São Paulo, quinta, 28 de maio de 1998

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OPINIÃO ECONÔMICA
Lula lá?

PAULO NOGUEIRA BATISTA JR.

Uma das grandes novidades dos últimos dias foi a divulgação de pesquisas de opinião e intenção de voto que apontam crescimento da oposição e, sobretudo, declínio de Fernando Henrique Cardoso. Um segundo turno é dado como provável. A reeleição do presidente, vista até há pouco como assegurada, passou a ser colocada em dúvida.
Essa reversão de expectativas está produzindo várias consequências. Uma delas é o renascimento do interesse pelo discurso e propostas da oposição. Os economistas do PT, que andavam praticamente esquecidos, ressurgem com destaque no noticiário. De repente, a imprensa quer saber o que eles pensam sobre os grandes temas macroeconômicos: câmbio, juros, desemprego, déficit externo e déficit fiscal.
Bem. Macroeconomia nunca foi um dos pontos fortes do PT. Na última eleição presidencial, por exemplo, erros de avaliação sobre o impacto do Plano Real deixaram o candidato do partido mais perdido do que cego em tiroteio.
Agora começam a surgir algumas propostas exóticas. Vejam vocês. Segundo economistas do partido, para crescer e gerar empregos é preciso desmontar a armadilha financeira criada pela sobrevalorização cambial e a consequente necessidade de manter taxas de juro elevadas. Com juros menores, a economia cresceria e geraria mais empregos. Haveria aumento da arrecadação e redução das despesas financeiras do governo, permitindo o equacionamento do déficit fiscal.
Até aí tudo bem. Mas não era o câmbio sobrevalorizado que impedia a queda dos juros? O que fazer com o câmbio? A resposta oferecida é intrigante: acelerar o ritmo das minidesvalorizações. Um dos economistas do PT chegou a sugerir que o ritmo de desvalorização nominal poderia passar dos atuais 0,6% para 1% ao mês.
Não sendo filiado ao PT ou a qualquer outro partido, sinto-me à vontade para fazer algumas ponderações. É como dizia aquele velho provérbio: para todo problema complexo, há uma resposta simples -e ela está errada. Infelizmente, a aceleração das mínis não é consistente com a diminuição das taxas de juro.
Tudo o mais constante, uma elevação programada do ritmo mensal de desvalorização aumentaria a desvalorização esperada e forçaria o Banco Central a aumentar as taxas de juros. Isso porque a aceleração das mínis diminuiria a rentabilidade em dólares das aplicações financeiras em reais. Para manter o influxo de capital necessário ao financiamento do grande déficit externo e garantir a rolagem dos elevados passivos de curto prazo do país, o Banco Central seria então obrigado a subir as taxas básicas de juros.
Um aumento da desvalorização esperada de 0,6% para 1% ao mês, por exemplo, elevaria o piso da taxa básica de juro em cerca de 5% em termos anuais. O piso para a TBC (taxa básica de juro do Banco Central), atualmente em torno de 20%, passaria para a faixa de 25% ao ano. Acelerar as mínis substancialmente e, ao mesmo tempo, reduzir as taxas básicas de juro só seria possível se houvesse uma alteração significativa em outros fatores. Por exemplo, uma queda apreciável dos juros no exterior ou uma diminuição dos prêmios de risco associados à aplicação em papéis brasileiros.
Não cabe, a essa altura, alimentar ilusões. A margem de manobra do Banco Central do Brasil é muito estreita. Não por força de alguma "lei" macroeconômica. Nem por culpa da mítica "globalização". Mas sim, volto a dizer, por causa da leviandade da política macroeconômica seguida pelo governo brasileiro desde 1994, especialmente na fase inicial do Plano Real.
Sobrevalorização cambial, abertura pouco criteriosa às importações e ao capital externo volátil ou de curto prazo, descaso na promoção de exportações, falta de rigor no controle das contas públicas -tudo isso gerou desequilíbrios macroeconômicos imensos e de correção muito difícil.
Em vez de sair fazendo propostas ingênuas, os economistas do PT e de outros partidos de oposição precisam parar para pensar um pouco. Afinal, todos aqueles que querem que o Brasil mude esperam que a oposição possa apresentar um discurso consistente e fundamentado em 1998. E não a repetição do amadorismo econômico que tanto prejudicou a candidatura Lula na eleição de 1994.


Paulo Nogueira Batista Jr., 43, professor da Fundação Getúlio Vargas escreve às quintas-feiras nesta coluna.
E-mail: pnbjribm.net



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