São Paulo, domingo, 27 de maio de 2007

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VINICIUS TORRES FREIRE

A USP é quase linda, mas é feia

Universidade se torna mais produtiva e custa menos que escolas privadas boas, mas é lerda e não presta contas

A USP PERDE alguns professores para escolas privadas que pagam bem. Não se trata de vaga nem de voga, mas o caso deixou de ser raro. A maioria não deixa a universidade devido à infra-estrutura de pesquisa, ao prestígio ou pelo ambiente intelectual. Ou a tudo isso e mais os complementos de renda oferecidos pelo trabalho em fundações ou por encomendas privadas.
A USP ainda não perde a maioria dos melhores estudantes de São Paulo, mas os divide com a Unicamp e enfrenta a concorrência de boas escolas especializadas de economia, matemática, engenharia. Quantos estudantes ainda prefeririam a USP se seus cursos fossem pagos?
Pesquisa, ambiente intelectual e a maioria dos melhores estudantes ainda fazem a USP. E por quais outros critérios a universidade deveria ser julgada? Pelo seu futuro, talvez; pela produtividade, decerto, embora a medida da eficiência universitária seja um problema (que nem por isso deve ser tratado com a nonchalance do faz-de-conta que suscitam os relatórios burocráticos de produção).
Ao menos desde os anos 90, a USP torna-se mais produtiva. Há mais estudantes por professor, embora uspianos questionem a qualidade da formação de classes de uma centena de alunos. O número de publicações científicas, as de padrão internacional, por docente é 51% maior que em 2000; há mais doutores a dar aulas.
A USP é cara? Faça-se uma conta tonta, dividir o orçamento pelo total de alunos de graduação e pós: dá uns R$ 2.300 mensais por cabeça. Boas escolas privadas de economia e direito de São Paulo, sob supergerentes ou "gente do mercado", cobram uns R$ 2.000 mensais. Mas tais escolas nem de longe bancam a massa de laboratórios, pesquisas, museus, hospitais e serviços da USP. Ou seu grave gasto com aposentados, que levou 19% da despesa total de 2006.
Comparação global? Harvard gasta R$ 26 mil mensais por aluno. Mas quem quer brincar de numeralha terá de fazer algo mais sofisticado que continhas de privatistas raivosos ignaros. Por falar nisso, cabe porém discutir se os uspianos formados deveriam contribuir, na medida de sua renda, para a universidade (sim, pagar o curso ex post). Isso é solidariedade social e intergeracional, não "mercantilização do ensino".
Mas a USP é lerda. Sua burocracia e seu sistema de decisão são ineptos em inovação institucional. A USP não oferece novos formatos de cursos num mundo cambiante. Pouco reage a cursos decadentes ou que jamais se firmaram. É lerda em criar patentes, embora não deva se tornar um balcão de soluções para empresas e programas sociais, como pregam mercadistas ou esquerdóides.
A USP porém não publica periodicamente uma carta de objetivos e compromissos que possam ser verificados pelo público. Não demonstra a qualidade de seus formados. Não presta contas, afora a contabilidade comezinha. Tende a soçobrar sob o peso dos aposentados, sobre o que se finge de morta. Reage a cobranças com passividade ou por meio da militância corporativista e retrógrada.
O debate suscitado pelos decretos Serra é medíocre. É pífia a crítica à USP de um setor privado que mal investe em ciência. Governos ora nada têm a dizer à universidade. Sim, tanto zunzum e tudo ficará na mesma.


vinit@uol.com.br

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