São Paulo, quarta-feira, 28 de abril de 2004

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SINAIS TROCADOS

Segundo Palocci, FMI comprometeu-se apenas a avaliar propostas do Brasil; benefícios só viriam em 2005

Projeto do FMI pode não aliviar restrição fiscal

LEONARDO SOUZA
ENVIADO ESPECIAL A NOVA YORK

A anuência do FMI (Fundo Monetário Internacional) para que sejam realizados projetos pilotos de exclusão de investimentos do cálculo de superávit primário soou aparentemente como uma vitória do governo, mas pode não trazer mudança prática para as contas públicas.
O próprio ministro Antonio Palocci Filho (Fazenda) admitiu isso ontem, para satisfação de diretores de bancos de investimentos preocupados com o compromisso de equilíbrio fiscal do governo. "Na verdade, estamos fazendo primeiro estudos de caso mesmo. Projeto piloto é isso, você tem uma determinada decisão de explorar os investimentos que sejam positivos para o equilíbrio fiscal dos países. Então nós vamos montar os projetos pilotos que vão demonstrar se essa é uma possibilidade real ou se essa não é uma possibilidade real."
A adoção de projetos pilotos pode até significar o efeito inverso para a capacidade de investimento do governo, impondo uma nova espécie de restrições de gastos a partir de 2005. Palocci e o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, têm afirmado que o Brasil não vai renovar o atual acordo com o FMI, que termina em dezembro.
Seria a primeira vez em oito anos que o Brasil poderia adotar a medida que desejasse no campo fiscal sem precisar prestar contas ao FMI, que mantém programa de ajuda ao país desde 1998.

Cálculos
No último domingo, o FMI anunciou que autorizaria o Brasil a implantar projetos pilotos na área de investimentos em infra-estrutura sem incluir os gastos com os empreendimentos nos cálculos do superávit primário. Na ocasião, Palocci esclareceu que os projetos só deverão ser formados a partir do ano que vem.
Apesar disso, o anúncio feito em Washington motivou autoridades como o ministro Guido Mantega, do Planejamento, e o presidente do BNDES (Carlos Lessa) a interpretar a novidade como uma medida que irá beneficiar a capacidade de investimento do Estado já sob o acordo atual do Brasil com o FMI.
Além do mais, os projetos pilotos serão, na verdade, estudos de caso que a equipe econômica fará para tentar convencer o FMI de que a proposta brasileira de não computar na equação do superávit primário (economia de receitas para o pagamento de juros) investimentos públicos considerados positivos é boa para a situação fiscal do país.
Hoje, investimentos de estatais e da União, mesmo que considerados produtivos, ou seja, que representem retorno financeiro para o caixa do Estado, são tratados simplesmente como despesas. A única exceção é para parte dos investimentos da Petrobras.
Quando uma usina hidrelétrica compra novas turbinas para gerar energia, por exemplo, os gastos com a aquisição são registrados como despesas, o que obriga o governo a ter de economizar mais para compensar os recursos despendidos pela estatal. Se assim não o fizesse, prejudicaria a meta de superávit primário. Muitas vezes as estatais ficam limitadas a investir para não forçar a União a ter de poupar mais.
Em estudos conjuntos da equipe econômica brasileira com técnicos do FMI, serão feitas simulações para tentar comprovar que os investimentos produtivos são positivos para a situação fiscal do país. No exemplo da hidrelétrica, o governo tentaria demonstrar que a exclusão dos recursos gastos com a compra das turbinas seria mais do que compensada com o aumento da receita obtida com a maior venda de energia.
Ou seja, os projetos pilotos, pelo menos num primeiro momento, não vão representar exclusão de investimentos do cálculo de superávit primário.
"Acho que não está claro que não se está tocando no superávit primário. Eu acho que é uma experiência gradual, qualitativa, mas certamente não é nada na direção de reduzir o superávit primário. A falha na comunicação é que está gerando essa preocupação", disse Paulo Leme, diretor da Goldman Sachs.
Mais: mesmo que o governo consiga apresentar bons resultados nos estudos de casos realizados, nada garante que o Fundo vá concordar no futuro com a adoção dessa medida, segundo apurou a Folha.
Pelas regras do FMI, novas medidas são incorporadas pela instituição somente se for viável aplicá-las a qualquer país. No caso de o Brasil mostrar que o mecanismo seria bom para o país, experiências em outras economias provando o contrário já seriam suficientes para que o Fundo não concordasse com a prática.
Palocci, no entanto, acredita que o Fundo deverá aceitar a proposta brasileira. "O fato de o FMI ter concordado com os projetos pilotos é uma disposição em compreender que essa questão é viável. É um passo dado no sentido de ver a viabilidade dos projetos."
No final de semana passado, quando o FMI acatou a idéia dos projetos pilotos, a diretora-gerente da instituição, Anne Krueger, afirmou que prosseguem dúvidas dentro do Fundo em relação à proposta de excluir os gastos com investimentos em infra-estrutura do cálculo do superávit primário.


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