São Paulo, sábado, 27 de setembro de 2008

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Impasse no Congresso expõe racha na bancada republicana e ambições políticas

ANDREA MURTA
DE NOVA YORK

O fracasso dos republicanos em agir em uníssono a respeito do pacote de US$ 700 bilhões do governo dos EUA para resgatar Wall Street, apesar de mais estridente do que se poderia supor, não chega a ser surpresa para analistas: reflete não só o apego ao não-intervencionismo mas também disputas recentes entre conservadores na Câmara dos Representantes e pragmáticos no Senado.
Até ontem à noite, o presidente republicano, George W. Bush, encarava a defecção de entre 100 e 120 correligionários em relação a seu pacote. Bush e o secretário do Tesouro, Henry Paulson, mantinham a seu lado apenas republicanos mais pragmáticos, geralmente com muitos anos de Congresso e concentrados no Senado -onde o mandato de seis anos alivia a pressão da opinião pública, contrária ao plano.
Entre esses estavam nomes da velha guarda republicana, como Robert Bennett (Utah), à frente das negociações sobre o pacote por essa Casa.
Já os focos de resistência entre senadores se concentravam na ala mais à direita, como na voz de Richard Shelby (Alabama), membro da Comissão de Bancos do Senado e o primeiro a negar anteontem que um acordo com os democratas sobre o plano fora alcançado.
O coração da oposição, porém, está na Câmara, em parte porque os deputados enfrentam eleições em novembro e não querem desagradar ao público com um plano impopular.
Mas há outros motivos. "Há mais de uma década a Câmara vem sendo a mais conservadora e apegada a ideologias das duas Casas", diz Lawrence Meade, especialista em política americana do American Enterprise Institute, de direita.
Paul C. Light, analista da Universidade de Nova York, concorda e atribui a rebeldia a uma mistura de ambição política e purismo ideológico.
"Os líderes da rebelião vêem uma longa carreira política à sua frente. Ambicionam passar ao Senado ou mesmo à Presidência e temem desagradar ao eleitorado de seus distritos, já que precisam ser reeleitos a cada dois anos", disse ele. "Veja Eric Cantor [deputado republicano de Virgínia], que está à frente dos "renegados". Ele chegou a ter seu nome sugerido para vice de McCain, é visto como um futuro líder republicano, e isso torna seu apego à base muito mais forte."
Light afirma que o líder da minoria na Câmara, o republicano John A. Boehner (de Ohio), foi obrigado a entrar no barco dos rebeldes por pressão política. "Ele sabe que não será líder em janeiro se não estivesse ao lado dos opositores hoje."
O racha republicano, apesar de não ser regra, não é inédito e vem aumentando nos últimos anos, por várias razões. Uma delas é a configuração do Congresso: desde 1994, ano em que republicanos ganharam controle de ambas as Casas, a entrada de vários deputados ultraconservadores aumentou a tensão com a velha guarda e começou a ruir a disciplina do partido. O fato de Bush ser um presidente tão impopular facilita ainda mais atos de rebeldia.
Isso já foi visto, por exemplo, na reforma migratória. Co-escrita por McCain e apoiada por Bush, a lei foi rechaçada pelos republicanos conservadores.
Analistas ainda crêem que um acordo sobre o plano econômico -com concessões- será possível, mas, quanto mais o tempo passa, mais a situação piora. "Como o sistema financeiro vem sendo capaz de suportar a demora sem colapsar, os opositores estão tendo tempo suficiente para conquistar apoio", diz Light. "É como aprovar uma declaração de guerra. Os defensores precisam de um consenso, pois ninguém quer suportar sozinho o peso de um eventual fracasso."


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