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CONFLITO DE INTERESSES
Para Goldman Sachs, falta "clareza regulatória" especialmente em relação à política de preços
Incerteza afeta contas externas, diz banco
DA REPORTAGEM LOCAL
Políticas macroeconômicas
certas. Políticas microeconômicas
confusas. Esse foi o balanço dos
rumos seguidos pelo atual governo apresentado pela Goldman
Sachs, uma das principais instituições financeiras mundiais, a
seus clientes em recente relatório.
Com o título: "Brasil: a dicotomia entre políticas macro e microeconômicas", o relatório alerta
para a ameaça de que a queda de
investimentos provocada pela falta de clareza regulatória em setores de infra-estrutura acabe prejudicando as contas externas e o
equilíbrio fiscal do país.
"Há uma luz amarela acesa por
conta de incertezas regulatórias,
principalmente em relação à política de preços de alguns setores.
Como consultores, sabemos que
há decisões de investimento de
grandes empresas represadas por
isso", diz Paulo Leme, diretor de
pesquisa para mercados emergentes da Goldman Sachs.
Hoje, o principal temor do mercado, que vale para vários setores
de infra-estrutura, é que o governo decida mudar contratos para
controlar preços.
O problema é que quebras de
contrato e intervenção são palavras que provocam arrepios no
mercado. Do lado macroeconômico, o governo Lula tem agradado aos investidores justamente
pelo oposto disso, ou seja, pela firmeza com que tem mantido políticas ortodoxas.
Divórcio
"Hoje, há um divórcio claro entre macroeconomia e microeconomia no Brasil. O risco que enfrentamos é que a segunda, que se
resume à falta de um modelo regulatório, acabe afetando negativamente a primeira", diz Adriano
Pires Rodrigues, do Centro Brasileiro de Infra-Estrutura.
Com certeza, as dúvidas em relação à atuação do governo em setores de infra-estrutura têm contribuído para a queda de investimentos diretos estrangeiros neste
ano. No primeiro trimestre, esse
fluxo somou apenas US$ 1,97 bilhão, valor 57,8% inferior ao do
mesmo período do ano passado.
"O raciocínio do investidor é
que, enquanto o modelo regulatório não ficar claro, não vale a pena
investir aqui. Isso já tem valido
para o setor de energia. Mas poderá ser o caso também do setor de
telecomunicações se o governo alterar o modelo de livre concorrência", diz Rodrigo Fonseca, sócio da Arx Capital Management.
Na semana passada, o governo
já reduziu sua estimativa de investimentos diretos para o país em
2003 de US$ 16 bilhões para US$
13 bilhões. No mercado, o consenso gira em torno de US$ 11 bilhões. Segundo analistas, a forte
queda no fluxo de investimentos
de fora não ameaça o fechamento
das contas externas neste ano.
A necessidade de financiamento do governo é de aproximadamente US$ 30 bilhões. Além dos
investimentos diretos, o país ainda poderá sacar US$ 24 bilhões de
empréstimo com o FMI (Fundo
Monetário Internacional).
Problemas começariam a acontecer se o fluxo de investimentos
externos continuar minguado em
consequência das incertezas domésticas e internacionais relacionadas à economia mundial.
Além de ameaçar as contas externas do país no futuro, a queda
de investimento afetaria negativamente setores industriais, como
fornecedores de equipamentos, o
nível de emprego e, portanto, a
atividade econômica.
Sobra de energia
Além das incertezas regulatórias, herdadas do governo anterior e que têm aumentado neste,
as empresas do setor elétrico enfrentam ainda sobra de energia.
Em parte, esse excesso, estimado em 7.000 MW, é consequência
de problemas regulatórios do
passado que culminaram no apagão vivido pelo país em 2001. Procurado pela Folha para comentar
o assunto, o Ministério de Minas e
Energia não ligou de volta.
"Os problemas são todos interligados e passam, de alguma forma, pela falta de um modelo de
regulamentação claro e adequado", diz François Moreau, especialista em infra-estrutura e diretor da Estratégia & Valor.
Segundo Moreau, embora mais
sérios no setor de energia, os problemas de regulamentação atingem outros segmentos de infra-estrutura, como telecomunicações, gás, petróleo, saneamento e
ambiente. Na área de telecomunicações, uma das principais dúvidas é sobre uma possível mudança na fórmula de reajuste das tarifas, hoje corrigidas pelo IGP-DI.
"As dúvidas têm afastado os investidores. E a tendência é que isso continue assim enquanto o governo não deixar claro quais são
seus objetivos", diz Cláudio Salles,
presidente da Câmara Brasileira
de Investidores do Setor Elétrico.
Consequências
São duas as consequências mais
temidas devido à confusão no
marco regulatório de setores de
infra-estrutura no país. Há quem
avente a possibilidade de que a interrupção de investimentos no setor elétrico, principalmente em
usinas termelétricas, acabe culminando em novo apagão.
É o caso de Xisto Vieira, presidente da Abraget (Associação
Brasileira de Geradoras Termelétricas). Segundo Vieira, há projetos suspensos de investimentos
em termelétricas que deveriam
atrair cerca de US$ 10 bilhões para
o país em quatro ou cinco anos.
Outro risco que começa a preocupar os economistas é que esse
recuo de investimentos não termine tão cedo e acabe contaminando os fundamentos macroeconômicos do país.
(ÉRICA FRAGA)
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