|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
OPINIÃO ECONÔMICA
A banheira de JK
BENJAMIN STEINBRUCH
Diz a história que Juscelino
Kubitschek teve a idéia de
elaborar seu Plano de Metas numa banheira, na casa de seu cunhado Júlio Campos, durante a
campanha eleitoral de 1955, em
Belo Horizonte. Empossado em 31
de janeiro de 1956, JK não perdeu
tempo. No dia seguinte, reuniu o
ministério e apresentou seu programa, cujo mote era "50 anos em
5".
Naquela época, o Brasil era um
país basicamente agrícola. Cerca
de 60% da população vivia no
campo, o PIB (Produto Interno
Bruto) não passava de US$ 8 bilhões e a renda per capita alcançava apenas US$ 140 anuais. O
Plano de Metas foi um sucesso
porque promoveu a rápida industrialização do país, substituiu importações e deu início às exportações de produtos manufaturados.
Por causa desse plano, JK é reverenciado até hoje como um grande estadista.
O Plano de Metas previa pesados investimentos em infra-estrutura nas áreas de transporte e
energia, em indústrias de base,
como siderurgia, papel e cimento,
e em indústrias de máquinas, navios e automóveis. Além disso,
programava a construção da nova capital no Centro-Oeste, Brasília.
Pelos seus objetivos ambiciosos,
JK foi considerado, na época, um
sonhador. Poucos achavam possível realizar tanta coisa em tão
pouco tempo. Mas, ao deixar o
governo, em 1960, boa parte do
sonho já era realidade. Duas linhas de montagem de automóveis funcionavam, o país produzia navios, as obras de infra-estrutura haviam avançado e a capital já era Brasília.
Para realizar seu plano, JK
abandonou a prudência econômica. Emitiu moeda, aumentou o
endividamento e deixou de lado o
controle de gastos. Conseguiu,
com isso, promover um crescimento médio de 7% ao ano no
PIB, mas, ao mesmo tempo, abriu
as portas para a inflação. Quando
terminaram os anos JK, a inflação estava em 40% ao ano.
O Brasil de hoje, passados mais
de 40 anos, não pode, evidentemente, reeditar a imprudência
econômica de JK. Precisa manter
o equilíbrio fiscal e o controle da
inflação. Apesar disso, está na hora de o país também resgatar um
pouco da ambição sonhadora de
Juscelino, voltar a fazer planos,
estabelecer metas e persegui-las
com obstinação.
Li há dias uma reportagem sobre a Índia. Apesar de todas as dificuldades da economia mundial
e dos megaproblemas de um país
com mais de 1 bilhão de habitantes, o governo da Índia mantém
seu plano de crescer 8% anuais
nos próximos cinco anos e tem
metas destemidas em quase todos
os setores. Na área do software,
na qual os indianos são craques,
pretende-se multiplicar por oito o
faturamento atual, atingindo
US$ 80 bilhões em 2008.
Na semana passada, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva
reuniu o ministério para começar
a elaborar o PPA (Plano Plurianual de 2004-2007). Ficou decidido que o programa será escrito
depois de amplas consultas aos
vários setores da sociedade para
ser apresentado ao Congresso em
31 de agosto.
Na atual conjuntura, que inclui
uma guerra, o PPA não pode ser
mirabolante e megalomaníaco a
ponto de comprometer a estabilidade com gastos irresponsáveis.
Mas o plano tem de ser ousado
em suas metas para a recuperação da infra-estrutura, principalmente de transportes e energia.
Precisa prever objetivos específicos para habitação, saúde pública
e saneamento. E deve também
contemplar medidas arrojadas de
apoio financeiro a projetos nacionais absorvedores de mão-de-obra.
Talvez seja bom que o PPA até
seja concebido numa banheira,
saído outra vez de uma cabeça
iluminada. Mas é verdade que a
discussão de meios e metas só pode ajudar a identificar as reais
possibilidades, carências e anseios
dos brasileiros. O governo deve,
porém, cuidar para que o plano
não seja prejudicado pelo assembleísmo, caracterizado pela discussão infindável e não-conclusiva dos temas.
Benjamin Steinbruch, 49, empresário,
é presidente do conselho de administração da Companhia Siderúrgica Nacional.
E-mail - bvictoria@psi.com.br
Texto Anterior: Para Martone, conflito reduz vendas do Brasil Próximo Texto: Imposto de renda: Não declare compra de ação com FGTS Índice
|