São Paulo, quarta-feira, 28 de junho de 2006

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RAMEZ TEBET

A crise das agências reguladoras

As agências reguladoras não dispõem de estruturas e de recursos, sofrem influências político-partidárias

MECANISMOS importantes para a credibilidade do país nos foros internacionais, os chamados marcos regulatórios padecem de graves deficiências no Brasil, a partir da precária situação em que se encontram as agências reguladoras. Criadas para pôr regras e fiscalizar a prestação de serviços públicos por concessionárias privadas, as agências enfrentam sérias dificuldades para desempenhar seu papel.
Não dispõem de estruturas e de recursos, sofrem influências político-partidárias; mudam de rumo, a cada ciclo presidencial; aguardam a nomeação de diretores e seus quadros se esvaziam.
A previsibilidade dos marcos é elemento essencial para atrair investidores. Seus limites são difusos, ocasionando déficit operacional e, às vezes, duplicidade de funções entre pessoas jurídicas do governo e órgãos de Estado. Por falta de regras estáveis, a desconfiança grassa em muitos setores. O setor de transportes enfrenta grave crise, decorrente da baixa integração dos modais, péssima qualidade e insuficiência do sistema rodoviário e dificuldade de acesso aos portos, cujo modelo de gestão é dos mais precários.
Exemplo de falta de integração entre os modais está na região de Três Lagoas e o bolsão sul mato-grossense, onde uma industrialização incipiente poderia ser acelerada com os aproveitamentos da bacia Paraná-Tietê e a estrada de ferro da Rede Ferroviária Federal, além da integração com a Ferronorte, que atravessa Mato Grosso e Mato Grosso do Sul. Para o setor de transportes, há duas agências reguladoras, a ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres) e a Antaq (Agência Nacional de Transportes Aquaviários), ambas criadas em 2001.
Nos últimos 20 anos, os investimentos no setor de transportes têm sido baixos, oscilando de 0,09% a 0,28% do PIB. As deficiências aparecem na natureza limitada das concessões rodoviárias, no caráter estatal das administrações de portos e na fragmentação na estrutura de propriedade das operadoras ferroviárias.
Como decorrência, emergem elevados custos de logística, estimados em 16% a 20% do PIB, quando comparados a uma média de 11% a 12% na Europa e 9,8% nos Estados Unidos. Estimam-se em R$ 10 bilhões as perdas de companhias brasileiras com logística.
As agências do setor de transportes -ANTT e Antaq- trabalham de maneira isolada, sem foco para a questão logística, razão pela qual devem ser fundidas. Entre os tipos de navegação fiscalizados por essa última agência, está a navegação de cabotagem, realizada entre os portos ou pontos do território nacional, utilizando a via marítima e as vias navegáveis interiores. Não se compreende a razão por que não abriga a cabotagem turística. A ausência de definições é imensa, enquanto se multiplicam normas e resoluções a cargo de inúmeros órgãos. Trata-se de um mercado promissor para o Brasil, que poderá comportar um fluxo de 5 milhões de turistas. No entanto, por falta de regras claras e excesso de burocracia, o turismo marítimo está ameaçado.
Os agentes que atuam no setor -PF, Ministério do Trabalho, Receita Federal, Capitania dos Portos e Vigilância Sanitária- expandem a burocracia e afugentam os grandes navios de turismo marítimo. Veja-se a disposição do Conselho Nacional de Imigração, sob a égide do Ministério do Trabalho, que chega a exigir a contratação de 30% de brasileiros para as operações a bordo, coisa impraticável ante a moldura internacional que baliza os contratos das tripulações. Por falta de unificação legislativa, somos obrigados a conviver com situações extravagantes. A praticagem -atividade que consiste em receber o navio e conduzi-lo para dentro do porto- é uma delas.
Chega-se a cobrar uma taxa de praticagem de US$ 30 mil, no porto de Santos, quando esse custo oscila entre US$ 5.000 e US$ 10 mil nos portos internacionais. Pela inexistência de marcos próprios para definir as atividades, o Brasil permanece ao largo da cabotagem turística.
Há, ainda, o processo de escolha dos dirigentes pelo presidente da República, após indicação aprovada pelo Senado. Constata-se pressão de partidos e grupos na indicação dos diretores. A governança regulatória sujeita-se a contratos de gestão que não são implementados, seja por conta das formas sugeridas seja por conta da reduzida capacidade de controle dos ministérios sobre as agências. As agências reguladoras carecem de aperfeiçoamento, sob pena de se expandirem os conflitos entre elas e os Poderes Executivo e Legislativo, além de organizações da sociedade civil.


RAMEZ TEBET (PMDB-MS), senador, foi presidente da Comissão de Assuntos Econômicos e do Senado.

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