São Paulo, terça-feira, 25 de maio de 2004

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LUÍS NASSIF

Do velho não se faz o novo

O seminário ocorrido no Instituto Fernando Henrique Cardoso no sábado à tarde colocou, em duas sessões consecutivas, a impotência quando se vê o mundo com olhos antigos, ainda que lúcidos, e as possibilidades quando se vê o mundo com olhos contemporâneos.
A primeira mesa teve expositores excepcionais, como Rubens Ricupero e o ex-primeiro-ministro francês Lionel Jospin. A visão tradicional que trouxeram é que uma nova ordem internacional só se impõe em períodos de guerra clássica, na qual há um vencedor e um derrotado que é destruído. O vencedor fica responsável pela reconstrução do vencido.
No quadro atual, como a ex-URSS se desmanchou sem ter sido destruída ou derrotada, criou-se um vácuo, uma falta do grande evento que justificasse a construção de uma nova ordem.
Se nada disso ocorreu, a questão é esperar que a Guerra do Iraque desmoralize de vez o unilateralismo de Bush e que se retome o multilateralismo das organizações, atualizando seus princípios de atuação. Questões como solidariedade social, cidadania global, nova governança e outras teriam que ser incorporadas às normas não só das Nações Unidas como do Banco Mundial e do FMI.
Será que é o caminho? Embora infinitamente superior ao unilateralismo atual, o multilateralismo serviu, em grande parte, para impor regras comerciais e princípios de propriedade que, no fundo, significavam o que o economista alemão Friedrich List, em 1841, chamava de "chutar a escada". A Inglaterra recorreu a práticas protecionistas para se firmar como potência. Depois de consolidada na nova posição, passou a pregar para o mundo que o livre comércio era o caminho para o desenvolvimento.
É esse processo que explica esse vezo extraordinariamente emburrecedor de parte dos economistas brasileiros, de defender câmbio apreciado, livre fluxo de capitais ou de condenar a desvalorização do câmbio, a proteção à indústria nascente e até a utilização do poder de compra do Estado para estimular a produção interna, sob a alegação de que "em todo lugar que deu certo é assim". Enquanto não deram certo, não era assim. China, Coréia do Sul, Japão conseguiram se transformar em potências industriais indo contra todas as "boas práticas" pregadas pelos organismos multilaterais.
Essa é a questão básica, que uma abordagem convencional dos tempos atuais não resolve. Vindo dos organismos multilaterais, o máximo que se conseguirá avançar em termos de novas práticas de solidariedade social serão medidas de cunho filantrópico ou, no máximo, o combate ao subsídio agrícola, em troca de concessões em áreas de maior valor agregado. Barreiras efetivas ao desenvolvimento, como o próprio instituto da patente, jamais serão derrubadas no âmbito dessas organizações.
A abordagem convencional, esse multilateralismo histórico, deixou todos os presentes com a sensação de que, nesse modelo, não há saída. Daí a importância extraordinária do tema levantado no segundo painel, sobre a nova sociedade que está se formando, em nível mundial, sob a égide das novas tecnologias da informação.
Mas isso é assunto para outra coluna, pois o espaço acabou.

E-mail - Luisnassif@uol.com.br


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