O sr. é conhecido como
um dos maiores defensores dos
mercados emergentes. O sr. pensa
que esses mercados podem se recuperar?
Pelosky - Se o Brasil for bem-sucedido em encontrar seu caminho,
poderia marcar o fim de um período de alta volatilidade dos mercados emergentes nos últimos dois
anos. É difícil imaginar o que mais,
no universo dos mercados emergentes, poderia criar um medo global como o Brasil tem criado nos
últimos quatro ou seis meses. O
Brasil era o grande medo dos mercados. Não só entre os emergentes,
mas no mercado mundial.
Agora que o governo brasileiro
tomou a decisão corajosa de deixar
a moeda flutuar, os mercados estão bem em todo o mundo. O medo era maior do que a realidade.
Além disso, é importante notar
que temos muito mais liquidez no
mundo do que há seis meses ou há
um ano e meio. Os bancos centrais
estão reduzindo suas taxas de juros. Há um colchão de liquidez no
mundo. Espero que isso possa
marcar o começo de uma excelente
oportunidade para os investidores
em mercados emergentes.
Folha - É possível calcular quanto
dinheiro poderia retornar aos mercados emergentes?
Pelosky - Não, é muito difícil prever isso. Mas uma coisa é clara: para os mercados emergentes irem
bem como investimento devem
atrair investidores não especializados. Estávamos justamente nesse
processo, particularmente atraindo investidores norte-americanos,
quando a Rússia quebrou. Os investidores ficaram com medo da
volatilidade.
Precisamos reduzir a volatilidade para recuperar esses investidores. É por isso que digo que se o
Brasil tiver sucesso isso pode significar um ponto de virada. Não só
para o Brasil, mas para todos mercados emergentes.
Se você olhar para os Estados
Unidos ou para a Europa é difícil
encontrar oportunidades de valorização em empresas por seu potencial de gerar riqueza. Também
está ficando cada vez mais difícil
encontrar oportunidades de valorização por crescimento nos volumes de investimento nas Bolsas de
Valores. É possível que se reiniciem aplicações em países emergentes, por parte de fundos não especializados, mas não espero grandes volumes. Mas como as Bolsas
brasileiras estão movimentando
pouco dinheiro em relação ao que
movimentavam no passado, você
precisa de relativamente poucos
investimentos para elevar o preço
das ações.
Folha - Qual a opinião do sr. sobre o futuro imediato da economia
brasileira?
Pelosky - A situação é muito fluida. Eu e outros analistas do Morgan Stanley estivemos no Brasil na
semana passada e estamos chegando a um consenso de que deverá
haver uma queda no PIB superior a
2%, provavelmente algo como 4%.
Também pensamos que a moeda
pode se desvalorizar até R$ 1,80
por dólar, mas a cotação vai retornar e se estabilizar por volta de R$
1,50 ou R$ 1,60.
A decisão para deixar a moeda
flutuar foi acertada, particularmente em relação ao impacto fiscal. Se o governo tivesse optado
por aumentar os juros para defender a moeda, você teria um impacto negativo imediato nas despesas.
Deixar a moeda desvalorizar tem
um custo menor. Pensamos que o
problema fiscal é central no Brasil
e a combinação de políticas econômicas do governo está na direção
correta.
Folha - O sr. acredita que existe
risco de o governo brasileiro não
honrar sua dívida?
Pelosky - Não. Temos em nosso
porta-fólio ideal C-Bonds (títulos
da dívida externa brasileiro). Nós
não teríamos esses papéis se pensássemos que existe possibilidade
de calote. O governo reconhece a
necessidade de pagar suas obrigações externas, particularmente em
um momento como esse.
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