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OPINIÃO ECONÔMICA
Inflação: momentos decisivos
LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS
O acompanhamento da
economia pode ser feito de
três maneiras distintas: a primeira usa a ideologia como seu grande norte, ficando tudo mais condicionado a dogmas e princípios
estabelecidos a priori; a outra alternativa utiliza indicadores econômicos passados como "inputs"
digitais de sofisticados modelos
estatísticos e, por meio destes, procura prever o futuro.
Uma terceira escola entende
que a dinâmica econômica é afetada também por fenômenos de
natureza social e histórica. Seu
entendimento passa por uma reflexão analítica, feita a partir de
conceitos teóricos e utilizando
técnicas de análise quantitativa
como um instrumento auxiliar
do fenômeno econômico.
Essas reflexões são importantes
para que o leitor possa compreender o debate atual sobre a questão
da inflação e os caminhos que devem ser seguidos pelo Banco Central para controlá-la. Para uma
ala radical da alternativa ideológica, o Banco Central deve continuar a elevar os juros, até que o
estoque de moeda que existe na
economia passe a ter um crescimento da ordem de 6% ao ano.
Para esses iluminados, a inflação
é uma questão essencialmente
monetária, e a aceleração verificada a partir de meados de 2002
ocorreu porque o BC acomodou o
choque de preços gerado pela desvalorização do real. Como o estoque de moeda ainda está crescendo a taxas muito elevadas, o Copom precisa continuar o processo
de elevação de juros por mais algum tempo.
Já para o grupo dos quantitativos assumidos, responsáveis pela
implantação do modelo estatístico de previsão da inflação que
orienta o sistema de metas, a
questão é ainda mais simples. Enquanto seu modelo indicar uma
inflação acima da meta de 8,5%
para 2003, o Banco Central deve
continuar a aumentar os juros.
Tudo mais é perda de energia e de
tempo.
Mas vamos esquecer esses radicais do pensamento econômico e
procurar entender com mais humildade o que se passa no campo
da inflação neste momento. Para
tanto, vou utilizar dois instrumentos distintos de análise: o primeiro procura entender a inflação a partir do que se passa no
mercado de bens e serviços; o segundo é uma pesquisa micro, ao
nível dos principais componentes
dos índices de preços ao consumidor, realizada pelo economista
Alfredo Barbuti, da Quest Investimentos.
O pensamento keynesiano, que
foi sempre o meu caminho para
entender o funcionamento de
uma economia de mercado como
a nossa, é muito rico em situações
como a que vivemos hoje. Há algumas semanas refletimos juntos
neste espaço sobre as pressões inflacionárias causadas pela desvalorização acelerada do real, do
aumento dos preços das commodities agrícolas que exportamos e
dos derivados de petróleo. Hoje,
atualizo esse cenário, em razão
da nova realidade de nossa balança de pagamentos e da provável redução dos preços dos derivados de petróleo com o fim da
guerra no Iraque.
O ajuste em nosso comércio exterior reduziu de maneira expressiva nosso déficit em conta corrente. Por esse motivo podemos
trabalhar com um cenário de estabilidade do valor do dólar nos
próximos meses. Isso é importante para a inflação, à medida que
retira um componente agressivo
do processo recente de aumento
dos preços. Podemos dizer o mesmo em relação às cotações do petróleo nos mercados internacionais.
Estabilizado o front externo,
podemos nos voltar para a dinâmica interna dos mercados de
bens e serviços. A fragilidade da
demanda, em razão da queda do
valor real dos salários e da manutenção de elevados níveis de desemprego, continua a limitar o
processo de aumentos de preços.
Mesmo a ação pontual da Força
Sindical, em sua tentativa de obter um aumento salarial de emergência, não deve alterar esta situação. O Dieese revelou recentemente que em mais de 45% dos
dissídios coletivos os trabalhadores não conseguiram nem mesmo
a correção dos salários pela inflação passada.
Apelo agora para o trabalho de
Barbuti em seu monitoramento
diário dos preços de uma gama
imensa de bens e serviços. Ele tem
revelado um otimismo crescente
quanto ao comportamento da inflação nos próximos meses. Usando suas projeções e estimativas,
podemos construir um cenário
em que, mantida a taxa Selic de
hoje, os juros reais vão crescer de
maneira importante a partir da
segunda metade do ano. Assumindo certas hipóteses realistas
que aparecem do trabalho da
Quest, o juro real pode ser superior a 15% ao ano no último trimestre de 2003. Isso faz sentido?
Luiz Carlos Mendonça de Barros, 60,
engenheiro e economista, é sócio e editor do site de economia e política Primeira Leitura. Foi presidente do BNDES e
ministro das Comunicações (governo
FHC).
Internet: www.primeiraleitura.com.br
E-mail - lcmb2@terra.com.br
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