São Paulo, domingo, 26 de novembro de 2006

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Empresas em nome de laranja fazem parte do esquema

Moradores de favela na Grande SP, dona-de-casa e ajudante de pedreiro constam como controladores de importadora

Empresas ficaram quase sem estoques depois da Operação Dilúvio; grandes corporações pressionam por fim de importações diretas

DA REPORTAGEM LOCAL

Quem liga para o showroom das empresas Plena ou Principal na avenida Paulista é atendido por uma telefonista que diz "Sharp Digital, bom dia!". A Plena e a Principal são citadas pelo relatório da PF como usuárias do esquema do grupo MAM -elas importam copiadoras e impressoras do grupo japonês para uso corporativo.
Não é a primeira vez que a Plena é associada a práticas comerciais heterodoxas. Durante a CPI da Pirataria, em 2004, o executivo que se apresentava como diretor da Sharp no Brasil, Rubens Barcellos, foi preso pela polícia sob acusação de prática de contrabando.
Barcellos foi acusado de usar laranjas para importar copiadoras recondicionadas -a empresa que fazia a importação, a SB Comercial, estava em nome de um funileiro. Além de não pagar todos os impostos, as máquinas recondicionadas eram vendidas como novas, de acordo com a polícia.
A Plena e a Principal, empresas que se apresentam como Sharp Digital, dizem que Barcellos era apenas um consultor.
Se havia funileiro importando fotocopiadoras que custam até R$ 150 mil, há também ajudante de pedreiro e dona-de-casa que são os supostos controladores da Llexam, importadora de CDs, DVDs, memórias para computador e câmeras digitais da Maxell japonesa. Não é preciso ser nenhum Sherlock Holmes para notar que Llexam é Maxell ao contrário.
A Maxell é uma subsidiária da Hitachi, a terceira maior corporação japonesa. Em abril deste ano, as vendas mundiais da Maxell eram equivalentes a R$ 3,8 bilhões. O site da Maxell para a América Latina aponta a Llexam como sua distribuidora no Brasil.
Quem vê a casa onde moravam os supostos acionistas da Llexam, numa favela em que o esgoto corre a céu aberto em Rio Grande da Serra, na Grande São Paulo, não tem muitas dúvidas de que são laranjas.
O antigo controlador da Llexam, Ricardo Breslauer, continua a se apresentar como diretor comercial da Maxell do Brasil, mas não há nenhum papel oficial que traga o nome do grupo japonês. Em entrevista à Folha na última quinta-feira, ele disse que não sabia informar se os controladores da Llexam eram laranjas: "Vendi a empresa, mas não lembro para quem. Vou consultar meu advogado e ligo depois", afirmou Breslauer. Ele não ligou.

Sem mercadoria
Policiais e técnicos da Receita que participaram da Operação Dilúvio dizem ter a prova dos nove de que um bom número das empresas investigadas é movida por fraudes: esse atestado seria a falta de mercadorias depois que a PF fez buscas e apreensões em agosto. A Justiça determinou que o estoque de algumas empresas fosse apreendido, já que os produtos poderiam servir de prova da eventual fraude.
Uma das empresas mais afetadas pela apreensão do estoque foi a Nagem, a maior distribuidora de produtos da HP do Nordeste brasileiro. A Nagem, que tem escritórios em São Paulo, Recife, Salvador e Fortaleza, ficou praticamente sem ter o que vender às vésperas do Natal.
A Polishop, que vende produtos importados pela TV e por uma rede que já tem 59 lojas, também está com seu estoque praticamente zerado depois que a empresa foi alvo da Operação Dilúvio.
Segundo a Folha apurou, para as vendas de Natal há risco de falta dos produtos tipicamente Polishop, como o Total Shape, anunciado como um tonificador do abdome.
Após a ação da PF, os gerentes da rede Polishop foram convocados para uma reunião de emergência. Lá, ficaram sabendo que vão faltar produtos e receberam a instrução de mandar o consumidor procurar o produto no site para não deixar claro que as lojas haviam ficado praticamente sem produtos.
Outra conseqüência da operação é que empresas que importavam grandes marcas diretamente dos EUA foram pressionadas pelas corporações para parar com esse tipo de prática. A Solution TI, que trabalha com produtos da 3Com, da Logitech e da Acer e sofreu buscas durante a Operação Dilúvio, foi uma das empresas pressionadas. A Microsens, uma importadora de Londrina que traz equipamentos da Xerox e da HP, sofreu pressões para que essas marcas não apareçam mais no noticiário policial.


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