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O expresso legítimo ainda é raro por aqui
PASQUALE CIPRO NETO
COLUNISTA DA FOLHA
"Café expresso -está
escrito na porta./Entro
(...)/Meio tonto,/por haver
acordado tão cedo.../E
pronto! Parece um brinquedo.../Cai o café na xícara (...)/maquinalmente./E
eu sinto o gosto, o aroma, o
sangue quente de São Paulo/nesta pequena noite líquida e cheirosa/que é a
minha xícara de café."
Assim começa "Café Expresso", escrito nos anos
50 por Cassiano Ricardo
(1895-1974), que não hesitou: escreveu "expresso".
Em português, é mesmo
com "x" -não temos a palavra "espresso", com "s".
O café rápido, feito na
hora, em máquinas italianas, é mesmo "expresso",
que, entre outros, tem o
sentido de "enviado rapidamente, sem delongas".
Foi com meu pai que
aprendi a tomar café. Aos
domingos, no início dos
anos 60, íamos ao encontro de seus amigos italianos. "Gli amici" se reuniam na Barão de Itapetininga. Depois de boas conversas, a tradicional ida ao
Café Haiti, uma das primeiras casas a servir expresso em São Paulo.
Mas expresso legítimo,
por enquanto, só na Itália
-e em alguns pouquíssimos lugares no Brasil. Na
Itália, nunca precisei descabelar-me para receber
um café encorpado, pleno
de sabor e de aroma. Lá,
pode-se pedir que seja
mais curto do que o normal ("ristretto") ou "lungo" ("longo"), ainda assim
denso o bastante para que
se sinta gosto intenso de
café. Delicio-me com o
teste do açúcar, que só
afunda depois de empurrado com a colher.
Por aqui... Explico, digo
mil vezes como quero o café e quase sempre recebo
água preta, rala, sem gosto.
Já passou da hora de termos o sagrado direito de
saborear um legítimo expresso em qualquer lugar
em que haja uma máquina
italiana. Poderemos então
escolher entre a nossa grafia ("expresso") ou a italiana ("espresso"), que -por
que não?- poderia ser
adotada como palavra universal, tão universal quanto "pizza". Mas, antes de
adquirirmos o direito de
grafar "espresso", precisamos aprender a fazê-lo e,
sobretudo, a tomá-lo -a
maioria dos brasileiros
gosta mesmo é de chafé.
Nos nossos supermercados, já se encontram belos cafés adequados para
bons expressos, mas ainda
faltam profissionais e casas em quantidade suficiente para que o prazer de
um legítimo expresso esteja sempre à mão. É isso.
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