São Paulo, terça-feira, 25 de julho de 2006

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Sem acordo, Rodada Doha é suspensa

Troca de acusações marca final de reunião para reduzir barreiras comerciais; negociações são adiadas indefinidamente

Brasil, Índia e UE culpam posição agrícola dos EUA por fracasso, mas país diz que eles não apresentaram propostas para outras áreas

DA REDAÇÃO

A Rodada Doha de liberalização do comércio, que deveria ser a "rodada do desenvolvimento" e ajudar a diminuir a pobreza mundial, entrou em colapso ontem e foi suspensa por tempo indeterminado.
Segundo negociadores, a paralisação pode ser de meses ou até anos. "Estamos em dificuldades", disse Pascal Lamy, diretor-geral da OMC (Organização Mundial do Comércio). "[A rodada] está entre a UTI e o crematório", disse Kamal Nath, ministro do Comércio da Índia.
Novamente, os principais países que negociavam na OMC em Genebra não conseguiram chegar a um acordo com relação a tarifas e subsídios agrícolas. A diminuição desse tipo de barreira é o principal entrave às negociações, que começaram em 2001 em Doha (Qatar) e deveriam ter sido concluídas em 2004.
Os países-membros da OMC haviam determinado nova data-limite para a conclusão da Rodada, no final de 2005, que também não foi cumprida.
O G6 (grupo que reúne Brasil, Índia, União Européia, Estados Unidos, Japão e Austrália) se reuniu neste final de semana em Genebra, mas não houve avanços, mesmo após os governantes que participaram neste mês da reunião do G8 (sete países mais industrializados e a Rússia) em São Petersburgo terem dito que a Rodada Doha era prioridade.
Analistas de comércio exterior temem que o fracasso das negociações leve a um recrudescimento do protecionismo, o que poderia reduzir o volume de comércio global e prejudicar países em desenvolvimento.
Pode haver também um aumento do número de tratados bilaterais e blocos comerciais, que, de acordo com alguns analistas, acabam erigindo novas barreiras comerciais em vez de derrubá-las.

Acusações
Houve troca de acusações a respeito de quem seria culpado pelo colapso das negociações comerciais. Brasil, Índia e UE culparam os Estados Unidos por não fazer mais concessões.
"A principal causa [do fracasso] -não a única- é a dificuldade dos Estados Unidos de avançar na questão dos subsídios [agrícolas] internos. Cabia aos EUA fazer o gesto mais importante", afirmou Celso Amorim, chanceler brasileiro e um dos principais porta-vozes do G20 (grupo de 20 países em desenvolvimento, que reúne Brasil, Índia e China, entre outros).
Amorim disse ainda que "a principal dificuldade dos Estados Unidos vem da situação política no país, em vésperas de uma eleição [parlamentar]. Passada a eleição, estaremos provavelmente em uma situação mais confortável para avançar".
O comissário de Comércio da UE, Peter Mandelson, que em outros momentos foi acusado de não fazer concessões suficientes, juntou-se ao coro dos insatisfeitos com a atitude dos Estados Unidos. "Os EUA julgaram que seria melhor se o processo fosse suspenso nesse estágio. Com certeza o maior e mais forte país do mundo, com o melhor padrão de vida, poderia dar assim como receber." Mandelson afirmou ainda que a paralisação das negociações não era "desejável nem inevitável. Poderia ter sido evitada com facilidade".
Nath, da Índia, disse que "todos puseram algo na mesa, menos um país, que disse: "Nós não estamos vendo nada na mesa'", referindo-se aos EUA.

Sem "Doha light"
Mas a representante comercial dos EUA, Susan Schwab, disse que seu país havia sinalizado com maiores reduções nos subsídios agrícolas e que as outras nações não haviam feito propostas.
Os EUA queriam que os países em desenvolvimento reduzissem tarifas e barreiras para produtos industriais e serviços em troca das concessões na área agrícola.
"Enquanto os EUA estavam preparados para fazer mais, o foco ontem [anteontem] foi nas exceções do acesso a mercados [...], revelando que vários países avançados e em desenvolvimento estão procurando maneiras de fazer contribuições menos ambiciosas", disse Schwab. Ela já havia acusado países como o Brasil de se esconder atrás de outros mais pobres para obter mais concessões sem ter que melhorar suas propostas.
A representante comercial afirmou ainda que "isso não significa que os EUA estão desistindo. "Doha light" nunca foi uma opção para os EUA e ainda não é. Não houve proposta na mesa ontem que poderíamos recomendar ao presidente ou ao Congresso".
O mandato que o Congresso dos EUA deu ao presidente Bush para negociar acordos comerciais de forma mais rápida, o "fast track", termina em 2007, o que dificulta as negociações comerciais depois dessa data. O "fast track" permite que o governo americano negocie o acordo e, posteriormente, o Congresso apenas o ratifique ou recuse, sem alterar artigos.


Com agências internacionais


Texto Anterior: Mercado aberto
Próximo Texto: Itamaraty vê prejuízo ao desenvolvimento
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.