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Governo teme "efeito AmBev" na Vale
Planalto receia que compra da Xstrata pela empresa brasileira possa transferir decisões da mineradora para o exterior
Governo faz restrições ao negócio avaliado em US$ 90 bi e pode usar BNDES e fundos de pensão de estatais para tentar barrá-lo
KENNEDY ALENCAR
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
As restrições do governo à
possibilidade de a Vale comprar a mineradora anglo-suíça
Xstrata se devem ao temor da
repetição do "efeito AmBev",
segundo disse ontem à Folha
um auxiliar direto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Por "efeito AmBev", leia-se:
o negócio Vale-Xstrata poderia
ser o primeiro passo para que o
centro de decisão da companhia se transfira do Brasil para
o exterior, o que aconteceu
com a cervejaria.
Criada em 1999, a AmBev foi
resultado da fusão da Antarctica com a Brahma. Na época, a
Kaiser e os defensores do negócio travaram dura disputa comercial. O governo brasileiro,
comandado então pelo tucano
Fernando Henrique Cardoso,
viabilizou a operação por meio
de autorização do Cade (Conselho Administrativo de Defesa
Econômica), órgão do Ministério da Justiça.
Um dos argumentos favoráveis à fusão era o de criação de
uma grande empresa nacional
que pudesse atuar globalmente. Em 2004, a AmBev se fundiu com a Interbrew, um grupo
belga. Na avaliação do governo
atual, petista e adversário do
tucano FHC, o resultado é hoje
desfavorável ao consumidor. A
AmBev tem 70% do mercado
nacional de cerveja, não enfrenta forte concorrência e seu
centro de decisão não é mais
nacional.
O receio de que a eventual
compra da Xstrata dê à Vale o
mesmo destino é um dos principais motivos para Lula e a cúpula do governo resistirem ao
negócio entre as grandes mineradoras. Lula tem se queixado
publicamente de que a Vale, o
maior grupo privado do país,
investe pouco no país.
Um auxiliar do presidente
disse que ele pode ser convencido de que o negócio traria benefícios. Anteontem, Lula jantou com o presidente da Vale,
Roger Agnelli, no Rio.
A Vale já confirmou interesse na compra da Xstrata e o início de tratativas nesse sentido,
sob o argumento de que seria
melhor para sobrevivência global da empresa. O valor do negócio seria de US$ 90 bilhões
-US$ 30 bilhões dos quais seriam quitados com a oferta de
ações preferenciais da Vale. No
mercado, estima-se o valor da
companhia brasileira em US$
120 bilhões.
Na opinião de integrantes da
cúpula do governo, o negócio
poderia transferir para propriedade estrangeira grande
parte de uma empresa nacional
que o governo julga estratégica
para o desenvolvimento. A Vale
foi privatizada em 1997.
O Palácio do Planalto poderia tentar inviabilizar a compra
da Xstrata por meio do
BNDESPar, subsidiária do
BNDES (Banco Nacional de
Desenvolvimento Econômico e
Social) que tem participações
em empresas, e pela Previ (fundo de pensão dos funcionários
do Banco do Brasil). BNDESPar e Previ têm participação na
Vale e representantes no Conselho de Administração.
Integrantes do governo brasileiro afirmam que a operação
Vale-Xstrata é diferente da fusão entre Brasil Telecom e a Oi
(antiga Telemar) -este negócio conta com simpatia do governo e depende de aval político e econômico do Planalto.
Motivo: o governo sustenta
que a operação BrT-Oi seria
benéfica ao consumidor, porque criaria uma empresa mais
apta a competir com a Embratel e a Telefônica no mercado
nacional. O controle da empresa também ficaria em mãos nacionais.
O governo avalia ainda que
as duas empresas são complementares, pois atuam em regiões diferentes do país. Acredita que, juntas, terão capacidade de competir com a mexicana Embratel e a espanhola
Telefônica na área de transmissão de dados, por exemplo.
Para dar aval ao negócio, Lula insistiu em criar um mecanismo que permita aos fundos
de pensão de empresas públicas e ao BNDES ter poder de
decisão no processo de governança da nova empresa. O Planalto disse ter convencido o
presidente da Previ, Sérgio Rosa, a apoiar a negociação. A Previ, fundo de pensão do Banco
do Brasil, tem participação relevante na Oi e na BrT.
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