São Paulo, domingo, 27 de junho de 2004

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Tributo pós-plano "come" mais um mês de trabalho

Em 94, fisco levou 104 dias de serviço; em 2003, 135 dias, ou 37% do tempo trabalhado

MARCOS CÉZARI
DA REPORTAGEM LOCAL

Ano após ano, os brasileiros dedicam mais tempo de seu trabalho para saciar a sede tributária dos governos -federal, estaduais e municipais. Trabalham menos para si e mais para o governo.
Quando o Plano Real foi criado, em 94, cada brasileiro trabalhava 104 dias apenas para cumprir suas obrigações tributárias com os três níveis de governo, segundo estudo do IBPT (Instituto Brasileiro de Planejamento Tributário).
Embora o plano tenha sido lançado em julho, equivale a dizer que até 14 de abril de 94 trabalhou-se apenas para o governo, ou 28,5% do ano. Em 95, os tributos exigiram 106 dias. Por dois anos seguidos (96 e 97) a sanha tributária foi menor -apenas 100 dias (ou 27,4% do ano).
A partir daí, como que saindo de um período de hibernação, o apetite tributário dos governos não diminuiu mais. Assim, já há seis anos seguidos (98 a 2003) os brasileiros vêm dedicando mais tempo para satisfazer o fisco.
No ano passado já foram precisos 135 dias -algo como trabalhar para o governo até 15 de maio, ou 37% do ano. Significa que, desde que o Real foi lançado, cada brasileiro "doou" mais um mês (exatos 31 dias) para saciar a sede tributária dos governos.

E vai piorar ainda mais
Mas a situação vai piorar neste ano. O advogado Gilberto Luiz do Amaral, presidente do instituto, prevê que serão necessários 138 dias de trabalho (37,8% do tempo) para pagar impostos -de 1º de janeiro a 18 de maio.
Pelos números do IBPT, nota-se que a volúpia tributária no país é mais acentuada a partir da segunda metade dos anos 90. De 96 para cá, a fatia da União no bolo tributário cresceu quase cinco pontos percentuais -de 65% para 70%.
A fatia dos Estados caiu quatro pontos (de 30% para 26%), enquanto a dos municípios baixou um ponto -de 5% para 4% (os percentuais foram arredondados, para mais ou para menos).
Em 94, a carga tributária sobre o PIB era de 28,61%. Exceção feita a 96, quando caiu um pouco, ela cresce há sete anos seguidos -foi de 36,11% do PIB em 2003. Amaral prevê mais de 38% neste ano.
O avanço da União foi gerado, principalmente, pelo aumento das contribuições já existentes ou pela criação de outras. A razão é simples: pela Constituição de 88, a União não precisa dividir com os Estados e os municípios a receita das contribuições (o que é obrigatório no caso dos impostos).
O PIS deixou de ser cumulativo em janeiro de 2003, mas a alíquota subiu 153,8% -de 0,65% para 1,65%. A Cofins seguiu o mesmo caminho em fevereiro deste ano: de 3% para 7,6% (mais 153,3%). Detalhe: já havia aumentado de 2% para 3% em fevereiro de 99.
A CPMF (o imposto do cheque) começou com 0,20% em 97 e hoje está em 0,38%. Resultado: de R$ 6,9 bilhões arrecadados em 97, neste ano a contribuição renderá R$ 26 bilhões, pelo menos.

No IR, avanço foi maior
Mas o maior avanço foi promovido diretamente no bolso dos trabalhadores. Ao manter congelada por seis anos seguidos (de 96 a 2001) a tabela para desconto do IR na fonte e os abatimentos permitidos pela legislação, o governo promoveu uma verdadeira sangria na renda dos brasileiros.
Os números ilustram bem o que isso significou: em 96, o IR retido na fonte foi de R$ 8,8 bilhões e, em 2000, de R$ 14,1 bilhões. Em 2002, mesmo com a correção da tabela (em apenas 17,5%), o governo arrecadou R$ 18,2 bilhões. De lá para cá, mais nenhuma correção.
Resumo: em 94, a carga tributária per capita (quanto cada brasileiro pagou em tributos) foi de R$ 871. Em 2003, foi de R$ 3.092, segundo o IBPT. Se o IPCA (165,8% de julho de 94 a maio passado) fosse aplicado sobre os R$ 871, a carga per capita seria de R$ 2.315.


Texto Anterior: Hoje vedetes, agricultura e exportação sofreram no início
Próximo Texto: Histórias reais: Plano acabou em 1996, afirma Edmar Bacha
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.