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Indústria já se
autodenomina
"moeda de troca"
DO ENVIADO ESPECIAL A GENEBRA
Ruy de Salles Cunha, presidente da Associação Brasileira da Indústria Elétrica e
Eletrônica, já entra com uma
espécie de habeas corpus
preventivo: denuncia uma
proposta recente do Ministério da Fazenda como uma
tentativa de "transformar
nossa indústria em moeda
de troca nas negociações internacionais, em favor da
conquista de novos mercados para os produtos agrícolas brasileiros".
Salles Cunha alude a um
documento da Fazenda que
propõe reduzir de 35% para
10,5% a tarifa máxima registrada pelo Brasil na Organização Mundial do Comércio
e trazer a média dos atuais
30% para 9,79%.
O governo entendeu o habeas corpus da indústria.
Marco Aurélio Garcia, assessor diplomático do presidente Lula, disse que o papel
da Fazenda nem existia, uma
vez que não chegara ao Palácio do Planalto.
Não adiantou. O papel está
na pasta com que Sandra
Gallina, a negociadora européia de bens industriais, anda para cima e para baixo.
"Parece que eles [os autores
do estudo] seguiram nossos
parâmetros", festeja Gallina.
É até possível que as tarifas
de importação da indústria
sejam preservadas no ciclo
de negociações porque os
europeus mostram-se pouco dispostos a ceder substancialmente em agricultura
e, sem as concessões, o Brasil
cede pouco nas outras áreas.
Mesmo assim, a fórmula
de cortes na indústria que
está sendo debatida, se adotar o coeficiente máximo citado pelo relatório do grupo
de trabalho dessa área, levará a uma redução de 50% nas
tarifas brasileiras. Mas aí é
que entra o truque: o Itamaraty quer cortar 50% sobre a
tarifa registrada na OMC (na
média, 30%), com o que a
média viria para 15%. Os europeus querem que a redução se faça sobre a tarifa efetivamente aplicada (12% na
média, o que reduziria a proteção tarifária a apenas 6%).
Conseqüência: "Se os países desenvolvidos forçarem
os em desenvolvimento a
cortar maciçamente suas tarifas industriais de maneira
irreversível, a perspectiva futura de desenvolvimento industrial e, por extensão, de
desenvolvimento econômico é realmente pálida", escreve Ha-Joon Chang, da
Universidade de Cambridge.
Se já é assim num momento de reduzidas ambições liberalizantes, tende a ser pior
depois. A proposta da Fazenda reflete a linha de pensamento que vê a proteção
tarifária para a indústria como coisa do passado. Proteger, portanto, um dos setores tende apenas a encarecer
componentes e tornar menos competitiva a exportação do produto final.
Se der certo o habeas corpus preventivo da indústria
eletroeletrônico, esse pode
ser um dos beneficiários da
"flexibilidade".
Os números ajudam na argumentação: as importações
de 2005 atingirão US$ 15 bilhões, US$ 8 bilhões mais
que as exportações. "Se hoje,
com as atuais tarifas, o valor
de importações já é elevado,
imagine se abrirmos indiscriminadamente", avisa Salles Cunha.
(CR)
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