São Paulo, terça-feira, 27 de março de 2007

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BENJAMIN STEINBRUCH

Mais músculos nacionais

A chave da economia do país se chama investimento, algo que o Ipiranga passou a ter em braços mais musculosos

A COMPRA DO grupo Ipiranga por um consórcio formado por Petrobras, Brakem e Ultra foi o tema dominante na área de negócios nos últimos dias. A boa notícia é que essa operação bilionária permitiu que um dos maiores grupos privados nacionais seguisse sob o controle de capitais brasileiros.
Não fossem as suspeitas de vazamento de informações privilegiadas, que teriam proporcionado ganhos indevidos a alguns investidores, o que exige investigação rigorosa, a venda poderia ser aplaudida de pé.
Negócios como esse ajudam-nos a lembrar que, apesar da onda globalizante que anestesia cérebros esquerdistas e direitistas, ainda continua indispensável para um país que se diz emergente cuidar do controle de setores estratégicos de sua economia.
Sabemos que os longos anos de crise vividos pelo país levaram a uma desnacionalização em massa. Sem condições de manter seus negócios por conta de deficiências de capital e expostos a taxas de juros altíssimas e à tributação exorbitante, muitos empresários brasileiros foram levados a vender suas empresas ao capital estrangeiro.
Qualquer pessoa, com mínimo esforço de memória ou com pesquisas simples, pode levantar os nomes de alguns grandes empresários nacionais que dominavam a cena nos anos 70, década de exuberância econômica. Onde estão? Que fim tiveram suas empresas? É público que um grande número deles sucumbiu a tentadoras ofertas de montanhas de dólares oferecidas pelo controle de seus negócios.
Nada contra o capital estrangeiro. Como sempre, ele é bem-vindo, traz tecnologia, cria empregos e ajuda a aumentar a produção e a exportação. Mas não se pode permitir que, em nome da globalização, ele tome conta de setores estratégicos como petróleo e petroquímica, siderurgia, mineração, logística e geração de energia.
É ingênuo achar que se pode entregar unicamente ao capital estrangeiro a tarefa de expandir a produção nesses setores de importância fundamental para o desenvolvimento do país. O apagão de 2001 foi um exemplo de como reagem algumas empresas estrangeiras em momentos de crise aguda: cancelam investimentos e tiram o time de campo.
O meganegócio da semana passada se deu exatamente numa dessas áreas estratégicas, petróleo e petroquímica. O Ipiranga, com 70 anos de existência e faturamento anual de R$ 31 bilhões, é o maior grupo nacional privado do setor, com refinaria, 20% da distribuição dos combustíveis do país, para 4.240 postos, e unidades petroquímicas.
Sofrendo das dificuldades crônicas citadas e sem condições de investir em expansão, o Ipiranga poderia ser presa fácil para grupos estrangeiros beneficiados por generosa liquidez internacional. Entre os pretendentes, a Repsol espanhola e a estatal venezuelana PDVSA.
Não é segredo para ninguém que o presidente da Venezuela, Hugo Chávez, sonha em penetrar no Brasil nesse setor estratégico, cobiçando principalmente o mercado mais próximo de seu território, nas regiões Norte e Nordeste.
Com a aquisição da semana passada, os ativos incorporados a esses três grandes grupos nacionais ganham musculatura financeira, tecnologia e condições de investir e competir internacionalmente. Petrobras e Braskem já anunciaram, por exemplo, que vão investir R$ 780 milhões na modernização e na ampliação da central petroquímica de Triunfo (RS).
A questão-chave da economia do país se chama investimento, algo que o grupo Ipiranga passou a ter em braços mais musculosos. Em meio à euforia da revisão do PIB, que mostrou uma economia quase 11% maior do que se imaginava, aflorou uma questão dramática: a falta de investimentos é também muito maior do que se pensava. Calculava-se que o país havia investido cerca de 20% do PIB em 2005. Agora, sabe-se que o investimento real foi de só 16,3%, muito pouco para os padrões internacionais -emergentes investem em média 25%- e insuficiente para sustentar um crescimento desejável, da ordem de 6% ao ano.
Desde que o limite da livre concorrência seja respeitado, a consolidação dos setores de petróleo e petroquímica representa um fato positivo, capaz de elevar os investimentos do capital nacional, que ganhou musculatura. Para o bem do país, é desejável que seja só o começo.


BENJAMIN STEINBRUCH, 53, empresário, é diretor-presidente da Companhia Siderúrgica Nacional, presidente do conselho de administração da empresa e primeiro vice-presidente da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo).

bvictoria@psi.com.br


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