São Paulo, sábado, 28 de julho de 2007

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GERALDO BIASOTO JR E JOSÉ ROBERTO AFONSO

Janela fechada


Propomos constituir uma estatal específica para cada projeto de investimento de grande porte e forte impacto


É COMEMORADO que a economia brasileira crescerá neste ano: 4,4%, segundo o FMI, que espera o mundo avançando 5,2%. Logo, comemoramos que ficaremos para trás do mundo.
Há anos, os fundamentos permanecem sólidos, diz o mercado. A inflação segue controlada e abaixo da meta, o superávit fiscal continua alto e configura-se um consistente superávit comercial, somado ao forte fluxo de capital externo. Se está tudo certo na política econômica e se muitos dos indicadores são melhores que os de outros latinos e emergentes, por que crescemos menos que eles e, agora, do que o mundo? As explicações para a lanterna no campeonato do crescimento devem ser buscadas nas condições reais da economia. Segue a incapacidade de elevar o investimento público ao nível necessário para atender à demanda represada por infra-estrutura, e os maiores investimentos privados são focados na exportação. O cenário róseo da macroeconomia de curto prazo acaba manchado pelas crises nos aparatos regulatórios e nas condições de logística -a aérea é apenas o segmento mais visível.
Não é a baixa poupança que explica as limitações ao investimento. Diferentemente de tantas experiências anteriores, em que a poupança externa escassa impedia o desenvolvimento, há enorme disponibilidade: 0,8% do PIB. No front interno, o volume de crédito foi a 32,3% do PIB, e o mercado de capitais chegou ao ponto da emitir mais debêntures em 2006 do que os desembolsos do BNDES. Até no Orçamento público, sobram bilhões de reais vinculados para investimentos (Cide e FAT), desviados para outros fins.
A infra-estrutura é o gargalo para acelerar o crescimento. A tese foi encampada pelo governo com o PAC. Mas pode empacar nas distorções que assolam a gestão pública -orçamentação pouco transparente, contratações alvo de denúncias, desembolsos erráticos e resultados tímidos ante os desafios. Isso mina a confiança para investir, e não há cálculo econômico que se sustente.
A solução para o problema da infra-estrutura não é trivial. Exige mudanças estruturais, como reordenar os espaços entre ações públicas e privadas. Há que preservar o equilíbrio fiscal, mas lograr um patamar maior de investimentos públicos. Para tanto, é possível recorrer a novos arranjos institucionais. Sem prejuízo da aplicação das PPPs e dos PPIs, é preciso ousar mais.
Nossa proposta seria a constituição de uma empresa estatal específica para cada projeto de investimento de grande porte e forte impacto econômico -como a construção de novas hidrelétricas ou vias de transporte. Haveria uma diferença crucial para a empresa estatal como hoje é conhecida: o financiamento seria captado no mercado e daí a gestão seria integralmente profissional e escolhida pelo setor privado. Isto é, sem espaço para a menor ingerência política; o governo se limitaria a exigir metas e, quando muito, a atuar como um segurador de última instância. A plena governança corporativa seria crucial para excluir tais investimentos do controle do déficit público e das restrições para acesso a financiamento (como o FMI já tinha aceito no caso da Petrobras, mas o Brasil preferiu ignorar).
Não é difícil regulamentar o novo arranjo: a Constituição já prevê autonomia para entes públicos submetidos a contratos de gestão, segundo lei nunca votada. Os capitais são abundantes, e o mercado brasileiro tem larga experiência em estruturar operações. Não faltam lições no passado (joint ventures não são novidade) e no exterior (como projetos europeus e mesmo na China).
Como nunca, temos tantas oportunidades, econômicas e políticas. Continuaremos de janela fechada?

GERALDO BIASOTO JR , 46, é doutor em economia pela Unicamp, é diretor-executivo da Fundap. JOSÉ ROBERTO R. AFONSO , 46, mestre em economia pela UFRJ, é especialista em finanças públicas.


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