São Paulo, terça-feira, 26 de junho de 2007

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BENJAMIN STEINBRUCH

Derrubar as cancelas


Há clara insuficiência de oferta ferroviária no país, principalmente para o transporte de commodities

O NÚMERO de caminhões nas estradas brasileiras é o sintoma de um problema: o Brasil tem deficiência crônica de transporte ferroviário. Não há em outro país continental volume tão grande de caminhões nas estradas. O transporte rodoviário só é eficiente para distâncias curtas e cargas leves.
O Brasil precisa ser cortado por novas ferrovias para ganhar eficiência em transporte de cargas e incorporar à produção áreas esquecidas. Isso exige grandes investimentos.
Embora a situação atual esteja muito distante da ideal, o país evoluiu bastante nessa área. Dez anos atrás, antes da privatização do setor, as ferrovias transportavam só 17% das cargas do país. Essa parcela já atinge 25% hoje. O novo Plano Nacional de Logística e Transporte, divulgado na semana passada, prevê índice de 32% em 2023. Ou seja, daqui a 15 anos, ainda estaremos em nível bem inferior ao padrão internacional, de 42%.
Houve avanço nos investimentos nos dez anos de privatização. No último ano nas mãos do Estado, 1995, o setor investiu míseros R$ 10 milhões. Nos dez anos sob a iniciativa privada, o investimento anual médio foi de R$ 1,2 bilhão. Com isso, a carga transportada cresceu 56% no período, de 250 milhões de toneladas para 390 milhões.
A privatização, portanto, foi boa para o país. Além de melhorar a eficiência do setor, a venda das ferrovias estatais livrou o governo de enormes prejuízos. Nos três anos antes da privatização (1994 a 1996), a Rede Ferroviária Federal perdeu R$ 2,2 bilhões. O governo já arrecadou R$ 5,6 bilhões após a privatização, em pagamentos das concessões, impostos e arrendamento de bens da antiga rede.
A malha ferroviária brasileira tem hoje 30.000 km, sendo 28.000 km operados pelo setor privado. É pouco. Em 1940, o país contava com 35.000 km. Todo o crescimento de carga das últimas seis décadas, portanto, foi atendido pelas rodovias, o que minou a produtividade e a competitividade da indústria. O transporte ferroviário custa em média 40% menos que o rodoviário.
Há clara insuficiência de oferta ferroviária no país, principalmente para o transporte de commodities. Só no caso da soja, o excesso de demanda atingiu 17 milhões de toneladas em 2005, volume que acabou sendo transportado por rodovia, com evidente elevação de custos.
O atendimento da produção agrícola em novas fronteiras vai depender de investimentos públicos e privados. Tenho o grande desafio de viabilizar o projeto da Ferrovia Transnordestina, que ligará a nova região agrícola do Sul do Maranhão, Piauí, Pernambuco e Bahia aos portos de Suape (PE) e Pecém (CE). Em parceria com a Companhia Ferroviária do Nordeste e com o governo federal, serão investidos R$ 4,5 bilhões em 2.000 km de trilhos.
Mas o setor ferroviário não precisa apenas de novos trilhos. É importante elevar a velocidade dos trens, em busca de eficiência. Há 12 mil passagens de nível na malha ferroviária do país. Em alguns trechos urbanos, as composições trafegam a 5 km/h e com a ajuda de cancelas. Obras de contornos das cidades, compromisso assumido pelo governo na privatização, jamais foram realizadas.
O transporte ferroviário precisa de mecanismos indutores de investimentos. A forma de incidência de ICMS, por exemplo, prejudica e pune o transporte intermodal. Além disso, os recursos oriundos de contribuições do setor (arrendamento e Cide) não revertem para ferrovias e as importações de equipamentos são oneradas, o que não se justifica. Há muitas cancelas a derrubar.


BENJAMIN STEINBRUCH , 53, empresário, é diretor-presidente da Companhia Siderúrgica Nacional, presidente do conselho de administração da empresa e primeiro vice-presidente da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo).

bvictoria@psi.com.br


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