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Folhainvest
Preço de ações traz incerteza sobre bolha
Para especialistas, relação "preço sobre lucro" sugere que ou a economia melhorou muito ou Bolsa está com valores superestimados
Indicador em um dos níveis mais altos da história sugere que "Brasil já deixou de ser uma pechincha", diz Octavio de Barros, do Bradesco
MAELI PRADO
TONI SCIARRETTA
DA REPORTAGEM LOCAL
As ações no Brasil estão ficando caras. Um dos índices
mais utilizados para identificar
se uma ação vale o quanto promete está hoje em um dos seus
maiores níveis históricos, sugerindo que ou a economia teve
uma melhora significativa a
ponto de justificar essa mudança de patamar de risco ou o
mercado formou uma bolha de
otimismo prestes a explodir.
O indicador relaciona o valor
de mercado de uma empresa
com sua capacidade de gerar lucros. Formado pela divisão do
preço pelo lucro, o chamado
P/L da Bovespa está hoje em
14,5. Tradicionalmente, essa
relação varia em torno de 10 no
Brasil. A exceção foi no início
de 2000, pouco antes do estouro da bolha da internet, quando
chegou a mais de 20.
Um exemplo: se uma empresa tem um lucro trimestral de
R$ 80 mil e vale para investidores R$ 800 mil, isso significa
que essa relação preço sobre lucro é de 10. Ou seja, o investidor
precisa de 10 trimestres para
recuperar o que investiu. Se
tanto preço quanto lucro sobem na mesma proporção, o
P/L ainda é 10. Mas, se a mesma
empresa passa a ser avaliada
em R$ 1 milhão, mas o lucro segue em R$ 80 mil, por exemplo,
essa relação sobe para 12,5. O
que aconteceu com a empresa?
A mudança pode ter duas
causas: ou o preço foi superestimado, como conseqüência de
uma euforia excessiva, ou a
avaliação corrente é que o ambiente teve uma melhora tão
significativa que é menos arriscado operar a empresa. E ela
passa a valer mais. A discussão
vale para o preço das ações.
Otimismo
Uma mistura desses dois fatores explica o atual momento
da Bovespa, na avaliação de
Fernando Exel, presidente da
consultoria Economática, que
fez um levantamento a pedido
da Folha olhando a evolução
do P/L da Bovespa de 2000 para cá. "É notório que o risco-país caiu, mas também não é
tão certo que será definitivamente baixo. Acredito que seja
em parte uma euforia do mercado e em parte merecimento
do país", afirma o economista.
O mesmo levantamento
mostra que a relação entre preço e lucro na Bolsa brasileira
está mais próxima da observada no mercado dos EUA. No final de 2003, a Bovespa tinha
um P/L de menos da metade
do americano. Hoje o brasileiro
está em 14,5 e o americano, em
20, diz a Economática.
Na América Latina, Chile e
México têm uma relação
maior, compatível com os países ricos. O Chile tem P/L de
22,4 e o México, de 20,8.
"Acho que o Brasil já deixou
de ser uma pechincha", afirma
o diretor de Pesquisa Macroeconômica do Bradesco, Octavio
de Barros. "Os números ainda
estão mais baixos do que o de
outros países, mas temos que
considerar que na Bolsa brasileira cerca da metade dos papéis refere-se ao setor de commodities, onde tradicionalmente são menores", avalia o
economista.
Muitos analistas afastam a
possibilidade de bolha na Bolsa. "Não compro a idéia de que
tem bolha na Bolsa brasileira.
Em alguns papéis específicos
há uma situação meio irracional, onde está se esperando lucro com crescimento de três dígitos", diz Luis Fernando Lopes, do Banco Pátria.
Pessimista, Marcelo Ribeiro,
sócio da Pentágono Asset Management, acredita em uma
bolha no preço das ações na
Bovespa, muito parecida com a
que aconteceu entre 2000 e
2001, época da crise da internet. "Estamos com preços e
margens jamais vistos na Bolsa. A foto é muito boa, mas não
podemos achar que é garantia
de ausência de riscos. [A Bolsa]
Só o fato de não haver opinião
divergente é preocupante. Há
uma mania no ar de recordes
atrás de recordes", disse.
Dúvidas
Ribeiro lembra que o megainvestidor George Soros e o
poderoso fundo americano
Carlyle, que administra US$ 50
bilhões, colocaram recentemente em dúvida a duração do
atual ciclo de alta liquidez internacional. Para ele, o dinheiro abundante força os gestores
a fecharem negócios cada vez
mais arriscados, como em 1997,
às vésperas da crise asiática.
O economista afirma que a
economia mundial sobrevive
em meio a dois problemas bastante graves: duplo déficit -fiscal e comercial- nos EUA, que
força a maior economia do
mundo a exportar dinheiro, e o
câmbio fixo na China, com sustentação improvável para o exportador de maior potencial do
planeta. "Se não houvesse isso,
eu concordaria com o otimismo. O equilíbrio é muito instável. Os mais afetados com um
eventual estouro da bolha serão os ativos mais valorizados,
como os preços das commodities e moedas de países emergentes, como o real. Já os beneficiados serão o dólar e os títulos americanos", disse Ribeiro.
Para Sergio Werlang, ex-diretor do BC, é inegável que a
economia brasileira melhorou
e isso reflete no preço de ações.
Ele diz que os juros longos reais
[descontada a inflação] já convergem para níveis internacionais, o que leva a uma mudança
sem precedentes. "[Esse juro]
Justifica que a gente tenha uma
relação preço/lucro maior que
o histórico brasileiro. O que
não impede de termos tido uma
subida rápida na Bolsa. Mas isso não é tão importante hoje.
Os dados da Bolsa não são nada
fora do razoável."
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