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OPINIÃO ECONÔMICA
Para entender a alta da gasolina e do dólar
ALOYSIO BIONDI
Para quem ficou surpreso com
a alta da gasolina e de outros
combustíveis, bem como com as
novas altas do dólar, ou queda
do real, vale a pena mastigar alguns dados:
Petróleo em queda - Nos últimos dois anos, os preços do petróleo no mercado mundial sofreram um recuo brutal, caindo
de US$ 20 para até US$ 10 o barril (em janeiro deste ano).
No Brasil - O governo FHC,
porém, decidiu não reduzir os
preços da gasolina e de outros
combustíveis, para o consumidor brasileiro. Isto é, o governo
poderia ter reduzido os preços
em até 50%, no ano passado, na
mesma proporção da queda do
custo do petróleo. Ao manter os
preços altos, "confiscou" uma
parte da renda dos consumidores, pessoas ou empresas. Com
muita habilidade, o governo
FHC criou um "confisco invisível", evitando assim a necessidade de aprovação pelo Congresso -e a indignação do consumidor, que não se esqueceu
até hoje do "empréstimo compulsório" sobre os combustíveis
criado na época do Cruzado e
nunca devolvido.
Petrobras, não - Ao cobrar 20
(simplificadamente) por combustíveis que poderiam custar
10, o governo criou uma margem de lucro extra de 100%, ou
um "confisco" de 100%, na surdina. Esse lucro extra ficou para
a Petrobras, como a imprensa
dá a entender? Não. A equipe
FHC realizou várias manobras,
o que vale a pena entender:
acontece que o governo devia
uns R$ 8 bilhões à Petrobras,
uma dívida acumulada ao longo de anos. Como? Principalmente porque a equipe econômica mandou a Petrobras usar
dinheiro dela, Petrobras, para
pagar compromissos (subsídios)
que o governo tinha com os usineiros de álcool, com a promessa, obviamente, de o Tesouro devolver esse dinheiro à empresa.
Outro confisco - Quando o governo criou o "confisco" de
100%, decidiu que esse dinheiro
iria para os cofres dele, governo,
mas em seguida seria entregue à
Petrobras, todos os meses, como
uma espécie de prestação para
pagamento da dívida acumulada. Entende-se bem a manobra:
o preço extra não virou lucro da
Petrobras: virou lucro do Tesouro, que o reservou para pagar
uma dívida com a Petrobras.
Mesmo esse esquema, porém,
foi cancelado, em outubro do
ano passado, poucos meses após
ter sido implementado. Nas negociações com o FMI, o governo
assumiu o compromisso de abocanhar para ele próprio, governo, o tal "lucro extra", que deixou de ser repassado para a Petrobras. A empresa, para piorar
a situação, teve que aceitar o
falso pagamento da dívida do
Tesouro, aceitando sua quitação com o recebimento de títulos
que somente vencem daqui a
dez anos...
Confisco e aumento
Ao assinar o acordo com o
FMI, o governo FHC comprometeu-se a utilizar o dinheiro do
"confisco invisível" para reduzir
o célebre rombo do Tesouro, isto
é, o dinheiro foi incluído no chamado "ajuste fiscal" na maior
surdina -isto é, sem a necessidade de discussões no Congresso
e sem repercussões negativas na
opinião pública. Tudo muito
hábil. Ou com muita esperteza.
Previsível - Mas o acordo com
o FMI previu, também, que
qualquer receita prevista para
fechar o "rombo" tem de ser
atingida, isto é, se qualquer imprevisto impedir que aquela meta seja alcançada, o governo deve tomar providências para
compensar a diferença. No caso
do "confisco invisível", a arrecadação até superou as previsões
nos primeiros meses do ano,
porque os preços do petróleo
continuavam a cair, aumentando o lucro extra "confiscado"
pelo governo, que continuou negando reduções nos preços dos
combustíveis.
Foi esse "confisco", que rendeu
até R$ 700 milhões por mês, sem
que o consumidor se apercebesse, que permitiu ao governo
cumprir metas de redução do
"rombo". Mas, como esta coluna
apontou na época, mais cedo ou
mais tarde a manobra silenciosa
precisaria ser abandonada -e
os preços dos combustíveis precisariam ser aumentados. Por
quê?
Já a partir de fevereiro/março
os países produtores de petróleo
resolveram fazer um acordo para reduzir a produção e obter
uma recuperação nos preços internacionais. O petróleo entrou
em alta, passou para US$ 14,
US$ 16 e até US$ 18 o barril, isto
é, o "confisco invisível" desapareceu. Sem esse dinheiro, o governo foi forçado a aumentar os
preços dos combustíveis, dentro
das exigências do acordo com o
FMI. E deverá fazer outros aumentos, já que a alta dos preços
do petróleo chegou aos 60%,
80%.
Moral da história: o episódio
mostra como a equipe FHC age.
Um confisco de renda do consumidor na surdina. Um confisco
de lucro da Petrobras na surdina. Novo calote na empresa, na
surdina, ao mesmo tempo em
que se faz a opinião pública
acreditar que a Petrobras lucra
com os preços altos. Dívidas bilionárias com a Petrobras, que a
impedem de investir, abrindo-se
caminho com novas mentiras
para a "necessidade de investimentos das multinacionais para
produzir petróleo". Falseamento da verdade, com explicações
mentirosas sobre o reajuste dos
combustíveis, atribuindo-o à
desvalorização do real.
Coroando tudo isso, as mentiras do sr. David Zylbersztajn,
que ao longo dos últimos meses
continuou dizendo que os preços
internacionais do petróleo estavam em queda e por isso era preciso entregar os riquíssimos
campos brasileiros de petróleo, a
preço de banana, às multinacionais. Realmente, tudo com muita esperteza. Qualidade que
nem sempre pode ser considerada dignificante para um governo e homens públicos.
O real - E a queda do real? Passageira, já que se diz que o Brasil
recuperou a "credibilidade internacional"? Isso é balela. Segundo o próprio Banco Central,
as empresas brasileiras estão
pagando juros de até 16% no
mercado internacional. O preço
da desconfiança.
Aloysio Biondi, 62, é jornalista econômico.
Foi editor de Economia da Folha. Escreve aos
sábados no caderno Dinheiro.
E-mail: aloybi@homeshopping.com.br
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