São Paulo, segunda-feira, 28 de maio de 2007

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Folhainvest

Preço de ações traz incerteza sobre bolha

Para especialistas, relação "preço sobre lucro" sugere que ou a economia melhorou muito ou Bolsa está com valores superestimados

Indicador em um dos níveis mais altos da história sugere que "Brasil já deixou de ser uma pechincha", diz Octavio de Barros, do Bradesco

MAELI PRADO
TONI SCIARRETTA

DA REPORTAGEM LOCAL

As ações no Brasil estão ficando caras. Um dos índices mais utilizados para identificar se uma ação vale o quanto promete está hoje em um dos seus maiores níveis históricos, sugerindo que ou a economia teve uma melhora significativa a ponto de justificar essa mudança de patamar de risco ou o mercado formou uma bolha de otimismo prestes a explodir.
O indicador relaciona o valor de mercado de uma empresa com sua capacidade de gerar lucros. Formado pela divisão do preço pelo lucro, o chamado P/L da Bovespa está hoje em 14,5. Tradicionalmente, essa relação varia em torno de 10 no Brasil. A exceção foi no início de 2000, pouco antes do estouro da bolha da internet, quando chegou a mais de 20.
Um exemplo: se uma empresa tem um lucro trimestral de R$ 80 mil e vale para investidores R$ 800 mil, isso significa que essa relação preço sobre lucro é de 10. Ou seja, o investidor precisa de 10 trimestres para recuperar o que investiu. Se tanto preço quanto lucro sobem na mesma proporção, o P/L ainda é 10. Mas, se a mesma empresa passa a ser avaliada em R$ 1 milhão, mas o lucro segue em R$ 80 mil, por exemplo, essa relação sobe para 12,5. O que aconteceu com a empresa?
A mudança pode ter duas causas: ou o preço foi superestimado, como conseqüência de uma euforia excessiva, ou a avaliação corrente é que o ambiente teve uma melhora tão significativa que é menos arriscado operar a empresa. E ela passa a valer mais. A discussão vale para o preço das ações.

Otimismo
Uma mistura desses dois fatores explica o atual momento da Bovespa, na avaliação de Fernando Exel, presidente da consultoria Economática, que fez um levantamento a pedido da Folha olhando a evolução do P/L da Bovespa de 2000 para cá. "É notório que o risco-país caiu, mas também não é tão certo que será definitivamente baixo. Acredito que seja em parte uma euforia do mercado e em parte merecimento do país", afirma o economista.
O mesmo levantamento mostra que a relação entre preço e lucro na Bolsa brasileira está mais próxima da observada no mercado dos EUA. No final de 2003, a Bovespa tinha um P/L de menos da metade do americano. Hoje o brasileiro está em 14,5 e o americano, em 20, diz a Economática.
Na América Latina, Chile e México têm uma relação maior, compatível com os países ricos. O Chile tem P/L de 22,4 e o México, de 20,8.
"Acho que o Brasil já deixou de ser uma pechincha", afirma o diretor de Pesquisa Macroeconômica do Bradesco, Octavio de Barros. "Os números ainda estão mais baixos do que o de outros países, mas temos que considerar que na Bolsa brasileira cerca da metade dos papéis refere-se ao setor de commodities, onde tradicionalmente são menores", avalia o economista.
Muitos analistas afastam a possibilidade de bolha na Bolsa. "Não compro a idéia de que tem bolha na Bolsa brasileira. Em alguns papéis específicos há uma situação meio irracional, onde está se esperando lucro com crescimento de três dígitos", diz Luis Fernando Lopes, do Banco Pátria.
Pessimista, Marcelo Ribeiro, sócio da Pentágono Asset Management, acredita em uma bolha no preço das ações na Bovespa, muito parecida com a que aconteceu entre 2000 e 2001, época da crise da internet. "Estamos com preços e margens jamais vistos na Bolsa. A foto é muito boa, mas não podemos achar que é garantia de ausência de riscos. [A Bolsa] Só o fato de não haver opinião divergente é preocupante. Há uma mania no ar de recordes atrás de recordes", disse.

Dúvidas
Ribeiro lembra que o megainvestidor George Soros e o poderoso fundo americano Carlyle, que administra US$ 50 bilhões, colocaram recentemente em dúvida a duração do atual ciclo de alta liquidez internacional. Para ele, o dinheiro abundante força os gestores a fecharem negócios cada vez mais arriscados, como em 1997, às vésperas da crise asiática.
O economista afirma que a economia mundial sobrevive em meio a dois problemas bastante graves: duplo déficit -fiscal e comercial- nos EUA, que força a maior economia do mundo a exportar dinheiro, e o câmbio fixo na China, com sustentação improvável para o exportador de maior potencial do planeta. "Se não houvesse isso, eu concordaria com o otimismo. O equilíbrio é muito instável. Os mais afetados com um eventual estouro da bolha serão os ativos mais valorizados, como os preços das commodities e moedas de países emergentes, como o real. Já os beneficiados serão o dólar e os títulos americanos", disse Ribeiro.
Para Sergio Werlang, ex-diretor do BC, é inegável que a economia brasileira melhorou e isso reflete no preço de ações. Ele diz que os juros longos reais [descontada a inflação] já convergem para níveis internacionais, o que leva a uma mudança sem precedentes. "[Esse juro] Justifica que a gente tenha uma relação preço/lucro maior que o histórico brasileiro. O que não impede de termos tido uma subida rápida na Bolsa. Mas isso não é tão importante hoje. Os dados da Bolsa não são nada fora do razoável."


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