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LUÍS NASSIF
O CEO e o técnico
No curto período do governo Jânio Quadros, o
embaixador Walther Moreira
Salles foi incumbido de negociar a dívida brasileira nos Estados Unidos. Era uma encrenca só, com a dívida pulverizada
entre milhares de investidores.
O embaixador foi lá e em pouquíssimo tempo equacionou o
problema. Certa vez indaguei
dele como tinha sido o trabalho técnico, os cálculos, a modelagem financeira etc. Sua
resposta foi simples: "Eu penso
a estratégia. Contas são com os
técnicos".
Conto a história para ilustrar
a diferença de funções, tanto
em âmbito de governo como de
empresas. Numa ponta há o
formulador, o estadista, empreendedor ou CEO. Na outra,
os técnicos.
Os primeiros necessitam de
visão ampla sobre todos os aspectos que envolvem a questão.
Essa visão não se aprende na
escola. Exige conhecimento,
criatividade para pensar saídas, sensibilidade para conferir
o ritmo adequado de mudança
e coragem para mudar. Ao técnico -em geral, o financeiro- cabe fazer as contas para
ajudar a dimensionar as consequências de cada ação pensada pelo formulador.
No comando de uma empresa, o sujeito com visão estritamente financeira poderá liquidar com seu futuro, desarticulando departamentos essenciais apenas para melhorar a
performance de curto prazo.
Essa mesma lógica vale para o
Banco Central. O diretor-operador tem conhecimento em
geral restrito apenas ao mercado.
Uma segunda característica
do técnico é a aversão ao risco.
Paradoxalmente, trata-se de
uma atitude defensiva típica
de quem trabalha em mercado
de risco, o de sempre buscar a
maioria, como forma de defesa. É só conferir as previsões
dos departamentos econômicos dos bancos às vésperas da
crise cambial de 1999. Preferiam errar em turma a acertar
sozinho. Isso porque sua formação não lhes permite avançar além da planilha e do manual (há os que conseguem
agregar informações mais amplas à sua formação técnica,
mas são exceções).
Hoje se está em faixa de risco
com o câmbio apreciado. Se o
superávit comercial encurtar e
o país voltar a depender de capital de fora, a possibilidade de
um desastre é ampla. O único
fator que poderá impedir o desastre é a hipótese pouco provável de o superávit comercial
resistir a essa valorização do
dólar. Na dúvida, não se poderia correr esse risco da apreciação cambial.
Se no comando da economia
houvesse pessoas de visão ampla, imediatamente definiriam
a estratégia de reduzir a vulnerabilidade externa, correriam
o risco da mudança e ordenariam que se voltasse a desvalorizar o real, até que se eliminasse de vez a vulnerabilidade
externa. Aí, sim, entrariam os
técnicos cumprindo a sua função, fazendo suas continhas e
apresentando alternativas técnicas, sem se expor ao risco
-como ocorre com todo técnico.
Quando os técnicos assumem
o comando, ficam todos escondidos atrás de uma ortodoxia
vazia, usando o manual como
álibi para a não-ação. E o iceberg chegando...
Desvalorização
Alguns leitores escrevem expondo contra-indicações de
uma desvalorização cambial.
A questão não é se é boa ou
não: mas se é possível ou não
manter o câmbio apreciado e
qual é o risco implícito nessa
decisão.
E-mail - Luisnassif@uol.com.br
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