|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
País joga na defensiva em serviços
DO ENVIADO ESPECIAL A GENEBRA
Também em serviços, o terceiro
setor importante que está em jogo
na Rodada Doha, o Brasil tem um
pé no passado e outro no futuro, o
que o força a jogar na defensiva.
O futuro, ao menos de acordo
com a tendência econômica hegemônica hoje, é a abertura para a
participação estrangeira da mais
ampla gama de serviços. Sob esse
ponto de vista, o Brasil está no futuro: bandeiras estrangeiras estão
fincadas em praticamente todos
os serviços, como no sistema financeiro e em telecomunicações,
as jóias da coroa, sempre citadas
quando se fala em serviços.
Mas, em matéria de regulação,
seu modelo é primitivo, ao menos
na área financeira: cabe ainda ao
presidente da República, por determinação constitucional, autorizar a entrada de bancos estrangeiros ou até mesmo a ampliação
dos serviços dos já instalados.
O que se pede do Brasil é principalmente consolidar na legislação
o que já existe na prática. "Restrições constitucionais não podem
servir de desculpa", diz Julien
Guerrier, negociador europeu.
Mas há um segundo ponto de
atrito entre os países ricos e os
emergentes como o Brasil: a proposta dos ricos é mudar as regras
estabelecidas em um acordo chamado Gats (Acordo Geral sobre
Comércio em Serviços).
Por tais regras, a negociação de
acordos em serviços é bilateral e
feita na base de oferta e demanda
de abertura. Digamos que a União
Européia queira abrir o setor brasileiro de águas e saneamento para o capital estrangeiro. Demanda
uma negociação, na qual o Brasil,
se aceitar, faz sua oferta e pede o
que quiser dos europeus.
Para os ricos, não funciona. "O
processo negociador no modelo
oferta/demanda não ofereceu
progressos no aprofundamento
dos compromissos de acesso a
mercado que nós e outros membros da OMC procuramos", diz
Peter Allgeier, embaixador dos
Estados Unidos para a OMC.
O que Europa e EUA pedem é
um modelo de negociação compulsória em que um número x de
setores terá que ser posto à mesa
para abertura. O Brasil não aceita.
Quer continuar com o direito de
oferecer o que lhe convier e proteger o que quiser. Já não aceitou
negociar tecnologia da informação e ficou fora do acordo multilateral fechado na 1ª Ministerial da
OMC (Cingapura, 1996).
Estados Unidos e Europa jogam
a isca do crescimento econômico
supostamente decorrente da liberalização: "A economia cresceu
1,5 ponto percentual a mais em
países que liberalizaram o mercado [de serviços] em relação aos
que permaneceram fechados",
diz Allgeier. Reforça Guerrier: "A
liberalização dos serviços nos países em desenvolvimento geraria
US$ 6 trilhões de renda adicional
entre 2005 e 2015".
A isca tem pouco apelo. Entre
outras razões porque, na Rodada
Uruguai, também foram trombeteados números espetaculares sobre as vantagens do livre comércio. Passados dez anos de sua conclusão, o Fundo Monetário Internacional informa que houve, sim,
benefícios, mas os países ricos
abocanharam quase US$ 3 de cada US$ 4 de renda adicional (exatamente 73%).
(CR)
Texto Anterior: Indústria já se autodenomina "moeda de troca" Próximo Texto: Entrevista: Agricultura vive pior momento, diz Rodrigues Índice
|