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Para Martone, conflito
reduz vendas do Brasil
MAELI PRADO
DA REPORTAGEM LOCAL
A guerra entre Estados Unidos e
Iraque vai atrasar a recuperação
da economia global, tornando o
mercado mundial mais pobre para as exportações brasileiras.
A consideração é do economista
Celso Luiz Martone, professor da
FEA (Faculdade de Economia,
Administração e Contabilidade)
da USP, que ressalva que as vendas externas devem empurrar novamente o crescimento do país
em 2003, "mesmo porque não há
outra alternativa".
Para Martone, outra consequência é que as incertezas decorrentes do conflito intensificarão a
cautela dos agentes internacionais, que tendem a tomar uma
posição mais defensiva em relação a países como o Brasil.
A seguir, os principais trechos
da entrevista.
Folha - O que podemos esperar
para a economia brasileira em
2003 com as incertezas da guerra?
Celso Luiz Martone - Existem
dois canais de como a perturbação da guerra pode interferir no
país: um financeiro e um comercial. Com o conflito, há um processo de aumento de cautela e os
agentes internacionais tendem a
tomar uma posição mais defensiva. Há busca por ativos mais seguros. O acesso do Brasil, um país de
alto risco, ao mercado de capitais
internacional vai continuar difícil
ou então piorar. Do lado comercial, havia uma expectativa de
que, após cerca de três anos de
desvalorização cambial acentuada, as empresas se engajassem em
exportações. Isso vem acontecendo, mas essa guerra vai atrasar
qualquer perspectiva de recuperação mundial. Isso vai tornar o
mercado mundial mais pobre para as exportações brasileiras.
Folha - Qual a situação da economia mundial?
Martone - A expectativa mundial era a de que a economia americana, que vinha em crescimento
medíocre, se recuperasse neste
ano e puxasse os outros países, já
que os traumas de 2000 e de 2001,
como escândalos corporativos e
atentados terroristas, estavam
sendo absorvidos. Só que, com a
decisão dos Estados Unidos de
atacar o Iraque, que cria uma nova fonte de incertezas, essa previsão de recuperação tem de ser, no
mínimo, postergada. Além disso,
em dois anos de governo, o presidente George W. Bush transformou um superávit fiscal de quase
3% do PIB em déficit de quase
3%, o que é um indicador de que a
economia americana vai ter problemas. A Europa, cujo crescimento está muito atrelado à economia americana, está em dificuldades, com crescimento muito
pequeno. O Japão não cresce nada, pois vem de uma recessão de
mais de dez anos. A atitude geral é
defensiva, tanto por parte do consumidor como do investidor.
Folha - Os investidores internacionais não estão olhando para países emergentes com maior atenção, devido à desaceleração de
grandes potências e a consequente
redução dos juros nesses países?
Martone - Esse efeito é pequeno,
mesmo porque os investidores
têm como opção o mercado asiático. Países como a China são
muito mais dinâmicos e interessantes para o capital internacional. A América Latina como um
todo está em uma fase muito ruim
-não é uma região do mundo
olhada com otimismo. No Brasil,
as incertezas levaram à exacerbação do risco-país no final do ano
passado. Na medida em que o novo governo assumiu e afirmou
que ia adotar uma posição econômica ortodoxa, esse excesso foi
sendo diluído. A atual política
econômica brasileira, que está
dando continuidade à do governo
anterior, inibe o crescimento do
país e nos mantém reféns dessa situação internacional.
Folha - Quais as alternativas para
uma independência maior do Brasil em relação ao exterior?
Martone - São necessárias algumas reformas estruturais para
nos livrarmos da armadilha da
dependência: reforma da Previdência, que produz rombo elevado e crescente, reforma tributária,
para melhorar nossa competitividade, reforma trabalhista e reforma fiscal mais ampla. Mas são soluções difíceis e de médio prazo, e
assim ficamos ao sabor das oscilações internacionais.
Folha - Como deve ficar o crescimento do Brasil neste ano?
Martone - No final do ano passado, as previsões médias de crescimento do país eram de 2,5% a 3%.
Hoje, apenas três meses depois, se
fala em 1,5%. Houve até um movimento de otimismo, porque havia
incerteza em relação ao novo governo e houve continuidade da
política econômica, mas apesar
disso a coisa não decolou. Em
2003, as exportações vão continuar puxando o crescimento brasileiro, até porque não há outra alternativa, mas isso fica condicionado a uma demanda externa
menor. Com a aceleração da inflação nos últimos seis meses, taxa
de juros reais alta e condições de
crédito difíceis, não há fontes para
o crescimento do país.
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