|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
NOVO ELDORADO
Em cinco anos, família Iglesias, da rede Rubaiyat, usará metade da fazenda em Dourados para cultivar grãos
"Rei da carne" tira boi do pasto e planta soja
MAURO ZAFALON
DA REDAÇÃO
Diz um ditado espanhol que três
coisas podem prejudicar a vida de
um homem: jogos, mulheres e, "la
más segura, la agricultura". Contrariando o ditado, a família Iglesias, dona da rede de restaurantes
Rubaiyat, em São Paulo, e sócia
do Cabaña Las Lilas, em Buenos
Aires (Argentina), está se voltando para a produção de grãos.
Desta vez, seguramente, as letras do ditado não funcionarão.
Os Iglesias escolheram a soja, produto que tem mudado as características da agricultura brasileira
nos últimos anos e recheado o
bolso de muitos agricultores.
Amplamente reconhecidos pelo
padrão das carnes que servem, os
Iglesias descobriram logo cedo
que, para manter a qualidade, era
preciso investir em todo o processo produtivo: do pasto ao prato. E
começaram a investir na produção e no melhoramento genético
do gado já década de 60, quando
Belarmino Fernandez Iglesias, o
pai, comprou uma fazenda de 10
mil hectares em Dourados (MS).
Agora Belarmino Iglesias, o filho, inicia um processo de reestruturação da fazenda que prevê o
plantio de soja em pelo menos
metade da área em cinco anos.
Nesta safra, o espaço destinado à
oleaginosa será de 800 hectares.
Apesar dos receios do pai com o
novo destino dessa parte da fazenda, o filho coloca os números
na ponta do lápis e diz que não há
o que temer. Um alqueire de terra
na região pode suportar cinco
bois por ano, com a produção
média de 30 arrobas de carne. A
mesma área, em apenas seis meses, pode render 140 sacas de soja.
A distância entre os dois faturamentos é gigantesca. As 30 arrobas de boi podem render R$ 1.800
em um ano. As 140 sacas de soja,
R$ 5.000 em seis meses.
Marinheiro de primeira viagem
na soja, mas com experiência na
administração dos restaurantes e
da fazenda -até então voltada
para a pecuária e com plantio de
milho apenas para alimentar os
animais-, o filho Belarmino entra com o pé no chão. "O ingresso
na agricultura tem de ser planejado. Não se pode aventurar porque
há pressões de tempo nesse setor
que não temos na pecuária."
"Soja tem data e horário para
ser plantada. Uma decisão errada
pode significar período inadequado de plantio, perda de luminosidade para a planta e a consequente redução de produtividade."
Iglesias está ciente dos benefícios que a nova opção trará e já
programa a construção de um secador e de um silo. O plantio de
soja atende a dois objetivos imediatos: a necessidade anual de
reestruturação de pelo menos 5%
da pastagem da fazenda e uma
complementação alimentar para
o gado com os derivados de soja.
Pressões de vizinhos
Belarmino Iglesias diz que não
podia mais adiar a entrada na
produção de soja. Tem uma das
poucas fazendas que ainda se dedica à pecuária na região de Dourados. Cercado de soja por todos
os lados, ele era assediado seguidamente por produtores que propunham o arrendamento de suas
terras ou parcerias. Já que as propostas eram tão vantajosas, decidiu entrar sozinho no negócio.
O que pesou na decisão de reformar pastos com o rodízio de
grãos é que a soja diminui os riscos que antes a fazenda poderia
ter com a cultura de outros produtos. "Agora o risco de renovar a
pastagem com grãos compensa."
Iglesias está ciente de que os
preços da soja são excelentes, mas
que se devem a uma quebra prolongada de safra nos EUA e ao
apetite da China pelo produto.
Negociada atualmente de US$
13 a US$ 14 por saca para entrega
em abril, o produto atinge um valor bem superior ao de três anos
atrás -de US$ 10 a US$ 11.
Manutenção de qualidade
Iglesias diz que a opção pela soja
não muda em nada a preocupação com a qualidade da carne servida nos restaurantes. Essa preocupação tem garantido à família a
indicação de "a melhor carne da
cidade" por sete anos seguidos,
segundo críticos gastronômicos.
O segredo dos Iglesias é o acompanhamento da carne desde a
produção até a mesa dos clientes
-cerca de 500 mil por ano. O Rubaiyat consome 14 toneladas de
carne mensalmente, e a maior
parte é de produção própria.
A fazenda em Dourados produz
todos os cortes com osso, suínos,
frangos e javalis que são consumidos nos restaurantes da família.
Segundo ele, houve avanço nos
cuidados com pastagem, manejo,
fitossanitários, genética e cruzamento de animais. Isso tudo garante uma carne mais marmorizada (mais macia e com mais gordura entremeada nas fibras).
Os Iglesias só não conseguem
produzir toda a picanha consumida nos restaurantes. Parte dos
6.000 quilos utilizados todo mês
vem da Argentina.
Texto Anterior: Outro lado: Para associação, consumo menor diminui repasse Próximo Texto: Memória: Iglesias, o pai, deixa a Espanha e "conquista" SP Índice
|