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INDÚSTRIA DO ATESTADO
Entre 2001 e 2004, pagamentos subiram de R$ 2,5 bi para R$ 9 bi; fraude envolve médicos e peritos
Gasto com auxílio-doença aumenta 260%
LEONARDO SOUZA
JULIANNA SOFIA
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Há no país uma indústria do auxílio-doença que provoca bilhões
de reais em prejuízo ao INSS (Instituto Nacional do Seguro Social).
São médicos peritos, advogados,
funcionários públicos e até políticos envolvidos em esquemas de
corrupção. De 2001 a 2004, os gastos com auxílio-doença subiram
260%, de R$ 2,5 bilhões para R$ 9
bilhões anuais.
Sorocaba, no interior de São
Paulo, é um dos maiores focos
desse tipo de fraude no Brasil, segundo informa o INSS. Com 552
mil moradores, a cidade é campeã
em requerimentos de benefícios
referentes a supostos problemas
de saúde decorrentes do trabalho.
Com a exceção dos municípios
de São Paulo e Rio de Janeiro, os
quais são divididos por regiões
pelo INSS, dada a grande população, Sorocaba supera todas as demais capitais do país.
Em janeiro deste ano, foram pedidos 7.726 auxílios-doença na cidade, contra 5.827 em Salvador e
5.758 em Belo Horizonte. As populações das das capitais mineira
(2,35 milhões de habitantes) e
baiana (2,63 milhões) equivale a
cinco vezes a de Sorocaba.
Segundo o superintendente do
INSS do Estado de São Paulo, Carlos Gabbas, quase 12% da população de Sorocaba chegou a viver de
auxílio-doença, enquanto a média no Estado é de 2%. Se fosse levada em consideração apenas a
PEA (População Economicamente Ativa), a distorção seria muito
maior. "É um absurdo, é fora de
propósito o que se passa em Sorocaba", diz Gabbas. O instituto não
informou quanto desses benefícios estariam fraudados.
São várias as formas fraudulentas adotadas para a obtenção de
auxílio-doença. Em uma delas, de
acordo com Gabbas, advogados
ligados às quadrilhas aliciam desempregados com a promessa de
dinheiro fácil. Pessoas sem contribuir para o INSS por mais de dez
anos entram num esquema.
Pela lei, após recolher a contribuição previdenciária por quatro
meses consecutivos, a pessoa se
torna apta novamente a requerer
os benefícios, independentemente de quanto tempo tenha ficado
inadimplente com o INSS.
Os advogados pagavam os quatro meses de contribuição do desempregado e, já no mês seguinte,
requeriam o auxílio-doença. "Isso
é um indício claro da fraude",
afirma Gabbas. O dinheiro do golpe depois era repartido.
Outro ponto chama atenção no
caso de Sorocaba. O município
integra uma região industrializada de São Paulo. Mas, do total dos
trabalhadores que requerem auxílio-doença, só uma pequena
parcela é formada por operários.
De 2000 para cá, foram concedidos no município 7,122 milhões
de benefícios pelo INSS, dos quais
5,114 milhões para funcionários
do comércio e 1,148 milhão para
contribuintes individuais. "É um
ralo de dinheiro público."
Segundo ele, a ação do INSS na
cidade, realizada a partir de 2003,
já reduziu bastante o número de
benefícios concedidos, apesar de
ainda ser muito alto.
O perito médico seria a peça-chave em várias fraudes do auxílio-doença. É ele quem verifica o
estado de saúde do requerente do
benefício. Segundo informa Gabbas, dois terços desses médicos
são terceirizados e atendem em
seus próprios consultórios, ganhando R$ 23 por perícia.
Assim, são facilmente cooptados pelas quadrilhas, que lhes enviam grande número de "pretendentes" ao benefício. "A fraude
está no exame médico", diz.
Corrupção
São muitos os casos em que os
peritos conseguem manter por
anos os pagamentos de auxílio-doença. Gabbas diz que foram
identificados várias situações em
que as guias com as informações
do beneficiário não eram sequer
preenchidas pelos médicos, com
o auxílio renovado automaticamente. Assim, muitos têm conseguido se aposentar por invalidez.
As fraudes com auxílio-doença
se tornaram um caminho para
políticos corruptos chegarem ou
permanecerem no poder. Sem citar nomes, Gabbas diz que há vários casos de médicos peritos do
INSS que se elegeram vereador. A
suspeita é que troquem laudos
aprovando a concessão do benefício por votos.
O superintendente do INSS afirma que há em andamento processo de cassação de um prefeito do
interior do Estado que estaria envolvido com quadrilhas de fraudadores.
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