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LUÍS NASSIF
A mocinha da Varig
Seis horas da manhã, aeroporto de Congonhas, em
São Paulo, depois de ter perdido o sono às 4h30 com receio
de perder o vôo. A mocinha da
Varig pergunta se tenho bagagem. Apenas uma de mão. Pede para pesar na esteira. Sete
quilos. "Não pode embarcar
com ela, tem que despachar",
diz ela. Mas como? É um notebook, não pode ser despachado. "Tem razão", diz a mocinha, "mas a orientação do
DAC tem que ser cumprida."
Mas nunca me informaram
disso, digo-lhe. E ela: "Comecei
a trabalhar agora, fiz um curso, estudei o regulamento do
DAC, e pacote com mais de
cinco quilos tem que ser despachado".
Mas não posso despachar
notebook no bagageiro, insisto.
Ela concorda. Qual a saída? A
mocinha da Varig sugere que
eu leve o notebook na mão e
despache a mala vazia. Tento
explicar que um notebook sem
a pasta é mais perigoso do que
com a pasta, que pelo menos é
de couro acolchoado. Ela concorda, mas regulamento é regulamento. Sugere, então, que
eu vá à livraria Laselva e consiga uma sacolinha de plástico
para colocar o notebook. Disse
que não adiantava, que a sacola era muito frágil. "Então,
só com autorização do DAC",
decide ela, firme, porém educada.
Lá vou eu para a sala do
DAC, a essa altura 6h20. Chego, porta fechada. O DAC só
abre às 6h30, e aí já teria perdido o vôo.
Vou para a sala de embarque, para ver se consigo argumentar com o povo de lá. Entro sem ser incomodado, a pasta passa pelo raio X, e, quando
olho em torno de mim, dezenas de passageiros com malas,
pacotes muito maiores do que
minha pasta.
Três dias depois, outra viagem. Entro na sala de embarque, e nada de meu companheiro de viagem chegar. Pouco antes de o vôo sair, pelo celular ele informa que foi barrado na Varig. Perdera sua carteira de identidade e tirou um
documento comprovando a
perda. Aí a atendente da Varig
perguntou se a carteira tinha
sido roubada ou extraviada.
Ele diz não saber, mas aparentemente foi extravio. "Então
não pode embarcar com esse
documento", disse ele. "O regulamento do DAC diz que só
serve esse documento se for extravio, se for roubo, não". E
não houve quem a demovesse.
Pergunto se é uma gordinha
simpática. "É, como você sabe?".
A mocinha da Varig resolveu
cumprir o regulamento, e quase parou o aeroporto de Congonhas. E aí você começa a entender que maluquice a burocracia fez com o país em todos
os níveis. Ao longo de décadas,
burocratas diligentes do DAC,
assim como de todas as outras
repartições, foram criando e
criando regulamentos, sem
consultar ninguém que não o
seu chefe. E os aeroportos só
funcionavam porque ninguém
cumpria os regulamentos. Até
que apareceu a mocinha da
Varig com a conclusão óbvia:
se alguém escreveu o regulamento, é porque alguém tem
que cumprir o regulamento,
senão não haveria por que escrever o regulamento. Atrás do
regulamento pode estar a mocinha da Varig ou um fiscal.
Por via das dúvidas, na salinha da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária)
tem um quadrinho citando a
Constituição e informando
que ofender funcionário público sujeita o agressor às penas
da lei.
E-mail -
Luisnassif@uol.com.br
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