São Paulo, sexta-feira, 25 de abril de 2008

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VINICIUS TORRES FREIRE

Meteorologia do pânico da comida


Otimismo sobre safra de trigo reduz preços, mas arroz ainda dispara e ninguém se entende sobre inflação da comida

O PÃOZINHO pode ficar menos caro. Já o franguinho comedor de milho, não. Relatório do Conselho Internacional de Grãos publicado ontem estima que a safra mundial de trigo (2008/09) será maior que o consumo, após dois anos no vermelho. Já o déficit global de milho deve continuar, pelo terceiro ano. Além de pipoca, frangos e porcos, de milho também se faz uma série de insumos de comida industrializada, como xaropes, amido etc.
Milho caro é inflação na veia. Na semana, houve mais notícias de relativo alívio a respeito do trigo -embora no final do ano passado a gente também tenha ouvido essa conversa. A Ucrânia revogou a restrição a exportações. Há boas perspectivas para as colheitas de Índia, Rússia e entorno, de Europa e China. Há chuvas boas na Austrália e na Argentina, embora os prognósticos dependam da água que vá cair nos EUA e no Canadá e do calor no norte da África. Nos grandes mercados mundiais de trigo, os preços caíram bastante ontem.
Parece a notícia da meteorologia no rádio ou boletins sobre Bolsas da TV. A alimentação e a inflação do mundo vão depender assim dessas cotações de feira semanal?
O preço do trigo está no dobro da média histórica. Nos portos europeus e americanos, está entre 60% e 70% mais caro que em abril do ano passado. Apesar da alta contínua no consumo depois de 2002, a coisa explodiu mesmo em 2007, pois.
Está difícil de achar uma análise menos inconclusiva sobre os fatores específicos da alta; a série de dados é recente e transtornada demais pelo estouro de preços e pelos novos consumidores. A gente ouve negociantes e estes dizem tanto que o arroz vai continuar em alta como que o grão pode cair 30% em seis meses. O pessoal do mercado financeiro que cuida de investimentos em índices de commodities ri feliz como em tempos de bolha, pois fazem bom dinheiro. Há muita demagogia, política nacionalista e interesses comerciais fazendo ruído no debate.
Mas as multidões que passaram a comer mais no mundo pobre e/ou remediado não devem deixar de fazê-lo, excetuada a hipótese improvável de uma catastrófica recessão mundial. Custos menores de produção e transporte ajudariam a reduzir o preço da comida (o frete marítimo equivale de 15% a 20% do preço dos grãos). Mas produção e transporte dependem de petróleo, que ora custa US$ 120 e está escasso mesmo. De resto, custo menor de produção não implica safras maiores.
Há quem diga que uma queda marginal no consumo de comida e até de petróleo derrubaria preços. Ou que a explosão de preços do final do ano para cá tem um pouco de especulação, de queda do dólar e bastante de pânico, de corrida para a proteção e formação de estoques. Até nos EUA hipermercados impõem cotas para o consumidor, mas parece lunático achar que vá faltar arroz nos Estados Unidos.
Até a semana passada, o arroz nos portos tailandeses estava 196% mais caro que em abril de 2007 (quando estava na média da década). A Tailândia negocia 30% do arroz mundial e diz que tem mercadoria. No resto, ninguém quer vender arroz. E está difícil até de tomar emprestado uma opinião segura sobre o pânico mundial dos preços da comida.

vinit@uol.com.br


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