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OPINIÃO ECONÔMICA
Um ajuste completo para antecipar 2000
PAULO GODOY
Ruim com ele, pior sem ele. Está
claro que a retomada do crescimento e da oferta de empregos depende do ajuste fiscal, das duras
medidas que o integram -não
apenas de aumento de impostos,
mas também, desta vez, dos cortes
efetivos dos gastos. Ele é a causa direta do quadro recessivo que nos
sufoca, mas sabe-se que, sem a
perspectiva de sua aprovação e implementação rápidas, articuladas
com o desencadeamento de verdadeira reforma tributária, não só o
primeiro semestre, mas todo o ano
que começa estará irremediavelmente perdido, com gravíssimas
consequências econômicas e sociais.
A fase que estamos vivendo é extremamente difícil para o conjunto
das atividades produtivas. A desvalorização do real enfim adotada
favorece as exportações, o que pode propiciar uma desejável recuperação dos negócios e dos empregos nessa área. Mas, para que se
contenha e inverta o descontrole
cambial e uma recidiva da perversa
dinâmica inflacionária, o governo
terá de manter juros proibitivos,
num cenário recessivo que contenha o repasse da desvalorização ao
conjunto dos preços internos.
Quanto àqueles setores, como a
construção de obras públicas, mais
dependentes do epicentro da crise
-as três esferas do governo-, a
situação está e continuará, até os
efeitos de um amplo ajuste fiscal,
em níveis particularmente dramáticos.
Quase todos os programas de
obras federais, desde os de infra-estrutura pesada até os de saneamento e habitação, sofrem cortes
drásticos, sendo bastante reduzidos ou simplesmente paralisados.
Aos cortes orçamentários somam-se sérias restrições aos processos de privatização e concessão
de serviços públicos, grande instrumento de renovação e expansão
de nossa infra-estrutura e poderoso fator de ativação da economia e
geração de empregos. Esses processos são inevitavelmente afetados pelos juros proibitivos e pela
suspensão do fluxo de capitais externos.
Entre os novos governadores,
mesmo os reeleitos, e até mesmo
os que fizeram o chamado dever de
casa fiscal, como o de São Paulo,
são compelidos -em face da queda de receita resultante da recessão- a reduzir ou adiar os já limitados investimentos em obras.
Os eleitos pela oposição simplesmente paralisam tudo, com a dupla justificativa da falta de recursos
e da necessidade de redefinir prioridades. Ao mesmo tempo, desencadeiam a demanda de mais uma
renegociação da dívida com o governo federal, objetivo aparentemente tão legítimo quanto contraditório com a prioridade do tratamento da crise fiscal.
Quanto aos municípios, são ainda maiores as limitações que sofrem e os efeitos delas na precaríssima capacidade de investimento
que preservam. As dívidas com a
União -em muitos casos vultosas, como a da Prefeitura de São
Paulo- não foram renegociadas
junto com a dos Estados, e crescem
como bola de neve com os juros astronômicos do mercado.
Os caminhos básicos que os prefeitos têm de buscar, para conseguir resultados a médio prazo, são
o alongamento da dívida e, do
mesmo modo que os governadores, a redução das despesas de pessoal, ativo e inativo, com amparo
na reforma administrativa, que,
enfim, está sendo regulamentada.
Enquanto isso, pouco ou nada podem fazer para a retomada de investimentos.
O horizonte setorial é, assim,
muito precário neste início de ano,
incluindo a perspectiva, de todo
indesejável, de que o desemprego,
já acentuado no último trimestre,
aumente nos próximos meses. Mas
a constatação, realista e penosa,
desse quadro sombrio eu vinculo a
uma avaliação básica que me permite reiterar a confiança no desenvolvimento do país. Apesar
dos sinais negativos deste começo
de janeiro, estimulados pela irresponsável moratória do governador Itamar Franco e por suas repercussões externas, vale apostar,
também realisticamente, na capacidade do presidente Fernando
Henrique e das lideranças do Congresso de conclusão do ajuste fiscal, incluída substancial redução
do rombo da Previdência, e no desencadeamento da reforma tributária.
As resistências às medidas de
combate ao déficit público, reforçadas com a crise financeira dos
Estados e municípios, serão maiores e mais prolongadas do que se
supunha. Mas é também crescente
a compreensão social de que não
será possível retomar o crescimento sem que se enfrente, desta
vez para valer, um déficit público
que passou dos 8% do PIB, refletindo uma dívida interna além dos
R$ 350 bilhões.
E a gravidade da crise cambial
deste início de ano teve a virtude
de facilitar a mobilização do Congresso para um enfrentamento
mais decidido do descontrole das
contas públicas, com a percepção
da grande maioria dos atores políticos de que sem ele teremos sacrifícios econômicos e sociais mais
duros e prolongados.
Feita logo essa grande lição de
casa nacional, poderemos ultrapassar a grave turbulência destes
dias e antecipar em alguns meses o
tão esperado ano 2000, retomando
o crescimento e a oferta de empregos ainda no segundo semestre.
Paulo Godoy, 44, empresário, é presidente da
Apeop (Associação Paulista de Empresários de
Obras Públicas) e coordenador do Fórum Nacional da Construção Pesada.
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